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Para analistas, flexibilizar lei do trabalho exige reforma sindical

Especialistas divergem se a negociação deve prevalecer sobre a norma

RIO e BRASÍLIA – Especialistas se dividem sobre a possibilidade de a negociação ter mais força que a lei trabalhista, conforme defendeu o novo presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST), Ives Gandra Filho, em entrevista ao GLOBO no último domingo. Uns acreditam que privilegiar as conversações vai melhorar o ambiente de negócios, outros acham que somente com a reforma sindical é possível fazer valer a negociação. A permissão de só um sindicato por base territorial e o imposto sindical, dizem, diminuem a representatividade dos sindicatos. Outros são contra e afirmam que direitos trabalhistas estão protegidos pela Constituição.

As associações de classe também entraram no debate. A Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan) apoiou a fala do ministro do TST e diz acreditar que “a flexibilização das relações de trabalho pode contribuir com a retomada do crescimento econômico, pois aumenta a competitividade das empresas brasileiras, se tornando um importante fator para a geração e manutenção de empregos”. Já a Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho (Anamatra), em nota, diz que a medida “representa retrocesso e levaria à fragilização dos direitos trabalhistas.”:

“Fragilizar as regras jurídicas gerais de proteção ao trabalho é negar a tutela legal deferida aos seus destinatários, há mais de 70 anos, e há mais de 25 reforçada pela Constituição de 1988″.

O professor da USP Hélio Zylberstajn, que acompanha as negociações trabalhistas, crê que regras menos rígidas favoreceriam mais acordos, melhorando o ambiente de negócios:

— Um exemplo de como o peso menor da Justiça do Trabalho melhora o ambiente de trabalho e de negócios é a emenda 14, que mudou a regra do dissídio. Antes, bastava uma das partes entrar. Agora, os dois precisam concordar. Com isso, o número de dissídios reduziu.

O professor de Direito do Trabalho da USP, Estêvão Mallet, diz que Gandra Filho tem razão ao chamar a atenção para certas reformas trabalhistas, mas a prevalência do negociado sobre o legislado é “bastante controversa”:

— Antes é preciso alterar a organização sindical. A unicidade imposta (um só sindicato por território) acaba criando entidades fracas e pouco representativas.

O professor também critica a quantidade de tributos que incidem sobre a folha de pagamento, como PIS/Cofins.

— O FGTS tem correção pífia, ou seja, o governo se apropria de uma parte desse valor. Isso faz setores que mais empregam pagar mais impostos. Deveria ser o contrário.

Para Juliana Bracks, professora da FGV Direito Rio, a flexibilização da Justiça do Trabalho é bem-vinda, mas o país ainda não está pronto para uma realidade em que todo o peso das negociações trabalhistas seja colocado sobre os acordos e convenções coletivas. Na avaliação dela, a mudança precisa ser discutida ao lado de uma reforma sindical, que estimule sindicatos mais eficientes. Hoje, destaca, a ausência de competição e a contribuição obrigatória favorecem a proliferação de entidades pouco representativas.

— Hoje, eles têm base territorial e dinheiro daquela categoria, fazendo um bom trabalho ou não — afirma a advogada.

O procurador-geral do Trabalho, Ronaldo Fleury diz que é “radicalmente contra o negociado se sobrepor ao legislado”

— São pontos que sempre foram defendidos, mesmo quando o Brasil estava bem economicamente. Não tem sentido a discussão voltar um momento de crise. Vamos admitir que os trabalhadores sejam mais expostos só para ter o que comer? É esse o país que a gente quer?

Para Eduardo Noronha, professor de Ciência Política da Universidade Federal de São Carlos, o direito do trabalho é “o direito social no Brasil”:

— Não se rompe com uma tradição de uma hora para outra. O ministro pensa mais como economista do que como magistrado. É um absurdo ele defender que os juízes sejam promovidos se conseguirem um acordo. Está dizendo para os juízes que esqueçam seus princípios. É um escândalo.