O número de acordos e convenções coletivas registrados no Ministério do Trabalho caiu de forma expressiva nos primeiros meses deste ano, em relação ao ano passado, e também à média dos últimos cinco anos, segundo o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) e da Fundação Instituto de Pesquisa Econômica (Fipe-USP).
Ana Conceição
O recuo indica que patrões e empregados têm tido mais dificuldade em chegar a bom termo nas negociações este ano, segundo sindicatos e especialistas. Pontos da reforma trabalhista estariam contribuindo para o impasse entre ambos os lados.
De acordo com o Dieese, 2.802 acordos foram registrados no primeiro trimestre, 29% menos que em igual período do ano passado, quando o número foi de 3.939. A média entre 2012 e 2017 foi de 3,8 mil. Os números de janeiro a março referem-se a instrumentos coletivos acordados para 2018.
No levantamento da Fipe, que leva em conta o mês de início dos acordos, houve 1.841 acordos fechados no primeiro bimestre, de uma média de 2,8 mil nos cinco anos anteriores. A média dos cinco anos é de 2,8 mil acordos. Esses acordos não são necessariamente salariais. Eles podem conter negociações como compensação de feriados, banco de horas, PLR, entre outros itens.
Para Helio Zylberstajn, coordenador do boletim Salariômetro, há cautela de ambos os lados sobre o que pode ser incluído ou não nos acordos. Um dos pontos polêmicos, diz, é o fim da contribuição sindical, uma das principais formas de financiamento dos sindicatos, extinta pela nova lei.
“Sindicatos têm procurado incluir cláusula para autorizar o desconto em salário, mas algumas empresas se negam por receio de cometer uma ilegalidade”, afirma. Segundo ele, há muita dúvida sobre o que pode ser questionado posteriormente na Justiça.
De outro lado, sindicatos pressionam por manter as cláusulas dos acordos feitos antes do início da vigência da reforma, em novembro de 2017. No ano passado, por exemplo, o acordo feito pelo Sindicato dos Metalúrgicos do ABC incluiu uma cláusula para que as alterações na CLT previstas pela reforma trabalhista não sejam aplicadas sem negociação.
Sergio Butka, presidente do sindicato dos metalúrgicos de Curitiba, afirma que desde o início da crise econômica houve dificuldade para renovar acordos individuais (feitos empresa por empresa), mas agora a situação piorou. Nas negociações deste início de ano, o contingente de trabalhadores protegidos por acordos individuais passou de 90% para 60% do total.
Butka diz que os acordos individuais complementam a convenção coletiva (que abrange toda a categoria). “Fechada a convenção, fazemos acordos individuais com cada empresa para melhorar pontos como participação nos lucros.”
Segundo o sindicalista, alguns segmentos do setor metalúrgico paranaense não fecharam convenção no início do ano por causa de itens trazidos pela reforma como, por exemplo, a não obrigatoriedade de fazer a rescisão do contrato no sindicato. “É preferível ficar sem convenção que ratificar itens da reforma nos acordos”, diz ele.
Com data-base vencida em março, os professores do ensino básico no setor privado em São Paulo estão sem acordo em vigor. Segundo Luiz Antonio Barbagli, presidente do Sinpro, sindicato da categoria, pela primeira vez desde 2003 patrões e empregados do setor irão a dissídio. Segundo Barbagli, as cláusulas do acordo, basicamente as mesmas há 20 anos, não foram renovadas. Com a inflação do INPC abaixo de 2% em 12 meses, a reposição salarial não tem sido um entrave, diz.
Entre as propostas das escolas sobre as quais não houve acordo estão a redução do recesso escolar de 30 para 20 dias. Para Barbagli, a reforma reduziu o poder de pressão dos sindicatos, porque permite negociações diretas com os empregados, por isso não há interesse em fechar acordos.
Benjamim Ribeiro da Silva, presidente do sindicato patronal das escolas, o Sieeesp, diz que as condições previstas nos acordos precisam ser atualizadas. “Queremos reduzir o recesso porque há dificuldade em completar 200 dias de aulas no ano. Há dificuldade em fazer compensação de feriados e queremos normatizar o banco de horas”, afirma ele.
Para Luis Ribeiro, técnico do Dieese, a queda nos acordos é um indicativo de negociações mais difíceis. Ele pondera que a reforma pode ser uma causa, mas é preciso cautela na avaliação. “Pode ser que as negociações estejam mais duras, pode ser que estejam mais demoradas. Ou os sindicatos podem ter deixado de registrar os acordos no sistema”, diz. Ribeiro ressalta, porém, a insegurança jurídica.
“Ainda não há jurisprudência sobre a reforma. Há uma insegurança geral de ambos os lados”, diz. Ele lembra que a MP que iria alterar alguns pontos polêmicos da reforma vai perder a validade no fim deste mês, se não for votada pelo Congresso, o que contribui para a incerteza geral.
Apesar da dificuldade nas negociações, caiu o número de dissídios que deram entrada no Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região, que cobre São Paulo (região metropolitana e Baixada Santista). De acordo com o tribunal, 16 dissídios foram distribuídos no primeiro trimestre deste ano, ante 70 no mesmo período do ano passado e 64 nos primeiros três meses de 2016. Havia 1.029 dissídios pendentes de julgamento no período, ante 1.136 e 1.126 nos mesmos períodos em 2017 e 2016, respectivamente.