Folha de S.Paulo
O número de ações trabalhistas contra bancos despencou 62% após a reforma trabalhista. O setor financeiro foi o que registrou a maior queda percentual de novos processos depois das mudanças na CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), em novembro do ano passado.
Entre janeiro e julho deste ano, de acordo com informações do TST (Tribunal Superior do Trabalho) obtidas pela Folha, foram ajuizadas 15,6 mil ações contra instituições financeiras em varas trabalhistas de todo o país.
No mesmo período de 2017, o total chegou a 40,8 mil.
O grande volume de ações é apresentado pelas instituições como um dos fatores que limitam a queda na taxa de juros porque sustentam os altos spreads bancários —a diferença entre a taxa que o banco capta dinheiro no mercado e quanto cobra para emprestar para o cliente.
O litígio trabalhista entra na conta das despesas administrativas das instituições financeiras que, segundo relatório do Banco Central, representavam 16% do ICC (Indicador de Custo do Crédito) em 2017.
“Em tese, a taxa de serviço seria para equilibrar essas despesas, mas, na prática, ela não cobre tudo e sobra para o spread”, diz Ricardo José de Almeida, professor do Insper.
Especialistas apontam, assim, que a queda nas ações trabalhistas teria de contribuir para uma redução no spread e, consequentemente, dos juros cobrados dos clientes.
“Como são muitos fatores que o compõem, cada um pode contribuir para a redução”, diz Vitor Velho, economista da LCA.
Ele ressalta, no entanto, que o alívio na Justiça precisa ser acompanhado de outras mudanças estruturais, como a aprovação do cadastro positivo. Segundo Velho, a medida reduziria o risco do crédito e a inadimplência, responsável por 24% do ICC.
A Febraban (Federação Brasileira dos Bancos) e a Confraf-CUT (Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro) não se posicionaram sobre o assunto.
Os bancos estão entre os campeões em reclamações trabalhistas, por exemplo, no TST, a última instância da Justiça do Trabalho.
Na corte, as cinco maiores instituições do país figuram entre os 20 principais acionados pelos trabalhadores em recursos que sobem para a análise de ministros.
Segundo o advogado trabalhista Pedro Mahin, sócio do escritório Mauro Menezes Advogados, a reforma trabalhista inibiu o ajuizamento de novas ações por causa da limitação da justiça gratuita.
Antes da mudança da lei, qualquer trabalhador podia solicitar o benefício, que passava apenas pelo crivo da Justiça na chamada presunção da gratuidade.
Com a reforma, porém, só tem acesso à gratuidade o trabalhador que tenha renda de até 40% do teto do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social), o que seria hoje equivalente a R$ 2.256,32.
Os bancários têm salários mais elevados que os de outras categorias. O piso do caixa de banco em São Paulo é de R$ 2.962,29, por exemplo.
Advogados apontam que eles não conseguem ter acesso ao benefício da gratuidade e precisam arcar com os custos do processo, além dos honorários de advogados da outra parte, caso percam as ações.
“Os trabalhadores com salários mais altos são excluídos da justiça gratuita e desestimulados de ajuizar ação. Mas não é porque têm salários um pouco maiores que podem pagar o advogado do banco se a interpretação da Justiça não for favorável a ele”, diz Mahin.
Para Cleber Venditti, sócio do escritório Mattos Filho, a cobrança dos honorários –de 5% a 15% do valor pedido na causa– ajudou a inibir “processos aventureiros”.
Faixa em banco durante a protesto de bancários em fevereiro – Rivaldo Gomes/Folhapress
Setor com o maior volume de litígios, a indústria registrou queda de 45% nos novos casos ajuizados nas varas entre janeiro e julho deste ano, na comparação com 2017.
O número de ações despencou de 334,1 mil para 183,9 mil.
Segundo Luciana Nunes Freire, diretora-executiva jurídica da Fiesp (Federação das Indústrias de SP), a queda reflete a segurança jurídica que a reforma trouxe. Para ela, a legislação deixou algumas regras mais claras, como trabalho remoto e contração de autônomos e terceirizados.
Os processos contra empregadores dos setores de serviços e comércio caíram, respectivamente, 36% e 33%. Na média, a queda geral é de 37,%.
Segundo a FecomercioSP (federação do setor), a reforma contribui também ao permitir que o negociado prevaleça sobre o legislado, conferindo às negociações coletivas o papel de regular.
O presidente do Sindicato dos Comerciários de São Paulo e da UGT (União Geral dos Trabalhadores), Ricardo Patah, diz que houve diminuição na procura de trabalhadores ao sindicato para fazer reclamações.
Quando ela ocorre, a recomendação do sindicato tem sido a ação coletiva.
“Caso haja alguma violação muito grande de direito entramos com a ação individual. Mas ação coletiva protege um pouco o trabalhador, já que o ônus da derrota ficaria com o sindicato”, afirma.