por Laura Castanho — publicado 06/06/2018 19h29
Em sessão organizada para discutir a legislação trabalhista no Brasil na conferência anual da OIT (Organização Internacional do Trabalho), o ministro do Trabalho Helton Yomura (PTB) acusou abertamente a organização de “instrumentalizar para o jogo político doméstico”. A razão para isso seria a inclusão do Brasil na lista de 24 países que violam as normas internacionais de proteção aos trabalhadores, que inclui Haiti, Camboja e Botsuana. A escolha, diz Yomura, foi “político-ideológica”.
Nomeado após a deputada Cristiane Brasil, filha de Roberto Jefferson, ser impedida de assumir a pasta pela Justiça, o ministro do PTB foi o primeiro a falar na sessão, em Genebra, que teve formato de assembleia e reuniu representantes de sindicatos, empregadores e do Estado brasileiro. Segundo presentes, as declarações criaram um clima constrangedor que durou até o final da reunião.
“É difícil conceber que uma organização centenária, que estava no Tratado de Versailles, estaria subjugada a interesses político-partidários nacionais”, diz Thiago Gurjão, procurador e assessor internacional do Ministério Público do Trabalho. “Vimos um representante do Estado brasileiro atacando a OIT e a imparcialidade do comitê de peritos.”
O ministro estava lá para defender o Estado e os pontos da reforma trabalhista que renderam a inclusão na lista, mas optou por apontar uma suposta “escolha política-ideológica”, nas suas palavras. Foi vaiado pelo público e rebatido enfaticamente pelos sindicalistas presentes, como Antonio Lisboa, secretário de relações internacionais da CUT (Central Única dos Trabalhadores). Segundo Gurjão, essa é uma prática típica de “nações sem muito crédito internacional” na questão trabalhista, como China e Síria.
O principal ponto que levou o Brasil a ser incluído na lista foi a visão legal que privilegia negociações entre trabalhadores e patrões em detrimento da legislação, introduzida pela reforma trabalhista aprovada em julho do ano passado.
Segundo o procurador, esse princípio distorce a função das negociações coletivas, que até então eram pensadas como acordos pontuais que visavam sempre a melhoria das condições de trabalho. A OIT está preocupada que elas possam vir a piorar a situação dos trabalhadores no Brasil.
A organização já havia avisado o governo de que a nova legislação poderia comprometer o país antes mesmo de ela ser aprovada, em um relatório técnico de janeiro de 2017. À época, o Executivo ignorou a manifestação.
Como o ministro do Trabalho não se comprometeu a adotar as recomendações internacionais, o caso brasileiro deve seguir na OIT, e o país será convocado novamente para explicar sua legislação. O desgaste mais imediato frente à comunidade internacional, no entanto, foi na imagem do governo.
“O Brasil era tido, até pouco tempo, como um país de referência quanto às suas políticas na proteção social do trabalho. Com a reforma trabalhista, a vitrine passa a ser vidraça”, afirma Gurjão. O MPT aguarda a conclusão do julgamento de uma série de pontos da reforma trabalhista pelo Supremo Tribunal Federal, como aquele que obriga o trabalhador a arcar com as despesas do processo trabalhista, se perder a ação. O debate sobre essa questão teve início na Corte, mas o ministro Luiz Fux pediu vista.