“A digitalização alterou o conceito de carreira. O sucesso não está mais ligado ao cargo ou à trajetória corporativa”, diz Patrícia Feliciano, diretora executiva de talentos e organização da Accenture.
Segundo ela, o avanço da automação e da inteligência artificial reescreve a gestão dos recursos humanos nas organizações. “As profissões do futuro exigem competências interpessoais, não técnicas”, diz. A explicação está no fato de as máquinas estarem aptas a assumir tarefas repetitivas, sobrando para os trabalhadores funções ligadas à criatividade, negociações, análise e solução de problemas complexos.
Também ganham espaço a empatia e a capacidade de cuidar do próximo. Patrícia diz que a tecnologia vai afetar grande parte das tarefas de pouco valor agregado, que vão desaparecer, mas “a maior parte do trabalho vai mudar a forma de operação, não acabar”, diz.
Na seara das novas profissões surgem nomes como cientistas de dados, arquitetos de soluções cognitivas, pilotos de drones, treinadores de sistemas de inteligência artificial, analistas de internet das coisas e engenheiros de segurança digital. Nas que podem utilizar o conhecimento adquirido como bilhete de entrada na economia 4.0 estão: psicólogos, que encontram espaço na análise e desenho dos recursos cognitivos das máquinas; linguistas, contratados para ensinar máquinas a falarem e entenderem linguagem humana; e matemáticos e estatísticos, que migram em massa para a codificação de algoritmos computacionais. “Não existem profissionais capacitados para as novas funções. As empresas terão de encontrar talentos dispostos a aprender e adaptar seus conhecimentos”, afirma Patrícia.
Amália Andreu, gerente de recursos humanos da Huawei no Brasil, explica que é preciso agir neste momento de transição. “Vai levar um tempo para as tarefas serem automatizadas, a pior opção é esperar”. A Huawei investe em parcerias com as universidades para buscar “sangue novo”. A ideia é encontrar profissionais flexíveis, com perfil para atuar na indústria 4.0. Prefere os estudantes capazes de decifrar mercados e com apetite pelo conhecimento. “Os jovens são curiosos, nasceram digitais e conseguem absorver um grande volume de informação”, diz Amália
Para quem já está no mercado, a saída é a capacitação; a busca por cursos, palestras e grupos de discussão que ajudem a encontrar uma saída do turbilhão digital. Estudo realizado pela Accenture mostra que 62% dos funcionários das empresas pesquisadas acreditam que a tecnologia vai criar oportunidades profissionais para eles; 67% acham importante aprender sobre inteligência artificial nos próximos anos; e 45% enxergam nos novos recursos uma forma de trabalhar com maior eficiência. “Para as empresas, treinar um colaborador alinhado com a cultura e conhecedor do mercado é um ótimo negócio”, afirma Sandra Maura, CEO da TopMind.
Sandra acredita que formar a nova geração de trabalhadores é função das empresas. Os programas devem considerar tanto os profissionais internos como os que correm atrás de uma oportunidade. A TopMind criou um programa de capacitação gratuito, com aulas e palestras semanais. “Cerca de seis mil pessoas já participaram da iniciativa”, diz. O programa é uma espécie de “banho digital”. O conteúdo tem o objetivo de despertar o profissional para as chances reais de mudar de carreira, com o apoio da tecnologia. Em vez de temer ou culpar a digitalização pelo desemprego, os alunos entendem o que fazer para ingressar em novos postos de trabalho. “Alguns encontram na digitalização a oportunidade de tocar projetos próprios”, diz Sandra.
Dárcio Alves foi demitido da função de administrador de contratos. Passou oito meses desempregado e precisou trancar a faculdade de engenharia. Na mesma época, a filha adoeceu. “Parecia que tudo estava dando errado”, diz. Ficou sabendo do programa TOP+Próximo. “As palestras ampliaram meu horizonte sobre as profissões, conheci pessoas e consegui um novo trabalho”. Mesmo sem entender de contabilidade, ele foi parar no departamento contábil do Grupo DPSP – fruto da fusão das redes Drogarias Pacheco e Drogaria São Paulo. Foi exatamente o conhecimento na área de contatos que atraiu o novo chefe. Na época, a empresa estava mudando o sistema de gestão financeira. A empreitada demandava contratação de software e de computadores. “Eles gostaram da minha atitude, eu já cheguei dando ideias para suavizar a migração”, diz.