A indústria de transformação não ganhou importância no total de riquezas produzidas pelo país em 2013, mas sua fatia na geração de empregos formais ficou maior, após dois anos seguidos de perdas. Apesar de o peso do setor manufatureiro no Produto Interno Bruto (PIB) ter ficado estável em 13% no ano passado, ele respondeu por quase 11% das mais de um milhão de vagas com carteira assinada criadas em todo o país no período.
Em 2012, de 1,37 milhão de postos de trabalho celetistas abertos, apenas 6,8% foram destinados a essa parte da indústria. Os dados são do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), e consideram informações enviadas com atraso à pasta. Essa tendência se manteve no primeiro trimestre de 2014. No período, o setor criou 100 mil vagas, pouco menos de um terço dos 345 mil empregos abertos no país.
O saldo absoluto de vagas com carteira criados pela indústria caminhou em sentido contrário ao movimento geral da economia e também aumentou na passagem de 2012 para 2013, de 92,8 mil para 120,1 mil – alta de 29,4%, num ano de pouco dinamismo da produção do setor, que subiu 1,5%. Na comparação anual, a diferença total entre demissões e admissões recuou em quase 20%.
Para Silvio Sales, consultor do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre-FGV), a análise dos dados do Caged em perspectiva mais longa ainda permite observar uma tendência negativa. Mesmo em 2011, ano fraco para a atividade industrial, o segmento de transformação abriu 224 mil novas vagas formais, após o salto de 10,3% na produção observado em 2010, quando o saldo da criação de postos de trabalho foi positivo em 554,3 mil.
Dados da Pesquisa Mensal de Emprego (PME), do IBGE, corroboram a avaliação do especialista do Ibre. A indústria extrativa, de transformação e distribuição de eletricidade, gás e água, que já chegou a representar 17,5% do total da população ocupada nas seis principais regiões metropolitanas do país em março de 2006, caiu para 15,9% no mesmo mês de 2014.
Sem esquecer a perda de espaço relativa da indústria na absorção de trabalhadores na comparação com outros anos, o economista do Ibre avalia que setores intensivos em mão de obra que receberam incentivos do governo ajudaram a elevar o número de vagas abertas pelo segmento no ano passado. Dos 27,3 mil postos a mais em relação a 2012, Sales destaca que 26,5 mil vieram de três subsetores: material de transporte, mecânica e indústria têxtil e de vestuário.
O primeiro ramo foi o que registrou maior avanço absoluto na criação de empregos celetistas entre 2012 e 2013, de 2,7 mil para 14,1 mil vagas. Para o consultor, os estímulos concedidos ao setor, que no ano passado contou com redução das alíquotas do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e tem recebido novos investimentos e fábricas, permitiram o maior número de contratações. No caso das indústrias mecânica e têxtil, Sales aponta a influência positiva da desoneração da folha de pagamentos. “Há também um número significativo de pequenos negócios na indústria de bens de capital. Pode ser que o estímulo da desoneração tenha levado a maior formalização”, afirma.
Para Claudio Dedecca, professor do Instituto de Economia da Unicamp, parte do aumento do peso da indústria na criação de vagas formais está relacionada à perda de vigor do principal empregador do país, o setor de serviços. O segmento, diz, vinha passando incólume pela desaceleração da atividade até 2012, mas, no ano passado, parece ter sido mais atingido pelo ambiente de baixo crescimento do que a indústria. Em 2013, os serviços responderam por 49,8% do saldo líquido de vagas do Caged, ante 50,7% no ano anterior.
Segundo Dedecca, também há sinais, ainda que não homogêneos, de que a desvalorização cambial de quase 15% ocorrida no ano passado restabeleceu alguma proteção ao setor industrial, que conseguiu reativar seu nível de produção e gerar mais empregos.
O problema, diz Dedecca, é que a reativação está muito dispersa entre os ramos da indústria. Por isso, é difícil prever o comportamento do emprego do segmento de transformação neste ano. “Não há evidências claras de que reativação é sustentada”, afirma. “Há setores que estão indo bem, e outros que estão mal. A situação parece uma verdadeira nau sem rumo.”
Sales, do Ibre-FGV, faz a mesma observação. Embora o saldo total de vagas do setor manufatureiro tenha sido maior em 2013, o consultor nota que houve destruição de postos em dois subsetores: o de papel, papelão e edição (menos 1,3 mil vagas) e o de calçados (menos 5,4 mil vagas). No primeiro setor, diz, a perda líquida de empregos deve ter sido mais influenciada pelo segmento de edição e impressão. Já a indústria calçadista atravessa quadro mais difícil. Desde 2011 registra saldos negativos anuais no Caged. Nesse caso, Sales sustenta que a desoneração da folha parece não ter sido suficiente para elevar o nível de emprego.
Gabriel Ulyssea, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), vê o aumento da parcela da indústria de transformação no fluxo de novas vagas como um movimento positivo, que pode ter sido incentivado pela desoneração da folha de pagamentos para uma série de setores, além do IPI. Por outro lado, pondera, de acordo com dados da Relação Anual de Informações Sociais (Rais), o peso dessa parte na economia no estoque total de empregos formais seguiu em queda em 2012, em 21% (último número disponível).
Sem os dados da Rais de 2013, Ulyssea afirma que a melhora da dinâmica de criação de vagas do setor de transformação ainda não pode ser considerada uma tendência. “A indústria ao menos deixou de perder espaço, mas isso não significa que o setor vai crescer muito em termos de participação no emprego, porque não há sinais de que seja uma mudança estrutural.”