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Dilma mantém emendas para aprovar piso de R$ 545


Paulo de Tarso Lyra | De Brasília

Os ministros e líderes integrantes da coordenação política de governo convenceram a presidente Dilma Rousseff, na noite de terça-feira, a dar um tratamento diferenciado aos parlamentares na decisão dos cortes no Orçamentos anunciados ontem. Preocupados com a repercussão negativa da medida na votação do salário mínimo de R$ 545, os articuladores propuseram que os R$ 18 bilhões de emendas parlamentares – de um total de R$ 21 bilhões – sejam apenas contingenciados e não cortados do Orçamento. Isso significa que, caso a economia volte a crescer e a arrecadação de impostos retome o ritmo normal, elas poderiam ser liberadas novamente.

No Congresso, o recado foi entendido por quase toda a base aliada, embora o corte, ou o contingenciamento, não tenha sido efetivado ontem. Foi anunciado apenas um número global a ser economizado. Líder do PMDB na Câmara, Henrique Alves (RN) disse que em todo início de ano é natural este movimento de contingenciamento. “Os parlamentares, os governadores e prefeitos estão conscientes de que este é um momento em que todos precisam dar sua cota de sacrifício”, afirmou ele. O líder do PTB na Câmara, Jovair Arantes (GO), disse que todos sabiam que, em algum momento, a crise econômica financeira internacional atingiria as contas públicas brasileiras. “Eu preferia que não tivessem cortes. Mas eles são inevitáveis diante do déficit público e da volta da inflação.”

Mas o deputado Paulo Pereira da Silva, o Paulinho (PDT-SP), continua apostando que o governo será derrotado no plenário na votação do mínimo. “Com a ajuda que o Mantega [Guido Mantega, ministro da Fazenda] nos deu, podemos até aprovar o mínimo de R$ 600 defendido pelo PSDB”. Ele disse que manterá sua emenda propondo um salário mínimo de R$ 580 e que seu partido vai aliar-se ao PCdoB para propor um salário de R$ 560.

Para diminuir as insatisfações na base aliada, Dilma desistiu de vetar, na peça orçamentária, o aumento de R$ 100 milhões para R$ 200 milhões do fundo partidário. Como esse reajuste de 100% foi definido por um acordo de lideranças, Dilma foi avisada que seria péssimo comprar uma briga com os líderes aliados no momento em que o Planalto precisa dos votos para aprovar o novo mínimo.

O governo sinalizou boa vontade com o Congresso, mas quer a certeza de que o esforço será recompensado. Na reunião de terça-feira à noite no Planalto, Dilma fez uma defesa enfática da responsabilidade fiscal mas, acima de tudo, da fidelidade partidária. “Não existe meia fidelidade”, disse a presidente aos responsáveis pela interlocução com o Congresso. Eles terão de mostrar ao Congresso que o mínimo de R$ 545 é compatível com o equilíbrio fiscal do governo e que, se um número maior for aprovado, ficará praticamente impossível cumprir o compromisso de liberar posteriormente as emendas parlamentares.

Ela assegurou também que não fará como o governo anterior, que expôs seus aliados na votação do salário mínimo e do reajuste dos aposentados mas, quando o Congresso aprovou um número maior que o defendido pela equipe econômica, não teve coragem de vetar. “Existe uma preocupação real com o risco da volta da inflação.”

Além disso, o discurso para o Congresso é que, mais importante do que os R$ 545, é a manutenção da política de valorização do salário mínimo, com base na inflação do ano anterior mais o PIB de dois anos antes. E que o valor atual é apenas consequência desta tese.

Para o governo, qualquer reajuste fora desta equação significaria prejuízos praticamente irreversíveis para a política elaborada em parceria com as centrais sindicais. Caso o governo ceda agora e antecipe o aumento de quase 14% previsto para 2012, abriria brechas para que, no ano que vem, algum setor proponha o parcelamento do reajuste. Além disso, o Planalto alertou os aliados para análises contrárias feitas por alguns especialistas que consideram a fórmula atual indexadora. “As centrais sindicais deveriam estar mais atentas à isto”, afirmou um aliado de Dilma.

A decisão de Dilma de encaminhar o reajuste do salário mínimo por projeto de lei, e não por medida provisória, executa duas estratégias do governo. Medidas provisórias têm vigência imediata e projetos de lei têm uma tramitação mais demorada. Mas, neste caso, se o Congresso demorar a aprovar o PL, terá que prestar contas aos trabalhadores que ficarão sem o reajuste do mínimo. E mais: o governo não encaminhará o outro projeto corrigindo em 4,5% a tabela do Imposto de Renda, jogando a classe média contra o Legislativo.

A escolha de um PL com urgência urgentíssima também não foi por acaso. Emendas em medidas provisórias necessitam de 60 assinaturas para serem apresentadas. Projetos com urgência requerem 103 – um terço da Casa, dificultando o trabalho dos dissidentes. “Em vez de apresentarmos várias emendas, tivemos que fazer uma, amplificada, para tentarmos derrotar o governo”, reconheceu o deputado Paulinho (PDT-SP).

Alguns integrantes da base aliada, contudo, acham que o governo está arriscando muito seu capital político em um início de mandato. Segundo eles, é um perigo confiar em um acordo de líderes em um Congresso recém-empossado. “Tirando líderes como Henrique Alves (PMDB-RN) e Antonio Carlos Magalhães Neto (DEM-BA), a maioria dos demais não consegue controlar 10% de suas bancadas”, disse um experiente deputado nordestino. Mas o recém-nomeado líder do PR na Câmara, Lincoln Portela (MG), disse que os aliados têm de ter consciência de que “ser governo não tem apenas bônus, mas também responsabilidades”.