Poupança: Justiça manda pagar correção

STJ definiu os índices devidos pelos bancos nos planos econômicos, o que vai acelerar os processos na Justiça

Rodrigo Ferreira

Para tentar domar a inflação entre 1987 e 1991, quatro planos econômicos entraram em ação ? Bresser, Verão, Collor 1 e Collor 2 ?, alterando a forma de remuneração da poupança. O resultado foi o mesmo: os consumidores perderam dinheiro.
Inconformados, quase um milhão de poupadores entraram com ações na Justiça, que se arrastam até hoje. A boa notícia é que a espera será menor. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) definiu ontem os índices devidos em cada plano. A decisão fará com que os processos andem mais rápido. O tempo de espera deve cair de quatro para um ano. “O tempo de processo deverá cair consideravelmente, já que o Superior Tribunal já tem um entendimento sobre o assunto”, explica Alexandre Berthe, advogado especialista em revisões.
Há 23 anos, o engenheiro Ricardo Augusto Di Mase, de 60 anos, acompanha as discussões em torno das reposições da poupança. Perdeu dinheiro nos planos Bresser, Verão, Collor 1 e 2 e hoje não acredita que irá recuperar o dinheiro devido. “O dinheiro que perdi daria para comprar um belo sobrado com três quartos”, reclama.
A má notícia é que o prazo para ações coletivas, que poderiam beneficiar quem não entrou com processo, foi reduzido de 20 para cinco  anos. Com isso, apenas 15 das 1.030 ações coletivas vão continuar valendo.
“No caso do Plano Verão, o Idec entrou dentro do prazo de cinco anos e vamos disponibilizar para os poupadores, mesmo os que não são associados, a possibilidade de ingressar na nossa ação”, explica  Mariana Alves, advogada do Instituto de Defesa do Consumidor (Idec). A mesma orientação deverá ser seguida por outras associações de classe e órgãos de defesa do consumidor que entraram  com ações civis coletivas dentro do prazo de cinco anos.
A Federação Brasileira de Bancos (Febraban) estima que 840 mil ações individuais tramitam na Justiça atualmente. Em nota,  informou que os bancos avaliarão os efeitos da decisão e ressaltou que eles não tiveram ganhos com os planos, apenas cumpriram as leis.

Cronologia

Junho de 1987
Plano Bresser
Substituiu o índice usado na correção das cadernetas de poupança (IPC pelo LBC). Com isso, os bancos deixaram de contabilizar 8,04% aos poupadores. Têm direito a receber os donos de poupança com aniversário  na primeira quinzena de junho e de julho de 1987.
 
Janeiro de 1989
Plano Verão
O índice de correção da poupança foi alterado novamente. Substituiu-se o IPC pela LFTN. As cadernetas deixaram de ser reajustadas em 20,36%. Poupadores com data de aniversário entre os dias 1 e 15 de janeiro e fevereiro de 1989 têm direito a restituição.

Março de 1990
Plano Collor 1
O governo congelou a poupança e confiscou  os valores acima de 50 mil cruzados novos. Puderam recorrer os donos de poupanças com data do aniversário na primeira quinzena de março, abril e maio de 1990. O prazo para entrar com ação individual acabou em março deste ano.

Janeiro de 1991
Plano Collor 2
Somente ontem o Superior Tribunal de Justiça (STJ) definiu que o índice correto de atualização sobre as cadernetas de poupança durante os meses de janeiro a março do Plano Collor 2 era de 21,87%. O prazo para entrar com uma ação  na Justiça acaba em 2011.

2010
A decisão
A 2 Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) condenou os bancos a pagarem as diferenças de correção monetária por diferenças nos planos Bresser, Verão, Collor 1 e Collor 2. A decisão do STJ vale para todos  os processos que tramitam na casa. Porém, os ministros entenderam que o prazo para as ações civis públicas prescreverem era de  cinco  e não 20 anos.

FAÇA OS CÁLCULOS
 
Plano Bresser
Passo 1: Multiplicar o saldo do juros pelo percentual devido de 0,808 e descobrir a perda
Passo 2: Multiplicar a perda pelo índice acumulado de 0,4391 e descobrir o valor em Reais
 
Cálculo:
Saldo de junho para julho de 1987 (em Cr$) x 0,0808 (percentual devido) = saldo da perda x 0,4391 (índice acumulado) = valor em R$
Exemplo (Cr$ 5 mil):
5000 x 0,0808 = 404 x 0,4391 = R$ 177,39

Plano Verão
Passo 1: Identificar o saldo existente na carteira de poupança em janeiro de 1989, lembrando que neste plano, a moeda mudou de Cruzado para Cruzado Novo e perdeu três zeros,
Passo 2: O percentual não creditado pelos bancos (20,46%) deve ser aplicado sobre o saldo de janeiro de 1989, em Cruzados Novos.  Com isso, haverá o valor da moeda naquela época
Passo 3: A este valor em NCz$ deve ser aplicado o índice acumulado da poupança, desde fevereiro de 1989 até o mês atual. O resultado já apresenta um valor em Reais
Passo 4: Por fim, há os juros moratórios que também deve ser pagos pelos bancos
 
