Em debate promovido por comissão mista, relator da MP 665/14 diz ser favorável a ajuste fiscal, desde que não prejudique conquistas recentes dos trabalhadores.
Especialistas que participaram na quarta-feira (8) de audiência pública da comissão mista da Medida Provisória (MP) 665/14, que dificulta o acesso ao seguro-desemprego, criticaram a falta de diálogo do governo e afirmaram que as mudanças no benefício vão atingir os mais frágeis.
Antes, o trabalhador recebia o seguro comprovando apenas seis meses de trabalho com carteira assinada. Desde março, com a MP, são necessários 18 meses apurados nos últimos 24 meses. Na segunda solicitação do benefício, a carência passou a ser de 12 meses e somente a partir do terceiro pedido é que a carência volta para seis meses.
Segundo o diretor-técnico do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), Clemente Ganz Lúcio, cerca de dois milhões de trabalhadores serão impactados diretamente pela mudança.
Na avalição dele, a MP entrou em vigor logo em um período de aumento do desemprego e, consequentemente, vai prejudicar os mais necessitados. “O governo quer diminuir os gastos com seguro-desemprego, mas pode haver o efeito inverso e as pessoas buscarem ainda mais o benefício. Ninguém sabe quando se sai de uma recessão econômica”, alertou.
Proteção
Professor da Universidade de São Paulo (USP), Hélio Zylberstajn concordou que a MP foi editada em momento inoportuno. “Enquanto vários países usam o seguro-desemprego para evitar que a situação econômica piore, o Brasil faz o contrário”, criticou. Ele ressaltou que o benefício é essencial para proteger o trabalhador e manter sua renda.
O docente sustentou que o crescimento do gasto com o seguro-desemprego se deu com o aumento do mercado formal e do salário mínimo e não devido à rotatividade ou a fraudes, como alega o governo.
Zylberstajn sugeriu novas formas de utilização do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) para evitar prejuízos aos trabalhadores. Ele também propôs vincular a conta do seguro-desemprego à do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), em um único fundo. “Isso corrigiria as distorções. Se estou desempregado e sacando o dinheiro desse fundo, mas rápido vou buscar novo emprego”, sustentou.
“Traição”
Por sua vez, Marcos da Silva Pinto, do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), declarou que a MP retirou direitos dos trabalhadores e que a base social que apoia a presidente Dilma Rousseff entendeu a medida como um estelionato eleitoral. “Faltou diálogo, as pessoas que apoiaram o governo se sentem traídas”, disse.
Segundo ele, houve um erro no método, porque o Planalto não dialogou com os movimentos sindicais, e também um equívoco na forma, pela edição de uma MP, que tem força de lei imediata. “Era possível ter mandado essa matéria por projeto de lei para que o Congresso pudesse ter mais tempo de debate”, afirmou. Ele lembrou a devolução pelo Congresso Nacional da MP sobre desonerações tributárias. “Os empresários ganharam três, quatro meses a mais. Em relação aos trabalhadores, vemos que há dois pesos e duas medidas”, argumentou.
Relator
O relator da comissão mista, senador Paulo Rocha (PT-PA), concordou com as críticas de que o governo errou ao não dialogar. “Somos favoráveis ao ajuste fiscal, desde que não atinja as conquistas dos trabalhadores dos últimos anos”, apontou.
O presidente do colegiado, deputado Zé Geraldo (PT-PA), afirmou que as medidas do ajuste serão aprovadas no Congresso, mas com “modificações profundas”. De acordo com ele, trabalhadores rurais e pescadores também estão sendo prejudicados pelas propostas do Executivo.
Reportagem – Luiz Gustavo Xavier
Edição – Marcelo Oliveira