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Reajuste menor do seguro-desemprego revolta Centrais

Governo mudou cálculo do aumento do valor do benefício, que subiu 6,2% em vez de 9% para quem ganha até um salário mínimo

Marcelo Redher – O Estado de S.Paulo

O governo achatou o reajuste dos valores do seguro-desemprego para quem ganha mais de um salário mínimo, sem consultar o Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador (Codefat), provocando revolta das centrais sindicais. No mês passado, o secretário executivo do Ministério do Trabalho, Marcelo Aguiar, atual presidente do Codefat, mandou publicar no ´Diário Oficial´ da União uma resolução ad referendum do Conselho alterando a regra para o reajuste do benefício de quem ganha acima do mínimo.

O cálculo do benefício nas faixas acima do piso (hoje em R$ 687) passou a ser feito com base na inflação medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), em substituição ao índice que reajusta o salário mínimo, que sobe de acordo com o Produto Interno Bruto (PIB) e com a inflação. Se a regra fosse mantida, as faixas do seguro-desemprego teriam de subir 9% neste ano, e não os 6,2% anunciados pelo governo.

A justificativa apresentada por Aguiar para mudar a fórmula que reajustou o benefício nos últimos dez anos foi a necessidade de preservar o equilíbrio das contas do FAT (ver entrevista abaixo). Mas sindicalistas viram na medida uma manobra da equipe econômica na tentativa de garantir o cumprimento da meta do chamado superávit primário – a economia de recursos do governo para pagar os juros da dívida pública. Não é uma tarefa fácil para o governo.

A meta deve ficar em 2,1% do PIB, a mesma do ano passado, porém o Ministério da Fazenda quer ampliar de R$ 25 bilhões para R$ 45 bilhões o montante de recursos que podem ser descontados do esforço fiscal.

Com o reajuste limitado ao INPC, o valor máximo da parcela do seguro-desemprego passou para R$ 1.235,91. Se fosse usado o índice do salário mínimo, esse valor seria R$ 32,50 maior.

Malandragem. “O governo está roubando o coitado do desempregado”, afirma o presidente da Força Sindical, deputado Paulo Pereira da Silva (PDT-SP), o Paulinho. “Parece pouco, mas só com essa ´malandragenzinha´ de não aplicar o reajuste do salário mínimo eles vão economizar R$ 700 milhões.”

Para o presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Wagner Freitas, a iniciativa do governo causa estranheza. “Não consigo entender qual é o objetivo dessa medida, que não me parece nem positiva nem necessária”, diz Freitas.

O sindicalista argumenta que a economia que o governo faz não chega a R$ 1 bilhão, e ressalta que em momento nenhum foi apontado qual será o destino desses recursos. “Queremos que o governo explique oficialmente a motivação da medida para tomarmos as medidas providentes”, afirma o presidente da CUT.

A mudança na fórmula de reajuste do seguro-desemprego será discutida em reunião do conselho marcada para o próximo dia 28, que deverá referendar ou não a resolução do governo. Antes, porém, no dia 18, os conselheiros das centrais sindicais terão um encontro com o representante do Ministério do Trabalho no Codefat, para cobrar explicações sobre a medida.

O Codefat é um colegiado de caráter tripartite e paritário, composto por representantes dos trabalhadores, dos empregadores e do governo, que atua como gestor do FAT. Para aprovar a medida, o governo precisará de maioria simples, ou seja, 50% mais um.

“Estamos trabalhando para derrotar a proposta”, diz Sérgio Luiz Leite, representante da Força Sindical no Codefat. “A informação que nós temos é de que os economicistas do governos mandaram não dar um centavo a mais além da inflação para as faixas acima do piso, como foi feito na Previdência Social.”

Se o governo conseguir convencer o Conselho, o presidente da Força promete não ficar de braços cruzados. “Vamos entrar no Supremo (Tribunal Federal) com uma Adin (ação direta de inconstitucionalidade) contra o governo”, afirma Paulinho. “Roubar da pessoa na hora em que ela mais precisa é inaceitável.”

