Marcelo Rehder
No semestre em que se concentram as negociações das categorias mais organizadas do País, trabalhadores reforçam campanha
No ano em que a economia brasileira deverá crescer mais de 7%, as centrais sindicais resolveram deixar as diferenças de lado para juntar forças na tentativa de arrancar aumentos reais de salários mais polpudos nas negociações salariais do segundo semestre. A estratégia prevê ainda uma maior mobilização na luta por direitos como a redução da jornada de trabalho de 44 para 40 horas, bandeira de quase 20 anos das centrais.É na segunda metade do ano que se concentram as negociações das categorias mais organizadas do País, como metalúrgicos, petroleiros, bancários, eletricitários e químicos. As centrais querem unificar a campanha salarial dessas categorias.
As reivindicações de aumento real de salários dessas categorias variam de 5% a 11%, além da reposição das perdas com inflação. Em 2009, o aumento ficou, em média, 2% acima da inflação.
Sindicatos filiados a uma mesma central já fazem campanhas unificadas. A união das centrais, porém, é inédito na história do movimento sindical brasileiro.
A ideia inicial do movimento é buscar a unidade das centrais na campanha, porém sem unificar toda a pauta de reivindicações nem a data-base das categorias. No entanto, traria um índice de referência para as reivindicações de aumento real dos salários. Uma das ideias em discussão prevê que o índice seja equivalente ao crescimento do Produto Interno Bruto (PIB), estimado em 7,3% este ano.
Além disso, a pauta das diversas categorias incluiria também alguns pontos considerados bandeiras do movimento sindical. Além da redução da jornada para 40 horas, os sindicalistas discutem, entre outras coisas, a inclusão de mecanismos semelhantes à Convenção 158 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que causa arrepios no mundo empresarial. Ela estabelece que nenhuma empresa não pode demitir sem apresentar justificativa.
“A unidade dos trabalhadores sempre favorece a obtenção de conquistas”, frisa o presidente em exercício da Força Sindical, Miguel Torres. “A ação conjunta das centrais é um instrumento de pressão muito grande.”
As conquistas obtidas pelas categorias mais importantes servem de base para os acordos coletivos de negociações de categorias menos organizadas. “As empresas, mesmo sendo concorrentes, discutem estratégias conjuntas, antes de negociar com os sindicatos de trabalhadores”, diz o presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Artur Henrique. “Vamos fazer o mesmo entre as várias centrais.”
A movimentação das centrais parece não assustar o empresariado. Pelo menos na ótica diretor do Departamento de Pesquisas e Estudos Econômicos da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Paulo Francini, que vê com “naturalidade” a mobilização dos trabalhadores. “Tem períodos em que a posição negocial dos empresários é muito mais forte, porque atrás dos trabalhadores está o fantasma do desemprego”, observa o executivo. “De repente, como agora, os fantasminhas mudam de lado e vão para trás dos empresários.”
Para Francini, o fato de a economia brasileira viver um bom momento, com crescimento previsto de mais de 7%, favorece a mobilização dos trabalhadores. “É natural, mas não quer dizer isso que deva ser concedido ou não deva ser concedido, apenas é um jogo de forças que sempre existe numa negociação.”
PARA LEMBRAR
Salário ganha da inflação há seis anos
Nos últimos seis anos, a maioria das negociações salariais em todo o País resultaram em aumentos acima da inflação. Nem mesmo a queda de 0,2% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2009 impediu que a maior parte das categorias conseguisse aumento real de salários.
Levantamento do Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (Dieese) mostrou que 79,9% das categorias conquistaram aumento salarial acima da inflação no ano passado. Outros 13% conseguiram a reposição da inflação.
Além da mobilização dos sindicatos, técnicos do Dieese dizem que parte dos
bons resultados nas negociações foram conseguidos graças às medidas anticíclicas adotadas pelo governo federal para incentivar o consumo doméstico, como a isenção do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) dos automóveis e eletrodomésticos.