Por Carlos Ortiz
Passadas as eleições, agora o governo se arma para enviar as propostas da Reforma da Previdência. Um dos temas que a equipe de Temer tentará aprovar é a implantação da idade mínima de 65 anos para homens e mulheres se aposentarem.
O principal argumento governamental se alicerça sobre o aumento da expectativa de vida em relação à taxa de fecundidade. As pessoas estão vivendo mais, enquanto as famílias ficam cada vez menores. Assim, em tese, nas próximas décadas, muitos cidadãos estarão recebendo da Previdência e poucas estarão contribuindo.
A equação até parece simples em relação a assegurar a sustentabilidade do sistema previdenciário. No entanto, existem situações que precisam ser contextualizadas.
Em um país imerso em profunda crise, com 12 milhões de desempregados, haverá oportunidade de trabalho para os cidadãos com mais de 50 anos, sendo que não há nem para os mais jovens? Como chegar aos 65 anos trabalhando?
Outro ponto que a idade mínima coloca interrogações nos pensamentos é a capacidade laboral dos cidadãos da terceira idade em determinados setores. Com 60 anos ou mais o trabalhadores conseguiria suportar as jornadas de trabalho de setores como a construção civil ou em linhas de produção? Nesses setores que exigem esforço físico, tudo é cronometrado, cobrando dos serem humanos comportamento robóticos.
Questões como estas não estão sendo consideradas no texto da Reforma.
Evidente que é necessário encontrar mecanismos para manter a sustentabilidade do sistema previdenciário, que atualmente não é deficitário, porém, a implantação da idade mínima, desconsiderando o contexto e a realidade brasileira, generalizando as atividades, é uma decisão simplista, que relegará milhões de pessoas à margem do sistema.
Caso passe no Congresso, a reforma da Previdência praticamente não seria sentida neste momento, mas atingirá em cheio a possibilidade dos jovens se aposentarem no futuro.
Mais obstáculos poderão surgir para que o trabalhador atinja sua aposentadoria. De forma indireta, a proposta do governo Temer pela reforma trabalhista, em que o acordado valerá sobre o legislado, “obrigará” outros milhões a trabalharem sem registro em Carteira, o que terá um impacto muito grandes daqui a décadas, no momento em que o cidadão for realizar sua contagem de tempo para conquistar a aposentadoria.
Fato é que ainda não se realizou um estudo para projetar os impactos da reforma da Previdência com a Trabalhista, que estão intrinsicamente ligadas.
Como não bastasse a idade mínima, ventila-se a possibilidade de incluir no projeto um “gatilho”, que poderá ampliar a idade mínima para 70 anos. O argumento governamental é de que em muitos países já existe idade mínima, próxima dos 70 e que o Brasil precisa se ajustar à realidade.
E é justamente no argumento da “realidade” que está um dos absurdos desta medida. Não dá para comparar a vida dos europeus com a vida dos brasileiros. O cidadão europeu ou de outros países desenvolvidos dispõem, ao longo de sua vida, de serviços de excelência em moradia, saúde, segurança, direitos, renda, entre outros, que constituem o que denominamos qualidade de vida.
Ainda há muitos pontos a serem discutidos sobre a Reforma da Previdência. Não se pode governar por decreto. É preciso estabelecer diálogo amplo e irrestrito com os setores sociais e o movimento sindical para que não se baixe uma norma em que representará um retrocesso de quase um século quanto aos direitos.
Carlos Ortiz é presidente do Sindicato Nacional dos Aposentados, Pensionistas e Idosos da Força Sindical e ex-Secretário de Trabalho e Renda do Governo do Estado de São Paulo.