Período em que os dissídios coletivos tiveram aumentos reais (acima da inflação) mais robustos.
Para especialistas, este é um fator novo na atividade econômica do País. A análise foi lançada pelo ex-economista-chefe do Bradesco Octávio de Barros, que agora comanda o Instituto República. Em evento do Ibmec neste ano, ele avaliou que a queda dos preços no Brasil deve modificar a dinâmica das negociações salariais.
Ele comentou que, no terceiro trimestre de 2017, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) deve se encontrar abaixo do centro da meta de inflação, impactando as campanhas salariais que ocorrem no período. Sindicatos que representam os bancários e comerciários, por exemplo, têm a sua data-base em setembro e outubro.
No acumulado em 12 meses até abril, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC, que é a referência base para os dissídios) registra uma variação positiva de 3,99%. Já o IPCA está marcando alta de 4,08% no período e a expectativa do mercado é que o índice feche 2017 com alta de 4,01%. Para 2018, a projeção é elevação de 4,39% na inflação.
Para o técnico do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) Luis Ribeiro, a inflação menor “aumenta um pouco” as chances de correções salariais acima da inflação. Porém, ele vê com ressalvas este novo cenário.
“Olhando a taxa de inflação isoladamente, é possível concluir que as negociações salariais serão mais fáceis para os trabalhadores. Mas sabemos que isto não ocorre isoladamente. A atividade econômica recessiva e o alto nível de desemprego retiram o poder de barganha dos trabalhadores na mesa de negociação”, contrapõe Luis Ribeiro, do Dieese.
“Em 2016, por exemplo, a inflação já estava em processo de declínio, mas isso não se refletiu em um crescimento no número de negociações que tiveram aumento real. Para muitas categorias foi possível repor, no mínimo, a inflação, algo que nem havia ocorrido com tanta força em 2015. Já foi uma melhora diante da conjuntura ruim. Para este ano, o cenário tende a ser semelhante ou um pouco melhor”, acrescenta ele.
Já a pesquisadora do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) Maria Andréia Parente avalia que a combinação de inflação baixa com alta taxa de desemprego deve produzir reajustes nominais menores do que em anos anteriores. “Reajuste nominal é o quanto de fato o seu salário está aumentando. Se você tem um aumento de 6%, mas nos últimos 12 meses, a inflação foi de 4%, você teve um aumento real de 2%, mas o nominal é de 6%”, ilustra Maria Andréia.
“Durante os anos 2000 e até 2012, 2013, os trabalhadores conseguiram reajustes nominais bem maiores. Pois, com o mercado de trabalho aquecido, eles tinham maior poder de barganha para, além de repor a inflação passada, conquistar um aumento adicional em seus salários”, diz ela. “Os trabalhadores ganham força quando há poucas pessoas disponíveis para trabalhar, o que faz as empresas aceitarem correções salariais maiores”, complementa a pesquisadora.
Mudança de patamar
No entanto, o cenário para este ano e para 2018 é outro. Com a perspectiva de inflação mais baixa e menor poder de negociação dos sindicatos, os reajustes nominais serão menores do que no passado. O lado positivo disso, pontua Maria Andréia, será a folga no orçamento das pessoas que não foram desempregadas pela crise.
“O ambiente de inflação baixa é muito menos hostil para o trabalhador que conseguiu se manter empregado. Essa inflação dá uma folga no orçamento familiar”, destaca ela.
“Os alimentos foram o principal grupo que puxou para baixo os índices de preços. Eles [os alimentos] compõem uma boa parte do orçamento familiar, o que significa que, quando os seus preços caem, o trabalhador vai poder utilizar a sua renda para consumir outros bens e serviços”, diz.
Para a pesquisadora do Ipea, outro impacto positivo da inflação mais controlada é o efeito sobre a taxa básica de juros (Selic). “A inflação baixa possibilita ao Banco Central ter uma política de corte de juros mais rápida e intensa. Isso reduz o custo do crédito, incentivando as empresas a tomarem empréstimos para investir, movimento que, por sua vez, gera emprego e renda. A inflação baixa gera um círculo virtuoso”, conclui Maria Andréia.
Dissídios anteriores
No ano passado, apenas 19% das negociações salariais resultaram em aumentos acima do INPC. Em 2015, este percentual chegou a 51%. Ainda no ano de 2016, cerca de 44% dos reajustes tiveram valor igual à variação do índice de inflação e os demais 37% ficaram abaixo. Entre 2005 e 2014, o percentual de negociações com aumento real nunca foi inferior a 70%; e, se excetuados os anos de 2005, 2008 e 2009, nunca inferior a 86%.
Em 2016, também houve intensificação no crescimento dos reajustes salariais parcelados, o que já havia sido observado em 2015. Entre 2008 e 2013, os reajustes salariais aplicados em mais de uma parcela oscilavam em uma proporção que variava entre cerca de 4% e 5%.
A combinação de preços em queda com a alta taxa de desemprego fará com que os rendimentos trabalhadores tenham correções mais baixas do que em anos anteriores, afirmam especialistas.