A médica aposentada da rede estadual de saúde do Rio de Janeiro Eloisa Fenton Garcia, 67 anos, faz sessões de hidroterapia semanalmente e toma nove medicamentos por dia. As sequelas de um Acidente Vascular Cerebral (AVC), em 2001, fizeram com que ela ficasse com dificuldades para caminhar. A aposentadoria de R$ 2.100 que recebe do Estado mais um benefício do INSS são quase integralmente consumidos com o seu tratamento. A situação financeira complicada da família ficou ainda pior na semana passada, quando o Estado anunciou que pagaria os benefícios de março dos aposentados e pensionistas que ganham acima de R$ 2 mil líquidos até 12 de maio.
A servidora entrou na faixa de corte por pouco mais de R$ 100. “Estou com a conta de luz atrasada e não tenho como pagar. Meus filhos estão desempregados, contamos com esse dinheiro, não dá para esperar tanto para receber.” Eloisa sustenta dois dos três filhos que moram com ela, sendo que um deles faz bicos na área de computação, mas só ajuda com gastos básicos.
A aposentada é mais um exemplo do drama dos servidores do Estado do Rio. Os diversos casos de dificuldade levaram a categoria a mobilização. No dia seguinte ao anúncio do adiamento, os trabalhadores se reuniram na frente da Assembleia Legislativa do Rio (Alerj), no centro, e caminharam até a Secretaria Estadual de Fazenda.
O nível de tensão foi elevado quando funcionários públicos invadiram o prédio da secretaria depois de passarem pela segurança e quebrarem uma porta de vidro. Na sexta-feira, policiais militares expulsaram cerca de 50 servidores que estavam no prédio. O grupo, composto por servidores ativos e inativos, a maioria professores, foi retirado sem confronto.
Os manifestantes queriam ser recebidos pelo secretário da pasta, Julio Bueno. Na sexta-feira, em meio à crise, Bueno, que é hipertenso, tirou quatro dias de folga por recomendação médica. O afastamento foi por causa de estafa e insônia. O médico aconselhou que Bueno deixasse o cargo, ele descartou.
Liminar
O adiamento no pagamento também teve reação na Justiça. O Sindicato dos Médicos do Rio de Janeiro (SinMedRJ) entrou com uma liminar contra a decisão do governo do Estado de pagar até 12 de maio parte dos servidores. A liminar tem entre as argumentações a violação ao artigo sétimo da Constituição Federal, que garante o pagamento de salários a trabalhadores.
“É um escândalo. (O governador em exercício, Francisco) Dornelles (PP) pratica tratamento discriminatório. São pessoas que dependem desse pagamento, resultado de contribuições feitas por décadas”, afirmou o presidente do sindicato, Jorge Darze.
O adiamento afeta 137 mil inativos e pensionistas. Outros 216.990 funcionários públicos ativos do Poder Executivo e 111.212 servidores inativos e pensionistas receberam na quinta-feira, décimo dia útil do mês. Até novembro do ano passado, os salários eram pagos no último dia do mês trabalhado ou no primeiro dia do subsequente.
Além dos aposentados, servidores da ativa também passam por dificuldades com os atrasos. No início da semana, antes do pagamento, a técnica de laboratório Sueli de Oliveira, 58 anos, estava sem dinheiro para pegar condução na volta do plantão. “Juntei as moedas que ainda tinha para ir, não queria faltar, mas o dinheiro para voltar faltou.” A servidora, que recebe cerca de R$ 1 mil, tem quase metade do salário comprometido com crédito consignado.