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SINDICALISMO E NOMEAÇÕES PARA MAGISTRADOS NOS TRIBUNAIS DO TRABALHO

FRANCISCO GÉRSON MARQUES DE LIMA

Doutor, Professor na UFC, Subprocurador-Geral do Trabalho, Tutor do GRUPE-Grupo de Estudos em Direito do Trabalho, membro da Academia Cearense de Direito do Trabalho (ACDT) e da Academia Cearense de Letras Jurídicas (ACLJ)

Resumo: Os tribunais do trabalho e, de resto, o STF são responsáveis pela jurisprudência trabalhista. A depender do perfil ideológico, da concepção jurídica e da formação intelectual dos membros dessas Cortes (STF, TST e TRTs), as teses contidas na jurisprudência poderão ser mais avançadas, conservadoras, humanísticas ou menos social. No entanto, os magistrados dessas Cortes são nomeados pelo Presidente da República, segundo critérios políticos (ressalvadas as promoções ordinárias na carreira, que são mais técnicas). Considerando as características do Governo atual, é imperioso que as entidades sindicais reivindiquem participação no processo de indicação dos magistrados dos tribunais do trabalho. Afinal, deve ser do interesse dos sindicatos acompanharem essas nomeações e municiarem o Presidente da República com as devidas informações, mesmo que apenas politicamente.

Palavras-chaves: Justiça do Trabalho. Sindicalismo. Nomeação política de magistrados. Interpretação social.

Sumário: 1. Mudança de Governo: novas nomeações para os Tribunais; 2. A jurisprudência é feita pelos juízes, notadamente pelos tribunais; 3. Procedimento de nomeação dos membros dos tribunais; 4. Qual perfil de magistrados do trabalho se quer para os tribunais? 5. Mapeamento de vagas nos tribunais do trabalho pelo sindicalismo; 6. Considerações finais.

 

 

  1. Mudança de Governo: novas nomeações para os Tribunais

 

Há certo tempo, temos chamado a atenção para dois pontos sobre a interpretação social do ordenamento pelos tribunais do trabalho, no que diz respeito à sua relação com o movimento sindical brasileiro: (a) a competência e a responsabilidade que o Presidente da República possui na indicação e na nomeação desses magistrados; e (b) a importância de as entidades sindicais, especialmente as Centrais, acompanharem as nomeações dos magistrados nos Tribunais Regionais do Trabalho (TRTs) e no Tribunal Superior do Trabalho (TST), bem como no Supremo Tribunal Federal (STF). Com base, principalmente, no primeiro ponto, vínhamos alertando a alguns sindicalistas o impacto que a eleição Presidencial de outubro de 2022 acarretaria na composição dos tribunais, conferindo-lhes perfil mais conservador ou não.

A interpretação restritiva que o STF tem dado aos direitos sociais do trabalho e às competências da Justiça do Trabalho, por exemplo, decorre exatamente do perfil que os Presidentes da República elegeram para o(a)s candidato(a)s indicados e nomeados para o posto de Ministro. Enquanto a Corte Suprema tem se destacado, positiva e recentemente, por sua atuação na defesa do Estado de Direito e das liberdades públicas, por outro lado tem apresentado uma visão bastante desfavorável à manutenção, proteção e evolução dos direitos e garantias oriundas (inerentes) e decorrentes da relação de trabalho.

Estas considerações constaram em obra lançada no Congresso “Pensar Brasil”, realizado em maio/2022, no Rio de Janeiro, promovido pelo SINDILEGIS, SINDIJUS, FECOMÉRCIO/RJ, FECOMERCIÁRIOS/SP e Instituto CONECTA, sob a coordenação da EXCOLA. Ao colaborarmos com o evento e na organização do livro congressual, logramos inserir observações práticas sobre como as eleições presidenciais de 2022 impactariam na composição dos tribunais (Pensar Brasil: diálogo sobre trabalho, desenvolvimento e futuro. Brasília: Excola editor, 2022, p. 5-7).

Ali, fizemos estimativa de que o novo Presidente nomearia, ao longo do mandato iniciado em janeiro/2023, cerca de 05 ou mais ministros para o TST e 03 para o STF, o que poderia acarretar mudança, manutenção, avanço ou regressão na interpretação do ordenamento.

Os novos ministros que vierem a integrar o STF-Supremo Tribunal Federal, por exemplo, poderão formar maioria em temas muito sensíveis para o mundo do trabalho, como a Convenção 158-OIT (garantia de emprego), limites da dispensa coletiva (julgado no RE 999435, Tema 638, mas ainda carente de esclarecimentos complementares), liberdade e financiamento sindical, direito de greve, interpretação dos direitos sociais previstos na Constituição Federal (CF), trabalho escravo, novas tecnologias do trabalho (ex.: Uber, Ifood), aspectos da terceirização (este tema e o da dispensa coletiva ainda suscitarão discussões além das apreciações já feitas), regras de aposentadoria, competências da Justiça do Trabalho etc. Aliás, em face das competências e poderes do STF, vários outros temas passarão pelo seu crivo, envolvendo tributação, infrações criminais, investigação de autoridades públicas, combate à corrupção, causas de meio ambiente, servidores públicos, direitos de minorias e povos originários, demarcação de terras indígenas, processos contra autoridades, questões eleitorais etc. Em decorrência de sua composição atual, matérias trabalhistas que findavam no TST passaram a ser apreciadas pelo STF, cuja interpretação tem sido deveras restritiva quanto às competências da Justiça do Trabalho e aos direitos da relação de trabalho, onde a exegese prevalecente tem sido a interpretação econômica do Direito.

