Número de mulheres que são chefes de família dobra em 10 anos, aponta IBGE

Fonte: IBGE

O número de mulheres chefes de família dobrou em uma década no Brasil. Levantamento feito pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a partir de dados apurados para o Censo Demográfico, mostra que o volume de mulheres responsáveis pelo domicílio saltou de 9,048 milhões para 18,617 milhões entre 2000 e 2010. Já o número de homens chefes de família permaneceu praticamente inalterado, em 31 milhões. No total, o Censo 2010 contabilizou 49,9 milhões de chefes de família em todo o país.

Para o IBGE, o maior volume de mulheres chefes de família representa um avanço, que reflete maior presença das mulheres no mercado de trabalho e melhor nível de escolaridade. Taxas menores de fecundidade também favoreceram o resultado. Mas, alguns especialistas alertam que o dado pode indicar maior quantidade de mulheres que precisam cuidar dos filhos após a partida dos maridos, com o término de uniões conjugais.

Ontem, o IBGE divulgou os resultados de nupcialidade, fecundidade e migração e famílias e domicílios do Censo 2010. Os responsáveis pelo domicílio não necessariamente são aqueles que ganham mais dentro da família, explicou o técnico da coordenação de população e indicadores sociais do IBGE, Gilson Gonçalves de Matos.

Nessa classificação se encaixam os que assumem a responsabilidade total pela família, de maneira mais ampla do que somente pagar as contas. “Por exemplo, o pai, ou a mãe, pode se declarar responsável, mas ainda morar com filhos que ganham mais do que ele”, exemplificou.

Para o técnico do IBGE, o avanço das mulheres chefes de família representa uma verdadeira mudança, nos valores culturais, quanto ao papel da sociedade brasileira. As mulheres, diz Matos, assumem a chefia de suas casas como reflexo da participação cada vez maior no mercado de trabalho e da melhora no nível de escolaridade. “A tendência é que este cenário [de crescimento no número de mulheres chefes de família] continue nos próximos anos”, afirmou.

O otimismo de Matos em relação aos números divulgados não é compartilhado pela professora da Faculdade de Economia da Universidade Federal Fluminense (UFF), Hildete Pereira de Melo. Para ela, o salto no número de chefes de família é um “atraso”. Ela justificou sua posição ao se aprofundar sobre os termos “responsáveis pelo domicílio”, ou “chefes de família”.

“Isso delimita, na prática, a pessoa que fica no domicílio, que permanece com a responsabilidade maior, que é a criação dos filhos”, disse Hildete. Para ela, a maior parcela de mulheres chefes de família indica que a responsabilidade de criação das crianças e adolescentes nas famílias fica concentrada na mãe.

“A conexão maior que o pai tem, dentro da família, é com sua mulher, e não com os filhos. Nas separações, os homens se mudam de casa, enquanto as mulheres permanecem nos domicílios”, disse a professora.

Outro obstáculo enfrentado pela mulher chefe de família, de acordo com Hildete, é a renda do trabalho. A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) 2011 mostrou que as mulheres receberam, no ano passado, em torno de 70,4% do rendimento de trabalho dos homens, diz a especialista.

Na faixa de menor poder aquisitivo, a situação das mulheres como chefes de família é pior, na análise da professora da Universidade Católica de Petrópolis, Ana Lúcia Paes de Barros. Em seu estudo “Mulheres Pobres e Chefes de Família”, a pesquisadora ressaltou que, de maneira geral, as mulheres chefes de família têm menos anos de estudo, taxas de participação no mercado de trabalho inferiores e salários menores do que os dos homens que também são chefes de família.

O crescimento das mulheres como chefes de família já tinha sido notado pelo presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), Marcelo Neri. Para ele, o resultado pode ser interpretado tanto por uma ótica negativa quanto positiva.

Assim como o IBGE, Neri lembrou que a melhora na participação das mulheres no mercado de trabalho e nos níveis de escolaridade e renda também teriam contribuído para o resultado. “Acho que é uma mudança sociológica”, mas não acho intrinsecamente ruim”, disse o presidente do Ipea.