Com a estratégia de preços mais baratos, a importação voltou a tirar espaço da produção doméstica. A produção industrial do país decepcionou as expectativas e encolheu 0,5% no primeiro trimestre, diante do mesmo período de 2012, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Na mesma comparação, o volume importado no primeiro trimestre avançou 8,1%.
Essa relação entre produção em queda ou fraca e importação forte foi disseminada na indústria na comparação entre o começo deste ano e início de 2012. Segundo dados da Fundação Centro de Estudos do Comércio Exterior (Funcex), a quantidade importada de bens não duráveis subiu 10,8% no primeiro trimestre, enquanto a produção de bens semi e não duráveis recuou 3,9%. Nos intermediários, a importação subiu 5,1%, enquanto a produção caiu 0,8%. Bens de capital foram exceção, pois a importação subiu 7,1%, abaixo da produção, que ficou 9,8% maior, puxada por caminhões.
José Ricardo Roriz Coelho, diretor de competitividade da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), diz que a demanda interna não está crescendo muito, mas os importados chegam mais competitivos, com preço menor. “Isso acontece mais em segmentos de mão de obra intensiva, já que a pressão dos salários se mantém, e também na indústria de bens finais, porque os custos de produção internos se acumulam ao longo da cadeia.”
Dados da Funcex mostram que os preços médios do total importado no primeiro trimestre caíram 1,5% em relação ao mesmo período de 2012. Com exceção de bens de capital, houve redução de preço em todas as categorias de produtos importados. Os não duráveis tiveram a maior queda, de 5%, enquanto os preços médios de duráveis recuaram 0,5%, e o dos intermediários, 1,4%.
O cruzamento de dados de produção com os de importação mostra que alguns segmentos sentiram mais a concorrência externa. No setor têxtil, a produção física caiu 7% no primeiro trimestre e houve alta de 10,7% no volume importado. O preço médio da mercadoria desembarcada caiu 4,8%. Vestuário teve queda de 7,1% de produção física, enquanto o volume importado cresceu 9,3% e o preço médio da mercadoria que veio de fora recuou 4,6%. A indústria farmacêutica produziu 9% menos, enquanto o volume de compras de fora teve elevação de 13,1%. Os preços médios de importação do segmento caíram 5,8%.
Em alguns dos setores em que o preço importado caiu, os preços domésticos subiram. O Índice de Preços ao Produtor (IPP), do IBGE, considerado um indicador que revela o preço pelo qual um produto sai da fábrica, mostra que os preços do itens têxteis estavam 4,1% mais caros em março passado em relação a março de 2012, enquanto no vestuário a alta foi de 4,9 % e nos farmacêuticos, de 2%.
“Com os estoques das indústrias mais equilibrados neste começo de ano, a única explicação que resta para haver setores com a produção caindo, mesmo com o consumo em alta, é a importação”, afirma Rodrigo Nishida, analista da LCA Consultores. Na prática, isso significa que, depois de passar 2012 com estoques acumulados que inibiram a produção – no ano passado a produção industrial caiu 2,6% -, agora os estoques já foram desovados e a fabricação local já poderia ser retomada. Mas essa retomada está bem menos vigorosa do que se esperava.
“O produto nacional tem sido substituído pelo produto externo em um processo iniciado desde pelo menos 2009”, diz o economista do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), Rogério César de Souza. “Há a tese econômica de que as importações complementam a produção de um país quando ele está crescendo, mas o que justifica o “pibinho” do ano passado com importações que continuaram fortes? Elas vieram para substituir o bem local”, diz.
Luis Otávio Leal, economista-chefe do Banco ABC, diz que o consumo pega agora uma indústria desprevenida, que, com o mau ano em 2012, ficou sem investir – a formação bruta de capital fixo, que mede o investimento, teve uma queda de 4% no PIB do ano passado. “Como as empresas não estavam investindo em seu parque industrial, a oferta fica estável e, com isso, alguns setores acabam importando quando o consumo aumenta. A indústria não tem o produto e exige-se um tempo para que se faça essa transição para o aumento de produção”, diz. O aumento simultâneo da produção e da importação de bens de capital pode ser um sinal de que a indústria, agora, voltou a investir.
Leal aponta ainda a estabilização do dólar na faixa de R$ 1,95 a R$ 2, ante perspectivas, em 2012, de até R$ 2,40. Isso emperrou o processo que começou a se esboçar de substituição das importações pela produção nacional, seja de bens finais, seja de insumos. “A queda do dólar torna as importações mais baratas e a questão não é nem o patamar em que está o câmbio, mas a perspectiva de que ele não vai mais subir”, avalia.
“Está claro que no ano passado a política cambial tinha o viés de estimular a exportação e neste ano há uma preocupação maior com a inflação”, diz Rodrigo Branco, economista da Funcex. Ao mesmo tempo, com a superoferta internacional e a falta de demanda doméstica, vários países adotaram políticas de estímulo à exportação, dando às indústrias de seus países condições de produtividade que permitem a redução de preços.
Dados mais recentes da balança comercial também mostram que as importações não devem ter freio rapidamente. Em abril, o total do valor importado pelo Brasil subiu 5,2%, considerando a média diária ante igual mês de 2012. O valor importado de intermediários subiu 7,2%, e o de bens de capital, 3,2%. Os bens de consumo duráveis tiveram queda leve, de 0,8% na média diária, mas os não duráveis tiveram elevação de 22,8%.
No mesmo critério, dentro dos não duráveis, se destacaram produtos alimentícios, com alta de 20,5%, além de farmacêuticos e vestuário, com elevações de 23,9% e 35,1%, respectivamente. Para José Augusto de Castro, presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), o desempenho dos não duráveis mostra consumo interno forte. Não o bastante para elevar a importação de duráveis, diz ele, mas suficiente para aumentar o desembarque de bens de menor valor agregado.
Além de contribuir para a elevação de importados, a desaceleração do mercado internacional, diz Souza, do Iedi, também atrapalha as exportações, o que contribui para o desempenho da produção abaixo do esperado. “As exportações da indústria tiveram queda de 5% no primeiro trimestre, e isso acaba dando respaldo para entender o que acontece na produção.”