No âmbito do TST-Tribunal Superior do Trabalho, órgão constituído por 27 integrantes, com turmas compostas ordinariamente por 03 Ministros (são 08 Turmas + SDC + SDIs I e II), a chegada de 05 ou mais novos componentes significaria muito na consolidação de entendimentos, na reavaliação de sua jurisprudência ou na formulação de novas interpretações, com repercussão em todos os Tribunais Regionais e Varas do Trabalho. Quase todas as matérias trabalhistas referidas no parágrafo anterior resultarão das decisões do TST, que poderão chegar ao STF por meio dos instrumentos processuais previstos legalmente. As matérias e os processos trabalhistas de maior relevância acabam tendo algum tipo de apreciação pelo TST, frequentemente com impacto em toda a Justiça do Trabalho. E, a bem da verdade, a própria interpretação da Reforma Trabalhista de 2017 e das supervenientes, inclusive as eventualmente empreendidas pelo novo Governo, passaram ou passarão mais cedo ou mais tarde pelo crivo do TST. A limitação ao acesso à Justiça do Trabalho pela Lei nº 13.467/2017, encarecendo a demanda pelos trabalhadores e sujeitando-os a pagar custas e honorários (advocatícios e periciais), foi submetida ao crivo tanto do TST quanto do STF, onde sofreu matização – mas poderia ter sido afastada na íntegra, para restabelecer o amplo acesso pelos necessitados, que são a regra na Justiça do Trabalho, uma Justiça das causas de desempregados e da miséria no emprego.

É certo que, em termos de amplitude e definitividade, este impacto jurisprudencial será sentido, com mais veemência, nas decisões do STF, especialmente em sede de ações de controle de constitucionalidade, nos recursos recebidos com repercussão geral, nas reclamações constitucionais e nas ações por descumprimento de preceitos fundamentais, todas estas modalidades de demandas que geram julgamentos com efeitos erga omnes. Mas alguns desses instrumentos processuais também são de alçada do TST, sobretudo ante a vinculatividade, direta ou indireta, dos precedentes, das súmulas e da jurisprudência consolidada. Por exemplo, o art. 896, § 7º, CLT, impede o recurso de revista para o TST quando o acórdão Regional estiver de acordo com os precedentes e as súmulas desta Corte Superior.

Quem indica os ministros do STF e dos Tribunais Superiores é o Presidente da República, que os nomeia após a aquiescência do Senado Federal. Então, por se tratar de critério subjetivo, essa indicação depende do perfil ideológico do Presidente da República e do Senado, que, obviamente, alçarão os nomes de profissionais de seu círculo político-ideológico ou cujos perfis sejam compatíveis ou mais próximos das suas concepções. Se o Presidente e o Senado tiverem tendência conservadora ou social democrática esses ministros certamente serão profissionais que se identificam com tal conjuntura.

Esta forma de nomeação se estende, também, ao Procurador-Geral da República — que possui atribuições de alta envergadura na cúpula dos poderes, como a legitimidade para ajuizar ações de inconstitucionalidade (inclusive de normas trabalhistas) e para promover a responsabilidade de autoridades públicas do alto escalão. As nomeações também ocorrem para membros do CNJ-Conselho Nacional de Justiça e do CNMP-Conselho Nacional do Ministério Público, órgãos que fiscalizam as atividades dos magistrados, dos promotores e procuradores, respectivamente.

Mas a jurisprudência dos Tribunais Superiores e do Supremo, apesar da ampla abrangência e, muitas vezes, do caráter vinculante direto ou indireto, não ostenta todo o manancial de julgados relevantes do país. Afinal, as ações nascem no primeiro grau e, frequentemente, sucedem os recursos para o segundo grau. É nestas instâncias onde ocorrem o maior número de processos judiciais, já que os recursos para o TST e para o STF encontram muitos obstáculos e seus pressupostos legais inviabilizam os apelos dos trabalhadores e das Reclamações de baixo valor.

Frise-se que o Presidente da República é quem nomeia os Desembargadores dos Tribunais Regionais do Trabalho (art. 115, CF), onde há constante renovação. Dos 24 TRTs do país, o Presidente empossado em 2023 nomeará novos desembargadores em todos os Estados, muitos dos quais em quantidade considerável de membros, capaz de modificar (ou manter) a jurisprudência local. Então, nos próximos anos, essa jurisprudência local ou regional poderá ser ainda mais conservadora ou assumir posição crítica na aplicação das normas. Os conflitos coletivos, por exemplo, geralmente são processados no âmbito dos TRTs (ou, mais raramente, no TST, quando a conflituosidade ultrapassar o âmbito de competência territorial de um TRT). As pesadas multas impostas aos sindicatos e a decretação frequente de abusividade de greve provêm desses tribunais regionais. E, pode-se afirmar sem receio de errar, que a jurisprudência brasileira sobre o exercício do direito de greve não é das mais avançadas.

Como já dito, muitas matérias trabalhistas findam nos TRTs, porque o Recurso de Revista para o TST se tornou uma via de difícil acesso – sabem-no bem os advogados. A imensa maioria desses recursos não conseguem subir ao TST ou, subindo, são improvidos ou nem mesmo logram conhecimento (vejam-se dados no Relatório da “Justiça em Números 2022”, in https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2022/09/justica-em-numeros-2022-1.pdf). Logo, muitos processos acabam no segundo grau, predominando portanto a jurisprudência regional. Processos de vínculo de emprego, verbas rescisórias, indenizações por danos morais, estabilidade, discriminação no emprego etc., raramente sobem ao TST.