Rotatividade. Para os sindicalistas, o governo deveria trabalhar para reduzir a rotatividade da mão de obra no País, o que diminuiria os gastos com seguro-desemprego. No ano passado, o País criou cerca de 1,5 milhão de empregos formais. Só que, para chegar a esse saldo, foram feitas 17 milhões de contratações e 15,5 milhões de demissões. O resultado foi o pagamento de R$ 25 milhões em seguro-desemprego para cerca de 8 milhões de trabalhadores.

“Não pode pesar nas costas do pobre beneficiário toda a responsabilidade por esse gastos”, diz Canindé Pegado, representante da União Geral dos Trabalhadores (UGT) no Codefat. “É preciso encontrar mecanismos capazes de combater a rotatividade, principalmente nos setores que estão sendo beneficiados pelo governo com incentivos fiscais”, defende o sindicalista.

ENTREVISTA

´Objetivo foi buscar o equilíbrio do Fundo´

Presidente do Codefat diz que decisão de alterar a fórmula de reajuste do seguro-desemprego será discutida por conselheiros

O secretário executivo do Ministério do Trabalho e atual presidente do Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador (Codefat), Marcelo Aguiar, afirma ter assinado a resolução alterando a fórmula de reajuste do seguro-desemprego pensando no equilíbrio futuro das contas do FAT. No próximo dia 28, ele vai tentar convencer os conselheiros do Fundo sobre a justeza dessa medida.

A seguir, os principais trechos da entrevista.

O que motivou essa resolução? 

A decisão foi ad referendum do Codefat, que vai se reunir agora no dia 28 de fevereiro. Lá o Conselho vai discutir e vai referendar ou não essa decisão. Como presidente do conselho, eu tomei essa decisão, primeiro com base na necessidade de equilíbrio financeiro do FAT. Segundo, em função de estarmos numa situação de aumento constante dos gastos do seguro e da necessidade de tomar algumas medidas para pensar no futuro do fundo. Outro, é que já foram utilizados diversos índices para reajustar o seguro-desemprego, como INPC, URV, IGP.

Isso justifica o aumento menor do benefício ao desempregado?

Também levei em consideração, para tomar essa decisão, o crescimento real do salário mínimo nos últimos dez anos. Tínhamos, há dez anos, um salário mínimo que valia US$ 100. Hoje nós temos um que vale US$ 300. O poder de compra é muito maior. Outra coisa é que o reajuste pelo INPC impacta menos de 30% dos beneficiários do seguro-desemprego. Historicamente, 70% dos beneficiários acessam o seguro e recebem pela primeira faixa, que é um salário mínimo integral. Para essa grande maioria dos trabalhadores, não houve nenhum impacto, porque obedeceu ao reajuste do salário mínimo. Na segunda e terceira faixas, que são menos de 70% dos trabalhadores, justamente os que ganham mais e que vão receber mais do que um salário mínimo, é que houve a decisão de reajustar pelo INPC.

Para alguns sindicalistas, o governo está roubando o desempregado.

Eu não quero polemizar nem dar uma resposta a isso, porque eu não concordo. Acho que não corresponde aos objetivos que a gente tinha quando fez isso.

Eles argumentam que gente do próprio governo diz que a medida visa ao superávit primário.

Não posso emitir opinião sobre uma coisa que não falei nem ouvi. O que posso dizer é que a decisão foi tomada com base na necessidade de buscar equilíbrio do fundo. E é o mesmo índice utilizado para o reajuste dos benefícios da Previdência Social, que é aceito pela ampla sociedade brasileira. Os representantes das centrais sindicais vão estar na reunião do Conselho, Nós vamos fazer uma discussão lá e tentar convencê-los da justeza dessa proposta. Caberá ao Conselho a decisão.

Há desequilíbrio nas contas do FAT?

Não há. A nossa intenção é pensar no futuro, para que não haja desequilíbrio futuro. Eu tenho de me precaver no presente para que não haja desequilíbrio no futuro, e o Conselho seja obrigado a tomar decisões muito mais duras.

Em vez de achatar o reajuste do seguro, por que não atacar a rotatividade da mão de obra, que estaria causando o aumento dos gastos?

Na pauta da reunião do dia 28, um dos itens é justamente a discussão da regulamentação do artigo 239 da Constituição Federal que trata da rotatividade. O governo vai colocar isso em discussão e quer tomar medidas também para diminuir essa rotatividade. / M.R.