Otavio Albrecht
Acordo coletivo é o contrato firmado entre empresa e sindicato dos empregados, e que traz em seu bojo condições de trabalho especiais. Pouca gente sabe, porém, que os tribunais superiores admitem que este acordo possa ser feito sem a anuência do sindicato, considerando como válida a negociação estabelecida diretamente entre empregados e empresa empregadora.
O pouco conhecimento acerca desse tema está relacionado à origem do direito sindical no Brasil e à visão ainda fortemente enraizada na supremacia sindical. Notório é que, com o movimento intitulado como ressurgimento das lutas sindicais, que se deu em meados da década de 40, conjuntamente com a promulgação da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) de 1943, emergiu a apologia da supremacia do sindicalismo e da soberania sindical até mesmo sobre a vontade da categoria profissional representada.
Como consequência, se verifica uma enorme dificuldade das pequenas e médias empresas para firmar acordos coletivos com seus empregados, pois como a lei prevê a presença do sindicato, tanto na negociação, como na homologação dos acordos coletivos, as empresas tornaram-se reféns da volição sindical.
No entanto, em certas ocasiões ou circunstâncias, os empregados de uma empresa têm interesse em determinada composição com seu empregador, mas o sindicato profissional cria barreiras ou faz oposições, ou ainda se omite, inviabilizando a confecção do acordo coletivo.
Para transpor tais obstáculos, o legislador, na previsão contida no artigo 617 da Consolidação das Leis do Trabalho, deixou uma alternativa, autorizando o acordo coletivo celebrado diretamente entre empregados e empregador.
O acordo coletivo deve espelhar os interesses dos empregados e não os do sindicato. Entendendo nesse lineares, o Tribunal Superior do Trabalho (TST) esclarece que é legítima a atuação de comissão de empregados constituída para o fim de firmar negociação coletiva com o empregador, tendo o sindicato se negado a participar da negociação.
Nesta esteira lógica contempla-se a solução, ou melhor, uma forma de permear o problema apresentado, firmando um acordo coletivo que expresse a vontade resultante de negociação direta entre empregados e empregador.
Cabe esclarecer que a comissão de empregados e a empresa deverão solicitar a participação do sindicato na negociação. A inércia ou a negativa na participação, contudo, não é mais obstáculo intransponível para a confecção do acordo coletivo entre a empresa e seus empregados.
Deste modo, torna-se legítima para firmar o acordo coletivo a comissão de empregados, que é constituída para esse fim, pois os titulares dos direitos são os empregados. O sindicato profissional deve se ajustar à vontade que os empregados livremente expressem e ao que atenda aos seus interesses, mormente considerando-se as peculiaridades que envolvem a prestação de serviços e a realidade econômico-financeira do empregador.
Cabe observar, no entanto, que os procedimentos para assinatura do acordo são trabalhosos e devem ser seguidos pormenorizadamente para evitar a nulidade do documento quando for levado à apreciação do Tribunal Regional do Trabalho. A burocracia apresentada, porém, não pode ser suficiente para desanimar os empresários brasileiros, pois inúmeras soluções podem nascer da celebração de um acordo coletivo.
Para elucidar melhor a grandiosidade das soluções que podem surgir de um acordo coletivo, cabe destacar a jornada de revezamento de 12 horas de trabalho por 36 de descanso, a qual não é admitida em negociação individual com o empregado, uma vez que excede o limite constitucional de oito horas diárias, mas foi aceita em negociação direta entre comissão de empregados e empregador (E-RR -3154/2000-063-02-00.3 e E-RR-984/2002-008-17.00.7).
Outro ponto atualmente aceito pelo Judiciário é referente à natureza do auxílio-alimentação que ao ser firmado em acordo coletivo, não mais terá natureza salarial, independente da adoção do PAT, assim não mais integrando os vencimentos do empregado. (RR-137740-07.2003.5.13.0002)
A substituição da hora noturna reduzida pelo recebimento de adicional de 40% sobre o salário-hora, bem como a redução do adicional de periculosidade, passando dos intocáveis 30% para 10,12%, são outros exemplos de acordo coletivo pactuados diretamente entre empregados e empregador, que foram capazes de atender aos anseios de ambas as partes (RR-1916/2003-099-03-40.9 e E-RR-14328/2002-004-09-00.1).
As diversas matérias que podem ser objeto de acordo coletivo e a possibilidade de suplantar a anuência do sindicato têm levado empresas a enxergarem nesta modalidade de negociação uma saída para as relações laborais. Neste estado de euforia, é preciso lembrar que a análise deve ser meticulosa, e deve ser feita em conjunto com a teoria do conglobamento, que preconiza que as normas devem ser consideradas em seu conjunto, não se admitindo a cisão do instrumento que contém as normas aplicáveis.
Pautando-se no princípio da unicidade das normas coletivas e na aplicação da teoria do conglobamento, o Judiciário proferiu decisão inesperada, emergindo até mesmo a possibilidade de o acordo coletivo suplantar, em eficácia, a convenção coletiva (E-ED-RR-1009-2002-074-15-00.2).
Frente a todas as possibilidades negociais que podem emergir do acordo coletivo, é certo que se abre uma nova motivação para se obter composições que contemplem as necessidades deste mundo cada vez mais ágil e em constante mudança.
Otavio Albrecht é advogado especializado em direito do trabalho do escritório Palópoli Advogados Associados