Em meio às dificuldades do governo de realizar o ajuste fiscal, artigo assinado pelo ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, propõe que a política de aumento do salário mínimo seja mais moderada – com a adoção de outros critérios de reajuste – e que seu impacto sobre as contas públicas seja reduzido por meio de reformas que limitem gastos com programas sociais e a Previdência. O texto faz parte do livro “Política de Salário Mínimo para 2015 – 2018: Avaliações de Impacto Econômico Social”, que será lançado hoje no Rio, pelo Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) e pela Escola de Economia de São Paulo (EESP), ambos da Fundação Getulio Vargas (FGV).
No livro que debate o futuro do salário mínimo, o capítulo de Barbosa não diverge substancialmente do que defendem economistas de tendência concorrente à sua, mais liberais. “Todos os autores, ortodoxos ou heterodoxos, são unânimes. Se não houver mudança na regra do salário mínimo, os gastos públicos vão continuar aumentando como proporção do PIB”, diz o pesquisador Rodrigo Leandro de Moura, um dos três organizadores do volume, ao lado de Samuel Pessôa, também do Ibre, e de Barbosa.
O livro é baseado em apresentações de seminário organizado em maio do ano passado – quando Barbosa ainda não era ministro, mas já defendia um freio de arrumação na política de reajuste do salário mínimo, que deveria estar alinhada ao “aumento de produtividade do trabalho”, conforme declarou ao Valor à época. No capítulo, o ministro explicita a proposta.
“A adoção de uma regra de reajuste real do salário mínimo pelo PIB per capita, ou por um percentual fixo por ano, pode, em conjunto com a extinção gradual do abono salarial, estabilizar o gasto federal com transferências de renda, em porcentagem do PIB, até 2019”, escreve Barbosa, no capítulo em coautoria com Manoel Pires, técnico de pesquisa do Ipea e diretor de programa na Secretaria Executiva do Ministério da Fazenda.
Atualmente, o mínimo é reajustado pela inflação do ano anterior, medida pelo IPCA, mais a variação do PIB de dois anos antes. O critério reforça a política de valorização, com ganhos reais, que vem desde o governo de Luiz Inácio Lula da Silva, mas começa a encontrar oponentes, até por formuladores da administração petista. O cálculo pelo PIB per capita reduz o valor dos reajustes quando o crescimento econômico é menor do que o populacional e visa atrelar o aumento do piso salarial à produtividade média do brasileiro.
Barbosa não chega a propor – como outros economistas mais liberais – a desvinculação da política do mínimo em relação aos benefícios assistenciais e previdenciários, como é o caso do pesquisador Marcelo Abi-Ramia Caetano, do Ipea, autor de um dos capítulos. Mas sugere regras mais brandas de reajuste – como o PIB per capita – e, principalmente, formas de diminuir o volume de gastos assistenciais e previdenciários, pelo controle ao acesso de beneficiários.
O abono salarial é o “primeiro e principal candidato à reforma”, afirma Barbosa, que tem defendido a extinção dessa espécie de 14º salário para os trabalhadores de baixa renda. “Não é tão essencial como foi no final dos anos 80”, escreve. Barbosa faz várias simulações e chega à conclusão de que “a extinção gradual do abono salarial faz com que as transferências federais de renda fiquem relativamente estáveis, subindo em apenas 0,1% do PIB até 2019”.
Além do abono, os outros candidatos a reforma são os programas sociais e a Previdência. “Também seria ideal realizar ajustes na Previdência, de modo a reduzir o ritmo de crescimento do número de benefícios previdenciários e assistenciais”. Barbosa enfatiza: “O desafio da Previdência está muito mais no ritmo de crescimento da quantidade de benefícios do que no ritmo de crescimento do salário mínimo”. Isso o leva a defender uma “reavaliação das atuais regras de concessão de benefícios de risco (as “pensões por morte”) – conforme proposto pelo governo no pacote de ajuste – e a instituição de idade mínima para aposentadoria.
A precaução de Barbosa em preservar ganhos reais ao salário mínimo encontra respaldo em outro capítulo, de Clemente Ganz, do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese). No estudo, o pesquisador aponta que o salário mínimo necessário – que leva em consideração os custos com cesta básica e os direitos estabelecidos pela Constituição – é quatro vezes maior que o mínimo oficial. Essa razão era de 11 vezes, em 1994.
Por outro lado, os fortes ganhos reais dos últimos anos já puseram o piso do Brasil em patamar semelhante à média internacional, conforme destaca o capítulo de Marcelo Caetano. Entre os demais autores, estão Fernando de Holanda Barbosa Filho (Ibre), João Saboia (UFRJ), Naercio Menezes (Insper), Marcio Pochmann (Unicamp) e Fabio Giambiagi (BNDES).