Esclareça-se: em virtude das regras processuais, algumas introduzidas pela Reforma Trabalhista de 2017, muitas decisões regionais ou locais não podem sequer ser recorridas para instâncias superiores, razão pela qual acabam se consolidando em sua abrangência territorial. E, como se sabe, é difícil modificar-se jurisprudência consolidada. Enfim, várias matérias acabam sendo resolvidas definitivamente pelos próprios Tribunais Regionais, não chegam ao TST. Uma constatação é que, na prática, os grupos econômicos e as grandes empresas conseguem levar suas teses com mais facilidade às instâncias superiores, em razão da transcendência da causa, um dos pressupostos dos recursos para o TST e, a seu modo, para o STF (repercussão geral). Ou seja, a própria legislação processual, interpretada no rigor literal ou pouco social, faz uma opção favorável à classe econômica, que tem a seu dispor recursos infindáveis que eternizam a entrega final e efetiva da prestação jurisdicional. E a via crucis do trabalhador se prolonga na fase de execução, ante a interpretação predominante geralmente é benevolente às teses do “devedor sabido”.

Então, o quadro jurisprudencial depende, inequivocamente, da concepção dos juízes que a constroem. E os juízes das instâncias superiores possuem maior força na unificação do entendimento do Judiciário. A jurisprudência que de fato vincula é a dos tribunais, a começar pela dos Regionais.

 

 

  1. A jurisprudência é feita pelos juízes, notadamente pelos tribunais

 

Os juízes são livres para interpretar a lei, embora dentro de uma razoabilidade estabelecida pelo Estado de Direito, ante a separação dos poderes. E cada magistrado deita um olhar diferente sobre as regras jurídicas, ampliando-as, restringindo-as ou declarando seu sentido. O sistema de precedentes procura reduzir a miríade de interpretações e conferir estabilidade à jurisprudência.

No Direito do Trabalho, a jurisprudência cumpre função histórica de criação de direitos, não apenas de interpretação estritamente legal. Isso se dá em virtude do uso da equidade, que é autorizada pela CLT (arts. 8º e 766). Esta pessoalidade e subjetividade interpretativa é sentida até quando ocorre mudança de membros em uma Turma ou unidade julgadora nos tribunais. O exemplo que se traz à colação é o da SDC-Seção de Dissídios Coletivos (TST), que desconstituiu cláusulas históricas em categorias de trabalhadores (v.g., dos correios e da Petrobrás), em 2020, quando tinha uma determinada composição, e que, porém, restituiu aos obreiros dos correios parte das cláusulas cassadas, em 2021/2022, em virtude do remanejamento natural de ministros no órgão julgador (Processos DCG-1001203-57.2020.5.00.0000 e DCG 1001174-70.2021.5.00.0000; o dos petroleiros foi o Proc. DCG-1000376-17.2018.5.00.0000).

Manuel Atienza observa que as regras (métodos) de interpretação são formuladas, geralmente, de maneira bastante aberta, de tal modo que, muitas vezes, podem-se justificar interpretações distintas de uma mesma norma, sem que se possa dizer com clareza que uma delas ou as duas infringiram uma regra interpretativa. Pode-se dizer, aliás, que as regras interpretativas necessitam, se sua vez, ser também interpretadas (Tras la Justicia: una introducción al Derecho y al razonamiento jurídico. Barcelona: Ariel, 1993, pág. 30).

Em conclusão: no final das contas, a interpretação depende de quem julga, embora dentro de uma racionalidade jurídica, normalmente respaldada em métodos interpretativos. É que o juiz é um ser humano, com suas falhas, subjetividades e méritos. É dotado de valores, crenças, concepções particulares, sujeito ao meio cultural e à sua história de vida. Estes fatores moldam sua personalidade e seu gênio, o que refletirá no modo como compreenda os problemas, na subjunção de norma, fato e valor, na escolha do método interpretativo que lhe pareça mais apropriado a resolver a questão que lhe é posta. Mas, essas escolhas e concepções podem não ser sensíveis aos reclamos da justiça social, assumindo uma feição mais liberal, dogmática etc.

Conquanto estas considerações narrem situações referentes ao mundo do trabalho, é óbvio que o mesmo raciocínio vale para a construção ou vivificação da jurisprudência em outros campos do Direito, considerando que os integrantes do STJ-Superior Tribunal de Justiça e dos TRFs-Tribunais Regionais Federais também são nomeados por processos idênticos ao que ocorre com o TST e com os TRTs. No âmbito da Justiça Eleitoral, aliás, a interpretação e aplicação da legislação eleitoral fomenta especial relevância política na nomeação dos integrantes do TSE e do TRE. O TSE possui 7 Ministros, dos quais 03 são do STF, 02 são do STJ e 02 são advogados; todos nomeados pelo Presidente da República. Os TREs são compostos de 07 membros, sendo 04 escolhidos pelo Tribunal de Justiça local, 01 pelo TRF da Região e 02 advogados nomeados pelo Presidente da República. A nomeação dos advogados para os tribunais passa por um processo marcado por forte teor político.

Ou seja, as nomeações impactarão diretamente na interpretação jurídica sobre temas tributários, servidores públicos, meio ambiente, direito penal, corrupção, saúde, educação, liberdades políticas, direitos sociais, direitos econômicos etc.

Naturalmente, os governos se preocupam com os componentes dos Tribunais, porque são esses magistrados que podem reformar as decisões dos juízes de primeiro grau – os quais não padecem das mesmas vicissitudes políticas (em razão da forma de ingresso na carreira, que se dá por concurso público) – e conferir interpretação mais abrangente ou mais restritiva da lei e da Constituição. A jurisprudência tem a força de dar à lei um sentido humanista ou um teor puramente econômico; pode torná-la de vanguarda ou obsoleta; dar-lhe vida ou jogá-la no ostracismo. Em última instância, o sentido da lei está na boca do juiz.

