Pernambuco foi o estado com maior perda real, de acordo com dados do Caged, do Ministério do Trabalho
O aumento da procura por vagas já faz empresas contratarem trabalhadores por salários menores. De acordo com dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), do Ministério do Trabalho, os salários iniciais registrados no três primeiros meses do ano estão 1,26% menores do que há um ano, retirados os efeitos da inflação. O salário de admissão caiu em todas as regiões do país.
Pernambuco foi o estado com maior perda real: quem entrou em uma nova empresa este ano está ganhando 8,94% menos do que aqueles que conseguiram sua vaga nos três primeiros meses do ano passado. O valor médio de contratação entre janeiro e março deste ano foi de R$ 1.080,65, contra R$ 1.186,76 pagos em igual período de 2014. No Rio, a queda foi de 3,87%. Por regiões, a maior perda de renda foi registrada no Nordeste, -3,48%, e a menor, no Centro-Oeste, – 0,15%. No Sudeste, o recuo foi de 1%.
Foi a primeira queda nos salários iniciais num primeiro trimestre do ano desde 2003. Mesmo em anos de desaceleração como 2009, quando a economia sentiu os efeitos da crise global, o salário de admissão havia crescido. Agora, porém, economistas veem uma tendência de redução salarial nos próximos meses em consequência do aumento do desemprego.
— Enquanto a economia não começar a crescer, a situação não deve mudar — afirmou o economista Raone Costa, da Fipe.
Ele explica que, ao contrário de 2009, quando houve um período mais curto de baixo crescimento, mas onde as empresas retiveram mão de obra, o cenário atual é consequência de um longo período de economia em ritmo fraco.
TROCA DE SÊNIOR POR JÚNIOR
Ao considerar apenas os dados de março, o setor que registrou a maior queda no salário inicial na comparação com o ano passado foi o de construção civil, com recuo de 2,43%, de acordo com levantamento feito pela Catho/Fipe, com base nos dados do Caged. Costa pondera que apesar de os dados mensais serem mais voláteis, o setor tem puxado a desaceleração no mercado de trabalho em 2015.
— A construção civil tende a ir muito bem quando a economia está bem, e a ir muito mal quando a economia está mal. Ele é justamente o setor da inovação, que é aquecido quando você precisa criar novas fábricas, novas plantas. Vale lembrar que a construção civil foi um dos setores que mais cresceram de 2008 para cá, então, é natural que seja o que mais sofra — afirma Costa.
Para o economista do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) de Pernambuco Jairo Santiago, a forte queda salarial no estado tem influência do fraco desempenho da construção civil. No Nordeste, o salário médio da construção é R$ 1.173,41.
— Muitos trabalhadores foram demitidos em 2014, e esse processo continuou em 2015. Como a metade é formada por pedreiros e ajudantes de pedreiros, esse pessoal continua desempregado ou se mantém ocupado, mas precariza seu trabalho — destaca Santiago. — Em Pernambuco, o apogeu aconteceu entre 2010 e 2012. Vínhamos num ritmo de frevo de rua, e agora estamos com ritmo de frevo cantado, mais lento, para falar ‘pernambuquês’.
No Rio, o vendedor Fernando Garcia, está desde fevereiro procurando uma nova oportunidade de se reinserir no mercado, mas sem sucesso. Com experiência de dez anos no setor de venda de automóveis, esta é a segunda vez que Garcia foi dispensado desde 2008. No seu último emprego, ele recebia um salário de cerca de R$ 3.500. Hoje, diz estar disposto a aceitar R$ 2.500.
— Estou mandando currículos para vendas em geral, fiz entrevistas e, como sou otimista e tenho experiência, espero ser chamado logo. Por enquanto, tenho me sustentado com as economias que fiz enquanto trabalhava, mas elas não vão durar mais do que um mês — afirma Garcia.
Outro indicador observado por especialistas para medir o mercado de trabalho é a pressão salarial, relação entre os salários de admissão e de desligamento, que vem caindo desde 2012. Com a economia aquecida, essa proporção fica mais próxima de 1, indicando que os salários de contratados e demitidos estão mais parecidos. Em março, o indicador ficou em 0,9, abaixo da média de 2006 a 2015, que foi de 0,916. Significa que as empresas estão pagando salários 10% menores aos novos funcionários, na comparação com o que pagavam aos antigos.
— Quando as empresas estão em um momento de dificuldade, normalmente o que se faz é jogar para baixo o padrão de funcionários. Demite-se uma pessoa cara e contratam duas pessoas mais baratas. Esse indicador resume esse tipo de estratégia. A troca do sênior pelo júnior — afirma Costa, da Fipe.
EFEITO DA CRISE DFA PETROBRAS
Segundo o economista da Pontifícia Universidade Católica (PUC-Rio) e da Opus Gestão de Recursos, José Marcio Camargo, a relação entre os salários de admissão e de demissão é um bom indicador prévio do comportamento da taxa de desemprego. Quanto menor a relação entre o salário de quem começa a trabalhar e aquele que está sendo desligado, maior a perspectiva de elevação da taxa de desemprego.
— A aceleração inflacionária derruba o salário dos trabalhadores. Não chega a surpreender o salário cair 3% no Rio, mas em Pernambuco, sim, foi bem forte. É possível que tenha havido um efeito da crise do setor do petróleo, mas não é só isso, porque o Rio de Janeiro tem mais petróleo que Pernambuco e teve uma queda menor — afirma Camargo.
Segundo o consultor trabalhista do site Trabalho Hoje e ex-diretor do departamento de Emprego e Salário do Ministério do Trabalho, Rodolfo Torelly, a maior quantidade de pessoas à procura de emprego explica a queda no salário de admissão , e a tendência vai continuar nos próximos meses. Ele lembra que nos últimos 12 meses, os dados do emprego formal do Caged apontam um saldo líquido (diferença entre contratações e demissões) negativo em 50 mil vagas, o pior resultado para 12 meses desde janeiro de 2000, quando houve uma perda de 123,6 mil empregos.
— Enquanto o mercado estiver demitindo mais que contratando, a tendência é o salário continuar a cair — afirma Torelly — É um momento horrível para se mudar as regras trabalhistas, porque significa pessoas sem emprego e sem nenhuma renda para se segurar.