Cálculos:
 
Saldo da poupança (NCz$) x 0,2046 x 16,49545 (índice da poupança) = valor atualizado em R$
Valor atualizado + juros moratórios = valor devido pelo banco em R$
Exemplo (NCr$ 5 mil):
NCz$ 5 mil x 0,2046 x 16,49545 (índice da poupança) = R$ 16.874,85 *
 
Plano Collor I
Passo 1: Identificar o saldo existente na caderneta de poupança de março de 1990, por exemplo, após o bloqueio do valor excedente, limitado a NCz$ 50 mil
Passo 2: Aplicar sobre o saldo localizado o percentual do IPC de março de 1990 (84,32%) mais os juros remuneratórios de 0,5%, totalizando 85,24%. Basta fazer a multiplicação entre o saldo da poupança X 1,8524.
Passo 3: Identificar no extrato a remuneração ocorrida em abril de 1900 para o saldo de livre movimentação
Passo 4: Subtrair o resultado do passo três da remuneração identificada no passo quatro para ter o valor que não foi creditado pelo banco
Passo 5: Ao último valor, em Cr$, deve ser aplicado o índice acumulado da poupança desde abril de 1990 até o mês atual.  Por fim, é só fazer a multiplicação do valor devido na época por 0,20590
 
Cálculos:
 
Saldo “livre” da poupança x percentual do IPC do mês – (remuneração do saldo “livre” do mês) = diferença  em Cr$
Diferença devida em Cr$ x índice acumulado da poupança = valor  em R$
Valor atualizado + juros moratórios = valor devido pelo banco

Exemplo (NCz$ 15 mil):
NCz$ 15 mil x 1,8524 = Cr$ 27.786
Cr$ 27.786 x 0,21177 = R$ 1.935,77

*O cálculo com juros moratórios só pode ser realizado no dia  por conta da constante variação.

Ainda dá tempo de pedir revisão do Plano Collor 2
Quem tinha dinheiro guardado na caderneta de poupança em fevereiro de 1991 ainda pode pedir na Justiça a correção referente ao plano Collor 2.  Mas é preciso se apressar, já que o prazo de  20 anos vai até  fevereiro de 2011.
Para o advogado Alexandre Berthe, especialista em revisões de poupança, pessoas que tinham dinheiro na poupança entre janeiro e março de 1991 devem checar se têm direito a restituição do Plano Collor 2.
“A orientação que temos passado para quem  nos consulta é que elas procurem amanhã os seus bancos e solicitem os extratos dos períodos para saber o saldo na ocasião. Depois, os documentos devem ser enviados para um especialista em cálculos, que vai a analisá-los  e fazer a atualização dos valores”, explica Berthe.
Por decisão do  Superior Tribunal  de Justiça (STJ), as cadernetas  deveriam ter sido corrigidas em  21,87% na época. Qualquer percentual usado pelo banco que tenha sido diferente pode gerar uma ação na Justiça para que haja a reparação dos valores.
“As pessoas costumam pegar e acham que vão ficar milionárias. Não é bem assim. Vale lembrar que na época a moeda era outra e havia muito mais dígitos”, completa o advogado.
Os poupadores que tinham  dinheiro guardado em bancos privados ou no Banco do Brasil devem procurar a Justiça estadual. Ações contra a Caixa  Econômica Federal devem feitas  na Justiça federal.
Nas ações de até 20 salários mínimos é possível ingressar a causa no Juizado Especial Civil, sem a necessidade de se ter um advogado.
Porém, para processos com valores acima dessa quantia,   é  preciso ter um representante legal para entrar com ação.  “Nesses casos, os honorários  dos advogados são cobrados depois do recebimento do valor devido”, explica o advogado José Eduardo Tavolieri de Oliveira.

Maiores valores já discutidos na Justiça
A questão envolvendo os reajustes das cadernetas de poupança nos planos econômicos é a que envolve a maior soma de valores já discutido na Justiça brasileira. A estimativa feita pela Febraban, no pior dos cenários, chegou a ser de R$ 180 bilhões. Um valor que poderia comprometer todo o sistema bancário do país. Com a decisão de ontem, os valores deverão cair de forma considerável.

R$ 5 bi
é o valor estimado pelo Idec para os processos atuais

Quanto o poupador tem para receber?
O valor varia de caso a caso. Com a decisão do STJ, foram definidos os índices que deveriam ter sido usados pelos bancos: 26,06% para o Plano Bresser, 42,72% para o Verão, 44,8% para o Collor 1 e 21,87% para o Collor 2. Índices aplicados que foram diferentes destes terão que ser reajustados