Note-se que a Reforma Trabalhista de 2017, apesar dos muitos artigos que violaram a Constituição Federal e Convenções da OIT, manteve-se praticamente intacta graças às decisões do STF e de outros tribunais. Se seus integrantes tivessem uma concepção mais social e menos economicista, certamente o resultado seria outro. Quem sabe, a reforma trabalhista seria profundamente matizada. E isso implicaria decisivamente no modo como as relações de trabalho se desenvolvem, na compreensão da prevalência do negociado sobre o legislado e nas liberdades sindicais.

Durante a pandemia, quando a MP 927/2020 autorizou a redução da jornada de trabalho com consequente redução salarial, sem negociação coletiva, em afronta ao art. 7º, VI, CF, foi uma liminar proferida pelo STF na ADI 6346 que atestou a constitucionalidade da norma provisória, criando um hiato constitucional, em desprestígio à atividade sindical. A decisão priorizou os interesses econômicos sobre os sociais e sufragou a tese de que os sindicatos poderiam ser afastados, momentaneamente, das negociações entre empregadores e trabalhadores, em virtude da situação excepcional e da urgência empresarial. A interpretação partiu de premissas erradas – porque, contrariamente do que a Corte pressupôs, os sindicatos estavam dando conta da demanda com a rapidez merecida – e chegou a conclusão equivocada, jurídica e socialmente, ao tornar os sindicatos desnecessários para o tratamento coletivo da redução salarial que empresários e governo impuseram aos trabalhadores.

No geral, o STF tem se utilizado de vários argumentos para refutar teses sociais no Direito do Trabalho, como na ADI 5794, ADI 5912, ADI 5923, ADI 5859, ADI 5865, ADI 5813, ADI 5885, ADI 5887, ADI 5913, ADI 5810, ADC 55, ADI 5811, ADI 5888, ADI 5892, ADI 5806, ADI 5815, ADI 5850, ADI 5900, ADI 5950, ADI 5945, julg. 29.06.2018, referentes à facultatividade da contribuição sindical; e ADPF 323, liminar concedida em 14.10.2016 suspendendo a ultratividade dos acordos e convenções coletivas, apesar do contido na parte final do § 2º do art. 114, CF (“… respeitadas as disposições mínimas legais de proteção ao trabalho, bem como as convencionadas anteriormente”). A ADI 6154, sobre trabalho intermitente, tema caro à classe trabalhadora, não foi julgada pelo Supremo até a presente data, conquanto promovida em 07.06.2019. Mas, a Lei nº 13.429/2017, que escancarou as portas à terceirização nos setores público e privado, foi chancelada no julgamento das ADIs 5685, 5686, 5687, 5695 e 5735, em junho/2020.

A forma de interpretar, tendente a um conservadorismo antiquado ou socialmente pernicioso, inclinada às novidades maléficas ou, contrariamente, à defesa dos direitos humanos sociais, não significa necessariamente perda de imparcialidade do intérprete, no sentido processual, mas, sim, expressão da natural formação, convicção e concepção do magistrado. É que, enquanto seres humanos, os intérpretes — aí incluídos os magistrados — não conseguem se despir completamente dos caracteres psicológicos e culturais de sua formação.

Outro ponto a ressaltar é que os governos são provisórios, cumprem mandatos. Mas os magistrados que nomeiam são vitalícios (ressalvados os membros do TSE e dos TREs, que cumprem mandatos). Então, tais nomeações projetarão seus efeitos em governos seguintes, até que surjam novos cargos no Judiciário, normalmente por aposentadorias compulsórias e, mais raramente, por aposentadorias voluntárias ou falecimentos. Este fenômeno aconteceu com a Constituição Federal de 1988: apesar de restabelecer a democracia e modificar profundamente o sistema jurídico anterior, baseado em perspectivas autoritárias, a nova Carta encontrou integrantes nos tribunais e juízes do regime anterior, moldados por concepções ultrapassadas. Todos permaneceram em seus cargos, posto vitalícios. Um dos exemplos mais marcantes nessa fase de reconstrução da jurisprudência foi o mandado de injunção, garantia processual criado pela CF/88 com o objetivo de suprir lacuna do legislador em tema de direitos fundamentais. Todavia, o STF entendeu que o mandado de injunção se prestava, apenas, a notificar o legislador sobre sua inércia legisferativa, nada mais. Somente em 2007, nos MIs 708 e 712, julgados em 2007, é que a Corte compreendeu a real função deste instituto e atribuiu à sentença nele proferido caráter de lei provisória, válida até que o legislador sane a lacuna. Atualmente, o acompanhamento das decisões do STF mostra, por exemplo, a divergência de entendimentos entre ministros nomeados por diferentes Presidentes da República.

Enfim, a nova compleição do Governo, ao escolher membros das Cortes Superiores e Regionais, impactará na forma de aplicação da legislação e no controle dos seus atos, conferindo um tom jurisprudencial mais ou menos social à ordem jurídica e aos direitos sociais e econômicos.

E onde entram as Centrais em tudo isso?

 

 

  1. Procedimento de nomeação dos membros dos tribunais

 

O procedimento para acesso ao cargo de magistrado nos tribunais é complexo e possui muita discricionariedade. Os currículos acadêmicos e profissionais do(a)s candidato(a)s influenciam, mas o que é decisivo mesmo é a influência e os apoios políticos. Quanto mais se sobe na estrutura do Judiciário, mais as nomeações vão se tornando mais políticas e menos técnicas.

