Noora Ahlamed e Salma Alkameeri, ambas de 19 anos, vieram de Abu Dhabi para viver dias de dedicação e disciplina olímpicas no Brasil. Únicas meninas entre as várias duplas de competidores masculinos em mecatrônica no sambódromo do Anhembi, em São Paulo, elas são as primeiras mulheres a representar os Emirados Árabes na história da WorldSkills Competition, que está na 43ª edição e é o maior torneio de educação profissional do mundo.
Há somente 216 mulheres entre os 1.200 participantes de mais de 60 países presentes na competição, considerada a “olimpíada” da educação profissional. “Estou muito orgulhosa de estar aqui representando os Emirados como mulher”, diz Noora, que começou um curso técnico de dois anos em mecatrônica quando tinha 17 anos, ainda no ensino médio. Hoje, ela estuda mecatrônica na universidade, enquanto Salma cursa engenharia aeroespacial.
Na WorldSkills, o desafio do dia era montar e fazer funcionar uma máquina nos moldes das transportadoras de garrafas usadas em linhas de produção de bebidas. A tarefa precisava ser concluída em menos de seis horas.
As duas se destacam entre o grupo também pelos véus que cobrem as cabeças, e que elas usam sempre que estão fora de casa. “Muitas pessoas acham que mulheres não servem para mexer com chaves de fenda e arruelas. Elas precisam mudar essa ideia”, diz Noora, que decidiu competir quando viu que se saía muito bem nas provas.
“Participamos de uma competição local e ficamos em primeiro. Jamais esperava ganhar”, afirma Salma. Segundo ela, a visibilidade do torneio estimula a presença feminina nas profissões técnicas. “Todos passaram a nos encorajar para vencermos a competição.
As duas são assistidas durante a prova por Mashaal Almarzooqi, um profissional experiente e que funciona como “coach” para Salma e Noora. Ele próprio já competiu em várias edições da WorldSkills, que acontece a cada dois anos e nunca havia sido sediada na América Latina. Segundo ele, a inédita presença de mulheres na equipe reflete uma tendência que já aparece no mercado dos Emirados.
“Estamos recebendo muitas fábricas em Abu Dhabi. Nossa força de trabalho é pequena e isso dá muitas oportunidades para as mulheres”, diz Almarzooqi. Em algumas áreas específicas, como na construção de peças para aviões da Airbus, as mulheres já são grande parte dos funcionários, afirma.
“Elas querem estar nesses campos e serem melhores que os homens”, diz Almarzooqi, que explica que em Abu Dhabi é comum que o jovem faça um curso técnico de três anos antes de ingressar em um bacharelado. Questionado sobre as equipes mais fortes na prova de mecatrônica, afirma que a equipe brasileira impõe respeito. “O Brasil é um dos competidores mais fortes. ”
Na prova de construção de estruturas para concreto, Vanessa Lourdes da Silva também é a única mulher. Junto de seu companheiro de prova, o desafio era construir e montar as peças em menos de quatro horas. Cada segundo foi acompanhado de perto pela mãe de Vanessa, que diz que, mais que uma incentivadora do sonho da filha, nutre afinidade genuína pelo trabalho em construção civil.
“Meu sonho era ser mestre de obras”, diz a agente de vendas Marlene Maria de Lourdes, que diz agora se realizar pela trajetória bem-sucedida da filha. “Fiquei muito feliz que ela escolheu essa profissão”, afirma a mãe.
Vanessa diz que está acostumada ao estranhamento das pessoas ao descobrirem que ela é uma operária da construção. O curso técnico em edificações, que completou no Senai de Cuiabá, foi importante, segundo ela, para que decidisse cursar engenharia na faculdade. “Foi melhor para saber realmente o que eu queria”. Ela diz que, embora tenha que carregar estruturas pesadas durante as competições da WorldSkills, o dia a dia da profissão é bem mais leve e requer mais tecnologia do que força. “Na obra a gente só monta, é a grua que levanta as formas”, diz.