Por Marta Watanabe | De São Paulo
A balança comercial da indústria de transformação teve déficit de US$ 49,2 bilhões de janeiro a setembro, resultado ligeiramente melhor que o saldo negativo de US$ 49,5 bilhões em iguais meses de 2013, quando se registrou o pior saldo para o período na série levantada pelo Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi).
O problema foi a piora no desempenho das exportações, que caíram 4,2% no acumulado até setembro, contra iguais meses de 2013. No ano passado, na mesma comparação, a queda foi de 0,8%. Ao mesmo tempo as importações recuaram 3,1% até setembro, enquanto em 2013 os desembarques ainda cresceram 7%, sempre contra igual período do ano anterior.
Para Rogério César de Souza, economista do Iedi, do lado das importações o recuo mostra a desaceleração da economia, com perda do poder de consumo interno. Do lado das exportações, fica clara a dificuldade do Brasil em conseguir fazer parte das cadeias globais de valor na condição de exportador.
Essa dificuldade é mais gritante quando se olha a balança de bens industriais. Além da redução de embarques dos produtos da indústria de transformação, porém, a venda ao exterior dos demais bens exportados pelo Brasil, predominantemente produtos agropecuários e minerais, tiveram acréscimo discreto, de 0,7%, devido à queda de preços das commodities no mercado internacional.
Numa comparação ainda mais ampla, afirma o estudo do Iedi, o balanço de pagamentos mostra queda de 0,7% na exportação de bens e serviços no acumulado até setembro de 2014, contra iguais meses do ano passado. Mesmo com uma melhora no último trimestre, o desempenho deste ano deverá contrastar com a alta de 3,3% das exportações mundiais de bens e serviços projetada pela ONU para 2014. A projeção para o conjunto dos países da América Latina e Caribe é de elevação de 3,9%. O índice é o mesmo para o conjunto dos países em desenvolvimento.
O levantamento do Iedi verifica o desempenho da balança comercial da indústria de transformação por segmentos divididos de acordo com a intensidade tecnológica, com base nos critérios da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). O grande sinal de alerta, diz Souza, vem de faixas como a de baixa intensidade tecnológica, na qual estão classificadas as indústrias têxteis, de couros, calçados, alimentos, bebidas, madeira e papel e celulose, entre outros.
Essa foi a única faixa que ainda se mantém superavitária desde 2009, para o acumulado até setembro. Mesmo nela, porém, as exportações recuaram 3,4% na comparação a igual período do ano passado. As importações nessa categoria de indústria aumentaram 3,6% no mesmo período. Mesmo assim o superávit foi de US$ 28,1 bilhões, abaixo, porém, do saldo positivo de US$ 30,15 de iguais meses do ano passado.
Dentro da indústria de baixa tecnologia, o economista do Iedi destaca que a queda de exportação do grupo foi puxada principalmente pelo setor de alimentos, bebidas e tabaco, com queda de 6,3% no acumulado de janeiro a setembro, contra iguais meses do ano passado. Em sentido inverso, a indústria de têxteis, couro e calçados teve alta de 9,6% nos embarques no mesmo período.
No ano passado, na mesma comparação, as exportações também cresceram nesse segmento, em 6,1%. Para Souza, esse desempenho provavelmente é resultado da depreciação do real frente ao dólar no período mais recente.
Entre as quatro faixas de intensidade tecnológica, o maior déficit até setembro ficou por conta do segmento de média-alta intensidade, de US$ 45 bilhões. Estão nesse grupo máquinas e equipamentos elétricos e mecânicos, veículos, produtos químicos e material de transporte, entre outros.
De forma parecida com a balança de toda a indústria de transformação, o saldo não foi tão negativo quanto o déficit de US$ 46,4 bilhões no acumulado até setembro de 2013. Mais uma vez, um dos problemas está na composição do saldo. O setor teve retração de 11,4% nas exportações, puxado principalmente pelo declínio das vendas de automóveis. Foi a terceira queda consecutiva de exportação nessa base de comparação.
O quadro, diz Souza, mostra que uma taxa de câmbio mais favorável para as exportações é importante. “O dólar em patamar mais alto, porém, não resolve tudo.” Ele lembra que a exportação brasileira de manufaturados teve grande impacto este ano com o agravamento da crise argentina e a recuperação muito lenta dos mercados europeus, além da volatilidade cambial, apesar da tendência de alta do dólar. “Mas não é só isso. Há uma questão de competitividade e a necessidade de uma política mais voltada para a exportação.” Além de desvalorização de câmbio, diz Souza, mudanças estruturais são importantes, como a melhor qualificação dos profissionais.
Ao mesmo tempo, a redução das importações pelo setor, não só de bens intermediários como também de bens de capital, além de ser sintoma da produção doméstica em desaceleração em razão da queda de demanda, também pode comprometer a capacidade futura de exportação.
Com déficit de US$ 23,9 bilhões no acumulado de janeiro a setembro, a indústria de alta tecnologia teve o segundo maior déficit para o período, ficando abaixo apenas do saldo negativo de 2013, que registrou déficit de US$ 24,61 bilhões. A melhora de resultado do grupo reflete elevação de 3,8% nas exportações no acumulado até setembro, na comparação com mesmos meses de 2013.
A importação caiu 1,5% no mesmo período. Estão no grupo da alta tecnologia indústrias de aeronáutica e aeroespacial, indústria farmacêutica, de material de informática, fabricantes de rádios e televisores e de instrumentos óticos, entre outros.
O quarto grupo, de média-baixa intensidade tecnológica, ficou no acumulado até setembro com déficit pela quinta vez consecutiva. Nesse período, o saldo negativo foi de US$ 8,5 bilhões, com elevação de 1% na exportação e importações praticamente estáveis, com variação positiva de 0,2%. A média-baixa tecnologia reúne construção, borracha e produtos plásticos, refino de petróleo e produtos metálicos, entre outros.