Esta interferência da política na composição dos tribunais faz parte do sistema de freios e contrapesos (checks and balances system), em que o Legislativo e o Executivo influenciam na nomeação de desembargadores e ministros, os quais, de sua vez, julgarão os atos do Legislativo e do Executivo. Ao fim das contas, a separação dos poderes não é absoluta. De seu turno, é democrático que a sociedade civil também possa contribuir para as escolhas políticas desses integrantes do Judiciário, assim como elege os membros do Legislativo e do Executivo.

Os governos sociais, trabalhistas, devem ter muita cautela na escolha dos juízes que julgarão as causas sociais. Mais vale uma lei ruim interpretada por um bom juiz do que uma lei boa interpretada por um mal juiz. Na medida em que o Estado tem o Judiciário como o intérprete final da legislação, as estruturas do poder real se preocupam com o perfil de seus tribunais.

Mas há regras, há procedimentos que conferem um mínimo de democracia ao processo de escolha dos desembargadores e dos ministros. O fato, por exemplo, de se possibilitar que as respectivas categorias de advogados, procuradores e juízes selecionem inicialmente seus indicados é expressão de Democracia. Se, internamente, as candidaturas serão bem apresentadas, processadas e votadas, é questão interna corporis de cada uma dessas categorias, que estabelecem regulamentos e regras próprias, dentro da disciplina geral da Constituição.

Para que se tenha uma noção, mesmo que sumária, desses procedimentos, vejam-se as seguintes anotações informativas.

 

  • Nomeações para o TST:

Em breve será aberta uma vaga para o quinto representado pela OAB, a ser preenchida provavelmente ainda no primeiro semestre de 2023 (https://www.oab.org.br/noticia/60674/oab-nacional-e-tst-discutem-envio-de-lista-sextupla-para-vaga-pertencente-a-advocacia). É a vaga destinada aos advogados, decorrente da aposentadoria do ex-Ministro Emmanoel Pereira, ocorrida em outubro/2022. Pela Constituição Federal, um quinto do TST é composto de representantes do MPT e da advocacia, com pelo menos 10 anos de carreira ou de atividade profissional, respectivamente (art. 111-A, inciso I). Entenda-se sumariamente o processo de nomeação de ministro do TST.

A previsão constitucional repousa no art. 111-A, CF, ora transcrito:

 

Art. 111-A. O Tribunal Superior do Trabalho compõe-se de vinte e sete Ministros, escolhidos dentre brasileiros com mais de trinta e cinco e menos de setenta anos de idade, de notável saber jurídico e reputação ilibada, nomeados pelo Presidente da República após aprovação pela maioria absoluta do Senado Federal, sendo:

I – um quinto dentre advogados com mais de dez anos de efetiva atividade profissional e membros do Ministério Público do Trabalho com mais de dez anos de efetivo exercício, observado o disposto no art. 94;

II – os demais dentre juízes dos Tribunais Regionais do Trabalho, oriundos da magistratura da carreira, indicados pelo próprio Tribunal Superior.

 

Na classe dos advogados, a lista é feita inicialmente pelo Conselho Federal da OAB e encaminhados seis nomes ao TST, o qual reduz a três integrantes, em votação plenária. Depois, o Presidente da Corte encaminha esta lista tríplice ao Presidente da República, que fará a indicação de um destes nomes ao Senado, o qual sabatinará o indicado. Aprovado o nome no Senado, será feita a nomeação pelo Presidente da República. Tradicionalmente, o Senado aprova o nome que lhe é encaminhado para composição dos tribunais superiores e STF. Considerando a atual conjuntura política e as falas de alguns Senadores de que farão oposição ferrenha ao Governo, não há condições de afirmar, ainda, se isso afetará as nomeações para os tribunais superiores. Mas uma coisa é certa: os interessados, padrinhos e apoiadores dos nomes das listas precisam fazer uma articulação no Governo e no Senado.

Processo semelhante é feito quanto aos membros do Ministério Público do Trabalho, na respectiva vaga destinada ao quinto, nesta classe. A instituição escolhe seis nomes, em eleição interna dos membros do MPT; depois, submete-os ao TST, que reduz para lista tríplice e envia ao Presidente da República. Este escolhe um e indica ao Senado, onde se dá a sabatina. Caso aprovada a indicação, o Presidente da República fará a nomeação para Ministro da Corte Trabalhista.

Mas as vagas do TST são, predominantemente, de magistrados de carreira, desembargadores dos TRTs. Em apertada síntese, quando declarada a vacância nesta classe, a Corte Superior abre prazo para inscrição de desembargadores interessados, de todos os TRTs, que atendam às condições do art. 111-A, CF, transcrito há pouco. Não se trata de processo de promoção, em que haja alternância de antiguidade e merecimento. A escolha é livre pelo TST, dentre os inscritos que atendam ao art. 111-A, CF, e ao seu Regimento Interno. Dos inscritos, o Tribunal elabora lista tríplice, em votação plenária, e a encaminha ao Presidente da República, que escolhe o nome de sua conveniência e o indica ao Senado. No mais, o rito segue o já explicado nos parágrafos anteriores.

Em todas estas situações, o Presidente da República recebe uma lista tríplice. Apenas a ele compete indicar um dos nomes ao Senado Federal. Então, deve escolher muito bem o candidato, que será vitalício. Esta etapa é tipicamente política. E, nela, é comum haver apoios, pedidos de parlamentares e de autoridades do alto escalão do Estado, além dos apoios de entidades e pessoas que, mesmo não sendo autoridades públicas, possuem influência política perante o Presidente da República.

