“Esta diferença se deu unicamente por causa da reforma”, avalia Antonio Carlos Aguiar, advogado e professor de Direito do Trabalho da Fundação Santo André. “Porém, não é porque a lei mudou que as pessoas deixaram de ingressar com ações. O que aconteceu foi que os advogados adiantaram a entrada delas, dado que as alterações na legislação trabalhista deixaram muitas dúvidas.”
De acordo com o juiz da 2ª Vara do Trabalho de Diadema, Wilson Pirotta, a queda no número de processos faz parte da readequação dos escritórios de advocacia, dos próprios trabalhadores e também dos juízes, que divergem muito.
As dúvidas se devem ao fato de as mudanças serem muito recentes e em muitos pontos, ainda há dúvidas na interpretação delas. “Como mais de 100 dispositivos da CLT foram alterados, vai demorar um tempo para todos conhecerem o que de fato mudou e o que não mudou com o novo texto”, assinala Pirotta.
O juiz destaca que é importante dividir as ações em dois termos: relações materiais e processuais. As primeiras dizem respeito ao pleito do trabalhador quanto ao desrespeito de algum ponto da CLT. Assim sendo, a situação será julgada baseada na lei em vigor no período do descumprimento, uma vez que se trata de um direito adquirido pelo profissional.
Para se ter ideia, na lei anterior, quem trabalhava em lugares remotos tinha direito a considerar o tempo do deslocamento como parte da carga horária. “Se a pessoa morava muito longe da empresa, mas seu tempo para chegar não era considerado parte da jornada, e ela decidir entrar com ação cobrando por horas extras, vale o direito adquirido se a ação tiver sido ingressada até o dia 10 de novembro. Desde o dia 11 (quando a reforma entrou em vigor), porém, ela não pode mais cobrar por estas horas”, exemplifica Aguiar.
Já as relações processuais referem-se aos custos com honorários e perícias, por exemplo. Na lei anterior, tais encargos eram definidos no momento da sentença. Com a reforma, estes custos passaram a ser responsabilidade do lado perdedor da ação. Porém, atualmente a decisão de qual lado irá arcar com os gastos dependerá da jurisprudência.
Ainda segundo Pirotta, alguns juízes podem analisar ações ingressadas entre os dias 1º e 10 de novembro e considerar a lei vigente naquele período, ao mesmo tempo em que outros adotam as normas novas para julgá-las. Do mesmo modo, o oposto pode acontecer: um caso enviado após a vigência da reforma pode ser julgado baseado nas leis antigas. “Não há consenso, ainda, sobre a procedência em alguns casos.”
AVANÇO – Aguiar avalia que este período é essencial para amadurecer as relações de trabalho. “A partir de agora, as reclamações serão mais técnicas e sérias, já que é preciso justificar e provar as demandas na hora de ingressar com processo. As pessoas não irão entrar com ações sem motivos claros”, pondera.
Reforma trabalhista ainda não impulsiona contratações
Embora a reforma da CLT seja vista com bons olhos pelos empresários, uma vez que poderá gerar contratações sob regime intermitente, ou seja, somente quando for convocado pela empresa, por exemplo, as alterações ainda não geraram novos postos de trabalho.
“As mudanças beneficiam patrões, que terão mais segurança jurídica, e empregados, que terão todos os direitos garantidos, como aposentadoria e férias, sob outros tipos de contratos trabalhistas”, avalia Roberto Moreira, presidente do Sehal (Sindicato das Empresas de Hospedagem e Alimentação do Grande ABC).
No entanto, Moreira admite que, por enquanto, a reforma não gerou novos empregos. “Ainda se tem muitas dúvidas sobre os mais de 100 pontos alterados”, afirma. Para se ter ideia, mais de 450 empresários do setor já procuraram as palestras da entidade para tirar dúvidas sobre a reforma, enquanto que apenas 150, em média, procuram o sindicato para esclarecimento de outros assuntos, como a lei da gorjeta.
Ao mesmo tempo, o Sindicato dos Metalúrgicos do ABC informa que nenhuma mudança foi notada nas empresas da região, exceto nas semanas que antecederam a implementação da reforma trabalhista, quando a categoria enfrentou dificuldades para aprovar o acordo coletivo. O mesmo foi observado pelo Sindicato dos Metalúrgicos de Santo André e Mauá e Sindicato dos Metalúrgicos de São Caetano.
Medida provisória pode alterar parâmetros da CLT
Poucos dias após a reforma trabalhista começar a valer, o presidente Michel Temer (PMDB) ajustou as mudanças na legislação por meio de MP (Medida Provisória). Itens polêmicos foram alterados, como o trabalho de grávidas ou lactantes em locais insalubres, que será permitido em ambientes de graus médio e mínimo, desde que haja laudo médico que autorize a atividade.
Destacam-se também a obrigatoriedade de acordo coletivo para jornada de 12 horas (exceto para profissionais da Saúde), proibição da cláusula de exclusividade para autônomos e inclusão de carência de 18 meses para readmitir funcionários sob contrato de trabalho intermitente.
Embora Temer tenha garantido, ao sancionar o texto original da reforma trabalhista, que voltaria com a obrigatoriedade do imposto sindical por meio da MP, até o momento nenhuma mudança foi anunciada sobre o assunto.
CADASTRO – O MTE (Ministério do Trabalho e Emprego) anunciou que o Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados) passará por mudanças para atender às novas demandas da reforma. O contratante terá que preencher informações relacionadas ao trabalho intermitente, parcial e home office, além de informar sobre o desligamento por acordo entre funcionário e empregador.
Profissionais não perdem direitos já conquistados
Para o trabalhador contratado sob a legislação anterior, a única mudança que poderá ser feita será no regime de férias. Até então, os funcionários poderiam usufruir dos 30 dias de descanso em até dois períodos, sendo o único requisito que um deles fosse de pelo menos dez dias. Hoje, o benefício poderá ser concedido em até três períodos distintos, desde que um deles não seja menor do que 14 dias corridos e, os demais, superiores a cinco.
De acordo com Antonio Carlos Aguiar, da Fundação Santo André, o artigo nono da CLT, que prevê que não se pode retirar direitos do trabalhador, também determina que toda negociação deve envolver troca equivalente e recíproca. “Quem trabalha em turnos tem a jornada máxima de seis horas, porém, o acordo coletivo pode determinar até oito horas de atividades, desde que o empregado tenha algum benefício em troca, como pagamento adicional ou folga”, diz. Além disso, alterações só poderão ser feitas por meio de acordo coletivo, realizado uma vez ao ano, na data base de cada categoria.
Outra mudança prevista na reforma refere-se ao horário de almoço que, de no mínimo uma hora, poderá ser de 30 minutos. Em contrapartida, o trabalhador sai meia hora mais cedo. Quanto aos feriados, agora é possível eliminar a ponte e aproximar a data do feriado ao fim de semana. Caso a empresa opte por manter a emenda, é possível compensar na semana seguinte.