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O PIB do terceiro trimestre confirma a recuperação medíocre da economia brasileira

CartaCapital
08/12/2017

O resultado deste ano foi impulsionado por fatores que independem das políticas adotadas pelo governo Temer

Por Pedro Paulo Zahluth Bastos*

AGRICULTURA A lavoura, mais uma vez, tem sido a salvação do Brasil

A economia brasileira saiu do fundo do poço puxada por dois fatores independentes da política econômica desastrosa do governo Michel Temer: a supersafra agrícola e o boom exportador.

O impacto favorável da agricultura ainda não se esgotou. É verdade que, trimestre a trimestre, a queda de 3% explica a estabilidade do PIB (+0,1%) no terceiro trimestre em relação ao segundo. Esse dado é enganoso, tanto para representar o crescimento pelo qual ainda passa a agricultura quanto para registrar a recuperação da economia como um todo. Por quê?

O resultado da agricultura registra a oscilação negativa da oferta agrícola que tende a ocorrer sempre, todo terceiro trimestre, pois a safra de grãos (soja e milho) se concentra no primeiro semestre. Como tivemos uma supersafra nos dois primeiros trimestres (crescimento de 18,2% no primeiro e 14,8% no segundo trimestre comparados a 2016), o efeito estatístico para o resultado da agricultura no terceiro trimestre foi ainda maior.

A agricultura continuou, porém, a crescer muito em relação ao terceiro trimestre de 2016: nada menos que 9,1%. Ou seja, a geração de renda no campo continuará a provocar um impacto positivo sobre a reposição de máquinas agrícolas, caminhões, automóveis e bens duráveis, animando a indústria.

Ademais, a supersafra determinou uma queda dos preços agrícolas que é, em parte, responsável pela baixa inflação e pela recuperação dos salários reais a despeito do elevado nível de desemprego. A supersafra estimula ainda a indústria de alimentos e, pela queda dos preços, aumenta a renda disponível dos consumidores para repor bens duráveis industrializados.

A estabilidade estatística do PIB como um todo no terceiro trimestre foi determinada, portanto, principalmente pela oscilação da oferta agrícola. Essa oscilação negativa desaparece, no entanto, quando olhada da maneira correta, ou seja, comparando o trimestre de um ano com o do ano anterior, pois cada trimestre tem um tipo de safra agrícola.

Para as exportações, indústria e serviços, a comparação com o trimestre imediatamente anterior capta melhor a variação da demanda, que é o que importa para entender a dinâmica da recuperação. Como explicado com detalhe na nota do Centro de Conjuntura e Política Econômica (Cecon) da Unicamp, as exportações anteciparam todos os itens de demanda interna e contribuíram para sua recuperação posterior.

Além das exportações recordes de grãos, há a recuperação da indústria extrativa (petróleo e minérios ferrosos) e na indústria de transformação (siderurgia, veículos, tratores e máquinas). É digno de nota que o governo não tenha auxiliado nessa recuperação das exportações. Ao contrário. Tanto a apreciação cambial, determinada pelo conservadorismo da política monetária do Banco Central, quanto a limitação do crédito dos bancos públicos (a despeito da preservação do Plano Safra herdado do governo anterior) prejudicaram as vendas externas. Elas não são explicadas pela competitividade-preço, e sua rentabilidade caiu na comparação com 2016.

O crescimento das exportações é explicado pela estrutura da produção e pela demanda externa, não pela taxa de câmbio ou de juros. As exportações de commodities agrícolas e minerais são explicadas diretamente pela expansão conjunta de América do Norte, Europa e Ásia, o que não ocorria desde 2007.

Isso também explica, mais indiretamente, a recuperação das exportações industriais, à medida que o mercado da América do Sul é sua destinação principal. O continente desindustrializado importa muitos produtos industriais do Brasil, e se recupera por causa do crescimento de suas exportações agrícolas, minerais e de petróleo para os países desenvolvidos, carregando consigo a indústria de transformação brasileira.

Esses fatores autônomos de demanda, como previsto nesta coluna, tiveram efeito multiplicador e acelerador, ou seja, estimularam o consumo das famílias e a recuperação do investimento. O consumo voltou a crescer 1,2% ante o trimestre anterior, e o investimento passou a crescer 1,6%.

Depois de vários trimestres de queda, era previsível que a renovação de bens de consumo durável e de estoques de capital depreciados ou obsoletos reforçaria os efeitos multiplicador e acelerador da agricultura e das exportações.

Ademais, a liberação do FGTS, e o pagamento de dívidas das famílias, teve um impacto favorável sobre o consumo, somado à queda do preço dos alimentos. A massa real de salários cresceu 2% no terceiro trimestre de 2017 em relação a 2016, segundo a Pnad contínua, em parte pela recuperação do emprego, em parte por causa da queda da inflação.

O problema é que a agenda de reformas do governo Temer assegurará que a retomada da economia continuará medíocre, comparado com 2004 ou 2010, por exemplo. Nos dois casos, a forte recuperação dos salários, do gasto social e do investimento público permitiu uma expansão vigorosa do mercado interno.

Hoje, as “reformas” aprovadas pelo governo Temer asseguram que nada disso se repetirá. As exportações podem continuar a ter um efeito positivo. Podemos ter outra supersafra se o clima ajudar. A reforma trabalhista restringirá, por seu lado, o crescimento dos salários e, portanto, do mercado interno. A Lei do Teto do Gasto, por sua vez, limitará o aumento do salário mínimo, preservará na míngua a política social e o investimento público. O crescimento econômico se fará com muita concentração de renda. Como o próprio FMI admitiu com o estudo de vários casos nacionais, isso significa uma expansão mais lenta e mais curta.

A não ser, é claro, que estas reformas sejam revertidas a partir de 2019. A incerteza quanto à possibilidade de que isso ocorra, aliás, será mais um fator limitante da pujança da recuperação em 2018. Se Lula não for impedido de concorrer, o medo dos mercados sobre sua vitória poderá, paradoxalmente, facilitá-la.

Por Pedro Paulo Zahluth Bastos*
*É professor visitante na UC Berkeley e professor licenciado da Unicamp