 

  • Entendendo as nomeações nos TRTs:

Os Tribunais Regionais do Trabalho são órgãos federais. Então, quem nomeia seus integrantes é o Presidente da República. Um quinto dos seus membros são oriundos da advocacia e do MPT, por força de imposição constitucional aplicável a todos os tribunais. Os demais membros são juízes de carreira, provenientes do primeiro grau de jurisdição (Varas do Trabalho), que chegam aos tribunais regionais mediante promoção. Após nomeados, os desembargadores serão vitalícios no tribunal respectivo. Diferentemente dos Tribunais Superiores e Supremo, as nomeações para os Tribunais Regionais (TRTs, TRFs) não são submetidas ao Senado Federal. É o que diz o art. 1, CF:

 

Art. 115. Os Tribunais Regionais do Trabalho compõem-se de, no mínimo, sete juízes, recrutados, quando possível, na respectiva região e nomeados pelo Presidente da República dentre brasileiros com mais de trinta e menos de setenta anos de idade, sendo:

I – um quinto dentre advogados com mais de dez anos de efetiva atividade profissional e membros do Ministério Público do Trabalho com mais de dez anos de efetivo exercício, observado o disposto no art. 94;

II – os demais, mediante promoção de juízes do trabalho por antiguidade e merecimento, alternadamente.

 

As vagas destinadas aos magistrados de carreira são preenchidas com os juízes que se encontrem na quinta parte dos mais antigos, dentre os magistrados titulares de Varas. Sendo vaga de merecimento, o Tribunal analisa parâmetros de aferição de produtividade, presteza, efetividade, qualificação profissional etc., para escolha do que reúna mais elementos positivos. No critério de vaga de antiguidade, o parâmetro é o tempo na carreira/classe. Os nomes escolhidos são encaminhados ao TST, que os enviará ao Presidente da República para nomeação.

Nas vagas do quinto destinado à advocacia e ao MPT, o Presidente do Tribunal oficia, conforme o caso, ao Presidente da OAB local ou ao Procurador-Geral do Trabalho, dando conta da vacância. Como a carreira no MPT é nacional, a eleição será interna, com todos os membros desta Instituição, lotados em qualquer unidade da Federação. A eleição na OAB é realizada, preferencialmente, entre os advogados da Região, o que, na prática, sempre acontece, desde que atendidos os requisitos do art. 111-A, caput e inc. I, CF. A OAB e o MPT elaborarão suas listas sêxtuplas, que serão enviadas ao TRT local. Recebida a respectiva lista, seja a do MPT ou a da OAB, conforme a situação, o plenário da Corte reduz a uma lista tríplice e a encaminha ao TST, que, sem alterá-la, simplesmente a enviará ao Presidente da República. A nomeação será feita conforme a conveniência e o juízo subjetivo do Presidente da República, sem submissão ao Senado. Escolha política, portanto.

No geral, os tribunais possuem normas internas que detalham o procedimento da escolha de seus membros, na conformidade do quadro imposto pela Constituição Federal. A fase anterior ao trâmite no tribunal é regulada pelas próprias instituições (OAB e MPT), onde ocorrem as eleições para escolha da lista sêxtupla de cada uma.

 

  • Nomeações para o STF:

Aberta vaga no STF, o processo de indicação pelo Presidente da República é bastante discricionário. Não há formação de prévia lista sêxtupla nem tríplice. Simplesmente, o Presidente indica ao Senado quem lhe aprouver, atendidos os requisitos do art. 101, CF, verbis:

 

Art. 101. O Supremo Tribunal Federal compõe-se de onze Ministros, escolhidos dentre cidadãos com mais de trinta e cinco e menos de setenta anos de idade, de notável saber jurídico e reputação ilibada.

Parágrafo único. Os Ministros do Supremo Tribunal Federal serão nomeados pelo Presidente da República, depois de aprovada a escolha pela maioria absoluta do Senado Federal.

 

A indicação, portanto, pode recair em um magistrado, Ministro de Tribunal Superior ou não, advogado, membro do Ministério Público, professor etc. O nome indicado será submetido a sabatina no Senado Federal. Caso aprovado, o Presidente da República fará sua nomeação para Ministro do STF. Portanto, é a mais política das nomeações no âmbito do Judiciário.

 

  1. Qual perfil de magistrados do trabalho se quer para os tribunais?

 

Além dos aspectos técnicos-jurídicos, de conhecerem bem a legislação do trabalho e as relações trabalhistas, espera-se que o juiz do trabalho seja sensível às causas sociais, afinado com os princípios do Direito do Trabalho, saiba equilibrar o interesse da classe operária com o das empresas e defenda as competências da Justiça do Trabalho. É pressuposto a compreensão da justiça social e do papel que a Justiça Especializada possui na sociedade. Carlos Alberto Reis de Paula, ex-Ministro do TST, apontava que os juízes do trabalho precisam estar atentos às crises econômicas, aos picos de desemprego e às metamorfoses do modelo empresarial (O papel da Justiça do Trabalho no Brasil. In Revista do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Reg. Belo Horizonte: 29 (59): 53-62, Jan./Jun. 1999).

A compreensão da função do Direito do Trabalho, das suas razões históricas e da sua importância no equilíbrio mínimo entre o capital e o trabalho, é intrínseca aos magistrados do trabalho.

Segundo Antonio Baylos, o Estado cumpre a imprescindível função de remediar as desigualdades, o que conduz “a um importante acordo a respeito do significado político das instituições jurídico-trabalhistas, no sentido de revalorizar a intensidade e os conteúdos do intervencionismo garantista e tutelar”. Segundo o autor, isso ocorre por meio da introdução dos direitos sociais na Constituição, eis que são fundamentais “para configurar a função do Estado que, por meio do pacto constituinte, compromete-se ativamente para conciliar o princípio democrático com um princípio de solidariedade e dotar o termo liberdade de um sentido marcadamente social”. O Direito do Trabalho, então, ainda na concepção de Antonio Baylos, é concebido como um direito especial dos trabalhadores subordinados, “produto do Estado e da autotutela dos próprios trabalhadores, que existe para corrigir e remediar a real desigualdade socioeconômica e jurídica” (Direito do Trabalho: modelo para armar. São Paulo: LTr, 1999, p. 69).

