Para a população brasileira, a violência e a corrupção estão diretamente relacionadas à baixa qualidade da educação no país. Além disso, a insatisfação do cidadão com a educação no Brasil cresceu nos últimos quatro anos, sendo maior com o ensino público do que com o ensino particular.
É o que indica a pesquisa Retratos da Sociedade Brasileira – Educação Básica, realizada em 2017 pela CNI (Confederação Nacional das Indústrias) em parceria com o movimento Todos Pela Educação. O levantamento foi divulgado na manhã desta terça-feira (3).
Os dados mostram que a maior parte da população (77%) concorda totalmente ou em parte com a afirmação de que o problema da violência no Brasil se relaciona de forma direta com a baixa qualidade da educação no país. Já seis em cada dez brasileiros, ou seja, 60%, dizem o mesmo com relação à corrupção
A pesquisa é divulgada justamente em um momento de escalada de violência no Rio de Janeiro, que se encontra sob intervenção federal na área da segurança há pouco mais de um mês, e de incertezas com relação a uma nova denúncia contra o presidente Michel Temer (MDB), investigado em um inquérito que apura supostas irregularidades na edição do decreto dos Portos.
Para Gabriel Corrêa, gerente de políticas educacionais do Todos Pela Educação, “é muito importante que a população perceba essas relações” entre qualidade da educação, corrupção e violência.
“Quanto mais a gente expõe os problemas do Brasil, mais a população começa a refletir quais são suas principais causas. E aí, é claro que aparece a baixa qualidade da educação como uma das principais causas para o que o Brasil vive hoje”, afirma.
Ele ainda defende: “já passou da hora de a educação ser considerada uma área estratégica para o Brasil”. “Uma melhoria na educação melhoraria as condições para o crescimento econômico, melhoraria os índices de violência, diminuiria a corrupção, como a população brasileira percebe. A educação, além de ser fundamental para o indivíduo, é fundamental para diversas áreas do país”, explica.
Falta de comprometimento de políticos
Os dados apontam ainda que quase 80% da população brasileira acredita que os governantes (prefeitos, governadores e presidentes) não estão comprometidos o suficiente com a qualidade do ensino no país –o que, na opinião de Corrêa, é ponto-chave para que se possa mudar efetivamente o quadro da educação no Brasil.
“Você tem, em um ano de eleição, uma pesquisa indicando que a população dá muita responsabilidade para os governantes, mas não vê o comprometimento necessário. Isso é fundamental para um ano eleitoral”, afirma.
A pesquisa ainda mostra que a percepção da relação entre baixa qualidade da educação e os níveis de violência cresce com o grau de escolaridade do entrevistado: 82% entre os que possuem ensino superior concordam com a ligação. Mesmo assim, 71% das pessoas que estudaram até a quarta série do ensino fundamental também consentem com a afirmação.
“Podemos afirmar que, no geral, a população brasileira, independentemente do grau de escolaridade, considera muito forte a relação entre educação e os níveis de violência no país”, diz Corrêa.
O levantamento foi realizado pelo Ibope Inteligência entre os dias 15 e 20 de setembro do ano passado em 126 municípios brasileiros. A margem de erro da pesquisa é de dois percentuais para cima ou para baixo.
Insatisfação com educação cresceu em 4 anos
A pesquisa aponta ainda que o percentual de brasileiros que avaliam a qualidade do ensino no país como ruim ou péssima cresceu nos últimos quatro anos.
Segundo o levantamento, a insatisfação é maior com a educação pública. A avaliação negativa (ruim ou péssima) do ensino fundamental da rede pública cresceu de 18%, em 2013, para 27% em 2017. O percentual de reprovação do ensino médio público também aumentou: foi de 15% para 26% no mesmo período.
Corrêa diz ver esses dados com otimismo, já que “historicamente, a percepção da população quanto à educação era consideravelmente boa, apesar de termos uma situação crítica”. Na avaliação dele, os dados mostram que o “descasamento” entre a percepção da população e a situação “grave” da população pode estar mudando.
O levantamento perguntou aos entrevistados qual classificação eles dariam para o ensino fundamental e médio, em escolas públicas e particulares, entre as opções “ótimo”, “bom”, “regular”, “ruim” e “péssimo”.
Em 2010, quando levantamento semelhante foi feito, 15% consideravam o fundamental público ruim ou péssimo, enquanto 13% afirmavam o mesmo sobre o ensino médio –números estatisticamente iguais aos de 2013, considerando a margem de erro da pesquisa. No entanto, para Corrêa, eles já indicavam “o sentido em que estava indo essa avaliação”.
Os números de 2017, por outro lado, são classificados por ele como um “salto”. Na avaliação dele, isso representa uma percepção da população de que, apesar de a educação brasileira ter melhorado em relação ao acesso –hoje, cerca de 95% das crianças e jovens em idade de matrícula obrigatória (de 4 a 17 anos) frequentam a escola–, o país ainda se encontra muito atrás quando o assunto é qualidade do ensino.
“Nossos alunos estão indo para as escolas, mas não estão aprendendo”, diz Corrêa.
Escolas particulares
A queda se repete no cenário das escolas particulares, mas em dimensão menor. Os entrevistados que consideravam essa etapa escolar como ótima ou boa também diminuiu: de 77% no ensino fundamental em 2013 para 65% em 2017. No ensino médio, caiu de 76% para 64%.
O percentual dos que consideram o ensino regular aumentou de 11% para 17% tanto na avaliação do ensino fundamental como do médio nas particulares.
“A população continua percebendo a educação particular como de melhor qualidade versus o serviço público, a educação que o Estado oferece”, afirma Corrêa.
“Vale notar que, mesmo quando a gente compara escolas particulares brasileiras com outras do mundo, a qualidade ainda é muito baixa. Não é só um problema da escola pública, apesar do problema da escola pública ser mais grave”, ressalta.