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Empresários e sindicalistas divergem sobre projeto de distribuição do lucro


Juliano Basile, Paulo de Tarso Lyra e Vandson lima, de Brasília e São Paulo

Representantes da indústria e de centrais sindicais têm posições totalmente distintas com relação ao projeto de lei do Ministério da Justiça, que estabelece a obrigatoriedade de as empresas distribuírem pelo menos 5% de seus lucros a seus funcionários. Para a indústria, o texto é impositivo e não cria incentivos para a distribuição de lucros. Para as centrais, o projeto favorece o diálogo entre patrões e empregados.

“Nós gostaríamos de um incentivo, e não de uma obrigação”, afirmou Emerson Casali, gerente-executivo de Relações de Trabalho da Confederação Nacional da Indústria (CNI). Para ele, o projeto de lei deveria induzir as empresas distribuírem os seus lucros com desonerações tributárias, por exemplo. “Qualquer alteração neste sentido deve vir pelo incentivo e não pela coerção.”

Segundo Casali, as empresas e os bancos foram pegos de surpresa. As cinco confederações empresariais, que representam mais de 95% das companhias do Brasil, sabiam que havia uma comissão presidida pelo Ministério da Justiça discutindo o assunto e chegou a formalizar uma reclamação pelo fato de não serem chamadas para o debate. As confederações são: CNI, CNA (agricultura), CNT (transporte), Consif (sistema financeiro) e CNC (comércio). “A primeira coisa que nos chamou a atenção foi que isso foi construído sem o devido diálogo entre trabalhadores e empregadores”, disse.

A CNI avaliou ainda que os dez projetos concluídos pela comissão presidida pelo Ministério da Justiça vão onerar as empresas e desestimular a geração de empregos. Os projetos protegem os funcionários contra medidas antissindicais e garantem o pagamento a maior em decisões judiciais. “A impressão para nós é que o pacote faz parte de um movimento político, feito para ser apresentado num fórum social.”

O pacote foi, de fato, apresentado, ontem, no Fórum Social Mundial, em Porto Alegre. Enquanto a indústria questionou as medidas, representantes de duas das principais centrais sindicais do país se pronunciaram favoráveis aos projetos.

Para João Carlos Gonçalves, secretário-geral da Força Sindical, a instituição da participação nos lucros é boa e vem ao encontro da tendência dos movimentos sindicais, que buscam maior diálogo com o empregador. “É importante para o trabalhador entender que o bom desempenho da empresa onde trabalha volta para ele. Há tempos temos a experiência de negociação com as empresas e, com a lei, esse diálogo tende a se estabelecer”, disse Gonçalves.

O presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Artur Henrique, salientou a necessidade de uma distribuição de lucros igualitária entre funcionários: “É como um time de futebol, uns podem ganhar mais do que os outros, mas o prêmio pela vitória tem de ser igual”. Artur ressaltou ainda a necessidade de participação dos sindicatos nas negociações. Ambos disseram ter recebido a notícia pelo Valor e que, assim que tiverem acesso à íntegra do projeto, convocarão reuniões para estudar os detalhes da proposta.

A Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), por meio de sua assessoria de imprensa, afirmou que aguardará a apresentação da íntegra do projeto por parte do governo, antes de se posicionar.

O ministro da Justiça, Tarso Genro, afirmou, ontem, que a participação nos lucros é uma obrigação prevista na Constituição de 1988. “Não é questão de ser ou não viável. É uma determinação constitucional que ainda não foi cumprida.”

Ele advertiu que o texto do projeto de lei pode ser alterado antes de ser enviado para o Congresso. “Ainda não há posição fechada do governo, pois esses projetos serão discutidos pelo Ministério do Trabalho no Fórum Social Mundial.”

O pacote trabalhista foi elaborado por uma comissão interna do governo, com representantes dos ministérios do Trabalho, da Previdência, da Secretaria de Assuntos Estratégicos, da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), além de diversas associações e juristas. A presidência da comissão foi exercida por Rogério Favreto, secretário de Reforma do Judiciário do Ministério da Justiça.