Os sindicatos possuem mecanismos para apontarem, em seus Estados, quais os candidatos que melhor reúnem estas condições. Lidam com advogados da região, participam de audiências com juízes, procuradores e patronos, sabem do perfil do(a)s candidato(a)s etc. Como representantes de categorias, é compreensível que tenham interesse e legitimidade em influenciar na escolha de candidato(a)s que julgarão suas demandas e construirão jurisprudência decisiva sobre questões sensíveis das relações de trabalho.

Considerando que o Presidente Lula provém das lidas sindicais e que sua vitória nas eleições de 2022 se deveu, em parte, ao esforço do sindicalismo brasileiro, principalmente das entidades representantes de trabalhadores, é de se esperar que os sindicatos gozem de certo prestígio no Governo e tenham alguma força política para defenderem seus interesses e de seus representados, direta e indiretamente. O esforço que as Centrais sindicais fizeram no combate ao assédio eleitoral, nos pedidos de providências e nas denúncias a órgãos como o Ministério Público do Trabalho e à Justiça Eleitoral, nas constatações dos diversos empecilhos que certos empregadores e autoridades policiais criavam à liberdade de voto e ao deslocamento de eleitores foram fundamentais para aquele difícil pleito, no qual se disputava voto a voto. Por um triz o fascismo não se perpetua no poder. Cada ajuda dos defensores da democracia, do Estado de Direito e da paz social foi fundamental. E, indiscutivelmente, o sindicalismo brasileiro teve sua destacada contribuição.

Nos dois primeiros mandatos de Lula, 2003-2006 e 2007-2011 (não tanto no governo de Dilma), os grandes sindicatos e as Confederações possuíam certa influência política no processo de nomeação de Ministros do TST e dos TRTs. Depois, com o enfraquecimento dos sindicatos e sobrevindo Governos menos simpáticos ao sindicalismo, essa participação política foi definhando. Houve perda de espaços, que precisam ser resgatados. Não se quer dizer que todos os integrantes dos tribunais nomeados nos últimos anos careçam de certo olhar social do Direito, mas, sim, que as Cortes poderiam contar com número maior de magistrados mais sensíveis à justiça social e aos direitos trabalhistas – e que sejam mais convictos das competências da Justiça do Trabalho.

Onde há escolhas políticas, há manifestações de interesses e interferências também políticas. Afinal, é na política que o poder se revolve, se estrutura e se renova. E o Judiciário é uma das instituições de maior poder nas nações. Controlar ou influenciar suas decisões é fundamental aos que integram o poder real.

Na crise pela qual passam as relações de trabalho, com o grau de precarização aumentando, o país precisa de seus juízes do trabalho. Mais, precisa de magistrados sensíveis às questões sociais e à justiça social. Este perfil em nada prejudica a imparcialidade que se espera dos juízes.

A Justiça do Trabalho há de ser fortalecida, porque ela é a principal responsável, no Judiciário, por dirimir os conflitos entre o capital e o trabalho, entre o subalterno e seu patrão. É o órgão de equalização dos conflitos entre pobres e ricos. Logo, o cenário trabalhista e a formal de resolução desses conflitos precisam ser considerados para o perfil que se pretenda conferir à Justiça do Trabalho. E um dos pontos a considerar para este fortalecimento é, sem dúvida, a nomeação de juízes adequados para esta função.

 

 

  1. Mapeamento de vagas nos tribunais do trabalho pelo sindicalismo

 

Na esteira do que se demonstrou neste artigo, a Justiça do Trabalho se estrutura em três instâncias: 1º grau de jurisdição (varas do trabalho, cujo acesso inicial é por concurso público); 2º grau (TRTs, cujos membros são nomeados pelo Presidente da República por promoção dos juízes na carreira e de um quinto dentre membros da OAB e do MPT); e TST (cujos ministros são nomeados pelo Presidente da República, dos quais um quinto são oriundos do MPT e da OAB).

Em 2022, a Justiça do Trabalho possuía 3.928 cargos de magistrados, dos quais 3.614 estavam providos (restando 314 vagos). No segundo grau, o total de cargos era de 551 desembargadores. São dados extraídos do Relatório “Justiça em Números 2022” (disponível em https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2022/09/justica-em-numeros-2022-1.pdf, acessado em 06.02.2023; pág. 60).

Uma consulta paciente nos sites dos TRTs permite extrair o número de cargos vagos de desembargadores. Tarefa que este autor deixa para outros interessados no assunto. Mas, também, será possível obter esta informação mediante expedição de Ofício ao Presidente do TST, solicitando que informe o número de cargos vagos nos tribunais do trabalho e se o processo de preenchimento já foi iniciado e em que condição ou fase se encontra.

Com muita frequência há vagas nos TRTs, que serão preenchidas conforme os critérios específicos de cata categoria (juízes, advogados e membros do MPT). Todas a ser ocupadas mediante nomeação pelo Presidente da República.

