A paralisação dos petroleiros, que tem ganhado proporções desde domingo, vai na contramão da dinâmica das campanhas salariais observadas neste ano. Mesmo diante da piora das condições da economia, os Tribunais Regionais do Trabalho estão recebendo menos dissídios coletivos, inclusive de greve, quando observado o movimento do ano passado. As categorias com data-base no segundo semestre, muitas tradicionalmente bem organizadas do ponto de vista sindical, têm fechado com muito custo reajustes que cobrem pelo menos a inflação acumulada – pagos, muitas vezes, em mais de uma parcela.
Seis dos principais TRTs do país receberam pelo menos até setembro 521 dissídios coletivos, volume inferior ao acumulado no mesmo período do ano passado, 539. Com exceção de São Paulo e Minas Gerais, as regiões do Rio de Janeiro, Bahia, Santa Catarina e Campinas não autuaram mais dissídios do que em 2014.
“É mais difícil fazer greve e paralisação quando o emprego está em risco”, afirma o supervisor técnico do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) em Santa Catarina, José Álvaro Cardoso. Apesar da ponderação, o economista se disse surpreso com o balanço do TRT do Estado, já que o Dieese orienta, esgotadas as possibilidades na mesa de negociação, que os trabalhadores levem as campanhas a dissídio. Os tribunais do trabalho, via de regra, garantem pelo menos os índices de inflação.
José Silvestre Prado, coordenador de relações sindicais do Dieese, ressalta que os sindicatos seguem brigando pelos aumentos. O esforço, contudo, se divide com as discussões para garantir o emprego, já que, em muitos setores, as dispensas superam as contratações.
Além do volume menor de reajustes com ganho real, tendência que já aparece no balanço das campanhas do primeiro semestre, devem crescer neste ano os casos de parcelamento, quando o aumento é pago em partes, e de escalonamento, quando os percentuais variam entre as faixas salariais. Em 2003, ano também adverso para o mercado de trabalho, essas modalidades apareceram em 30% das negociações, diz Prado.
Algumas das grandes categorias com data-base no segundo semestre, que somaram ganhos reais expressivos nos últimos anos, têm conseguido negociar pelo menos os índices de inflação, mas não sem alguma dificuldade. Após 21 dias de greve, os bancários aceitaram no último dia 26 proposta de 10% feita pela Febraban.
Com data-base em novembro, os metalúrgicos da Força Sindical em São Paulo, cerca de 250 mil apenas na capital, fecharam acordo em apenas 1 dos 8 grupos que a central representa – o único cuja entidade patronal acenou com percentual que cobrisse pelo menos a inflação. A campanha dos metalúrgicos representados pela federação da CUT, a FEM, também continua para alguns grupos. As negociações já fechadas garantiram o INPC de 9,88% até setembro, mês da data-base. Para muitos trabalhadores, entretanto, ele será pago em duas vezes.
Os químicos de São Paulo, categoria que conta 165 mil trabalhadores no Estado, fecharam acordo que garantiu a inflação acumulada até outubro – pouco mais de 10% – em apenas uma rodada, algo atípico, afirma Sergio Luiz Leite, presidente da Fequimfar. “Acho que os trabalhadores não quiseram correr o risco de entrar em uma greve longa”, pondera. Nos últimos dez anos, as convenções coletivas registraram ganhos reais entre 1,5 e 2 pontos percentuais.
A categoria comemorou o pagamento do reajuste integral, diz o sindicalista. Os trabalhadores do setor sucroalcooleiro, também representados pela Fequimfar, negociaram em maio o INPC de 8,34%, pago em “duas ou em até três vezes”, a depender da empresa.
Garantido o pagamento “extra” de R$ 2 mil no cartão alimentação e manutenção de benefícios, os funcionários da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) aceitaram em setembro reajuste de 6%, inferior à inflação de 9,9% acumulado no período. Na base dos metalúrgicos do Sul Fluminense, o acordo ainda foi melhor do que o fechado entre algumas montadoras: reajuste zero, com compensação via abono e PLR. “A gente abriu mão de algumas coisas para garantir o emprego”, diz Bartolomeu Citeli, diretor de comunicação da entidade.
Os casos não são isolados. A mediana dos reajustes registrados no Ministério do Trabalho mostram que os acordos não têm ganhos reais há três meses. O levantamento é feito pela plataforma salarios.org.br, que acompanha as negociações mês a mês.
O desembargador Rafael Pugliese, do TRT de São Paulo, relata ter se deparado com um número crescente de reajustes escalonados na seção de dissídios coletivos – que continua, segundo ele, usando a inflação como parâmetro para estabelecer os reajustes quando não há acordo entre as partes, mesmo com a escalada nos índices de preços. O tribunal está entre os poucos que receberam número superior de ações em relação a 2014.