As Centrais – senão, também, as Confederações – precisam dialogar com o Governo para que tenham alguma participação política no processo de indicação e nomeação de ministros do TST e dos desembargadores dos TRTs. Não no sentido de interferir nas atribuições do TST, nem da OAB ou do MPT, mas se sabe como essas nomeações se operacionalizam no campo político. Com certeza, os empresários, suas representações e os políticos que ajudaram a eleger desenvolverão esforços para indicarem pessoas de seu interesse e afinidade, como os advogados de grupos econômicos. Então, o contraponto das Centrais é fundamental para o equilíbrio de forças políticas e, quem sabe, para a indicação de nomes de consenso. Talvez o próprio Governo seja simpático a esta atuação das Centrais, na medida em que elas lhe informem os perfis dos candidatos e como, por seu histórico profissional e acadêmico, poderão interpretar a legislação do trabalho.

Se as entidades sindicais realmente quiserem influenciar decisivamente na construção da jurisprudência trabalhista, precisam aproveitar o momento político atual para contribuírem para a composição dos tribunais.

E isso poderá ser feito mediante o fornecimento de informações ao Governo e na sugestão de nomes de profissionais que integrarão os tribunais do trabalho, quando da nomeação dos integrantes das listas tríplices. Várias vagas surgirão nos tribunais ao longo dos próximos quatro anos, em quantidade suficiente a determinar uma nova jurisprudência ou a manter a já resistente.

Obviamente, as entidades sindicais deverão compreender as peculiaridades de cada processo de nomeação e as etapas próprias que comportarão a articulação política. E, claro, devem se inteirar sobre os candidatos, verificando seus currículos, o histórico de atuação, suas manifestações nas redes sociais, peças jurídicas, principais ações das quais participaram, sua compreensão sobre as relações de trabalho, o que pensam do sindicalismo, do direito de greve, das negociações coletivas, da Reforma Trabalhista de 2017, das mudanças nas relações de trabalho, do fatores da precarização etc.

Partindo do pressuposto de que as entidades sindicais terão acesso ao Presidente da República – de origem trabalhista e, mais especificamente, sindical – , espera-se que reivindiquem algum espaço para esta articulação política e, talvez, até na formação dos dossiês (profissionais) dos candidatos. Afinal, os sindicatos são grandes interessados na jurisprudência que é produzida pelos tribunais do trabalho. Além do conhecimento em Direito do Trabalho, o magistrado que poderá, de fato, influenciar na jurisprudência interna da Corte precisa gozar de respeito jurídico e ter espírito de liderança. E o sindicalismo não pode se deixar engabelar pelos “trabalhistas” de última hora ou “trabalhistas de mera conveniência”.

Já é tempo de iniciar o mapeamento das vagas que existem e que surgirão nos tribunais do trabalho nos próximos dois, três ou quatro anos, identificando quais serão as vacâncias, quais são as do quinto (OAB e MPT) e as da magistratura de carreira, bem como as possibilidades dos candidatos da Região. Quem sabe, poderão, inclusive, incentivar os advogados sindicalistas a concorrerem nas vagas respectivas no momento próprio, dentre os que atendam aos requisitos legais e possuam compromisso, de fato, com a causa social. No âmbito nacional, a corrida para o TST será grande e passará, inexoravelmente, pela avaliação política do Presidente da República.

As Centrais sindicais possuem tentáculos, mãos, olhos e ouvidos em todos os Estados, em razão da sua estrutura nacional e das unidades em cada capital do país. Estas unidades e os sindicatos mais destacados de cada Estado têm condições de fornecerem informações muito úteis à diretoria das Centrais e das Confederações. Informações que não precisam – aliás, nem é conveniente – sejam formais. É que o sindicalismo deve conversar internamente e apresentar seus candidatos ao Presidente da República. Salutar, mesmo, é que os sindicatos possuam seus candidatos e os apresentem às instâncias próprias.

Esta conduta é inteiramente de acordo com as regras democráticas e políticas. Não ferem as escolhas feitas pelo MPT, OAB ou a magistratura nas etapas próprias do processo de escolha dos candidatos que serão submetidos ao crivo presidencial. Não há ilegalidade nem inconstitucionalidade. Não ocorre nem violação à ética.

As eventuais disputas entre as próprias entidades sindicais, quanto aos candidatos que apoiem, haverão de ser resolvidas entre elas próprias, nos consensos que, ajuizadamente, devem construir. Quanto maior o consenso em torno de um candidato, mais fácil e provável será sua nomeação pelo Presidente da República.

 

 

  1. Considerações finais

 

Em um Governo trabalhista, oriundo das lidas sindicais, as Centrais devem reivindicar o protagonismo de prestar informações ao Presidente da República na escolha dos membros da Justiça do Trabalho, no referente à etapa política das nomeações, aquela que pertence à discricionariedade do dirigente máximo do país.

O Direito do Trabalho é aplicado e interpretado conforme as decisões dos juízes, especialmente dos membros dos Tribunais, em razão da jurisprudência vinculativa, das súmulas e precedentes que criam. Uma Justiça do Trabalho conservadora atravanca a perspectiva social e de equidade (art. 8º, CLT). Contrariamente, uma Justiça avançada e crítica vivifica positivamente o Direito do Trabalho e julga melhor os conflitos de trabalho, individuais e coletivos.

Então, o sindicalismo precisa pensar nos planos e projetos que pretendam implementar a médio e longo prazos para as relações de trabalho. E isso passa, inexoravelmente, pela estrutura da Justiça do Trabalho e pelo perfil de seus juízes. Portanto, é recomendável que as entidades da cúpula sindical dialoguem com o Governo atual a respeito das nomeações dos membros dos tribunais do trabalho.

Esta organicidade faz parte do sistema de freios e contrapesos dos poderes, sendo democrático que a sociedade civil também opine e contribua para a escolha de seus juízes, como acontece com as eleições para o Legislativo e o Executivo.