Relação entre produção industrial e taxa básica de juros fica mais fraca

Denise Neumann | De São Paulo

A reação da indústria aos ciclos da taxa básica de juros mudou nos últimos anos. Ao contrário de outros momentos, onde a relação entre subir juros e reduzir a produção ou cortar a taxa e esperar uma reação positiva era mais direta, desde 2010 se observa que a correlação ficou mais fraca. Para economistas, outras variáveis passaram a influenciar fortemente o comportamento da produção industrial, segmento que reagia mais diretamente aos movimentos da Selic.

As políticas de incentivo setorial – redução do IPI, Programa de Sustentação do Investimento (PSI) e desonerações da folha de salários, entre outras – fizeram um contraponto à Selic e ajudaram o setor. Por outro lado, a valorização do real tirou competitividade da indústria, que perdeu exportações e ganhou concorrência no mercado interno. O objetivo da taxa básica nunca foi controlar a produção, mas essa sempre foi uma reação correlata à medida adotada para conter a inflação.

Desde abril, quando a Selic começou a subir, a produção industrial só caiu. Para os economistas, no entanto, essa queda vai além dos juros, porque, entre outros elementos, as vendas do varejo subiram no período. Tomando abril de 2013 como base 100, o patamar da produção de dezembro foi 5,3% inferior ao daquele mês, enquanto as vendas do comércio, em novembro, foram 5,3% maiores que as de abril, ambas as séries com ajuste sazonal. Importações fortes e falta de demanda externa ajudam a explicar a produção fraca, mesmo diante de um consumo que ainda cresce, embora em taxas mais brandas.

Aloisio Campelo Jr., do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre-FGV), observa que a indústria, após crescer em 2010 e voltar ao nível pré-crise, oscila em torno de um mesmo patamar. A indústria alcança o pico de produção no primeiro trimestre de 2011. A partir daí, só patina e depois cai, mesmo com a Selic cedendo. O ciclo de queda dos juros começa em setembro de 2011, mas a reação só vem em 2012, quando o governo adota medidas de redução do IPI e de juros baixos para bens de capital, diz Campelo Jr.

Para o pesquisador do Ibre, a taxa básica de juros continua a ter impacto sobre a demanda, mas o ritmo de atividade também depende de outras variáveis e, em anos recentes, a política fiscal expansionista, com foco em ajuda à indústria, e o câmbio contrabalançaram o efeito da Selic. “Nos últimos anos, a importação é que ditou muito do rumo da indústria, e entre 2011 e 2012, nem a queda da Selic, nem a desvalorização do câmbio foram suficientes para reverter a perda de competitividade, apenas atenuaram o movimento. “

Em 2007, a taxa básica iniciou o ano em 13,25%, em um ciclo de baixa de juros. A queda continuou até setembro, para 11,25%, quando acumulou 200 pontos-base de redução. Nesse período, a produção industrial cresceu 5%, comparando patamares mensais. Depois a taxa ficou estável por seis meses, quando o nível mensal de produção cresceu 4%. Na sequência, a crise mundial afetou todo o cenário.

Depois de cair e ficar estável, a Selic volta a subir bem no fim de abril de 2010. No novo ciclo de alta, de maio de 2010 até julho de 2011, aumenta 300 pontos-base, mas o comportamento da produção ao longo de 14 meses lembra uma gangorra, com altos e baixos, sem trajetória definida. Apenas nesse curto período, a participação das importações no consumo doméstico sobe de 16% para 18%.

Júlio Sérgio Gomes de Almeida, da Unicamp e ex-secretário de Política Econômica, observa que a indústria é o setor que mais rapidamente responde aos movimentos da taxa básica de juros, mas avalia que a correlação diminuiu nos últimos anos, afetada por outras variáveis. “Quando o BC corta os juros, está dando sinal verde para a economia crescer, dá mesma forma que um empresário vai pensar duas vezes em investir quando existe um ciclo de alta de juros.”

Nos últimos anos, porém, com as medidas de incentivo do governo e com as incertezas criadas com a crise externa, essa relação “direta” passou a ser afetada por muitos ruídos. “A relação permanece, mas com mais interferências”, afirma Almeida.

O primeiro impacto da Selic aparece nos índices de confiança, diz Campelo Jr. “Um a dois meses depois, o aumento dos juros afeta a confiança e as expectativas dos empresários”, diz. Segundo ele, junho de 2013 foi o momento em que o aumento dos juros iniciado em abril se associou com as manifestações de rua e colocou um ponto de interrogação sobre o futuro na cabeça dos empresários.

Campelo Jr. esperava queda na produção industrial de dezembro, mas não o tombo de 3,5% sobre novembro. Os índices de confiança já mostravam que faltava ânimo ao setor produtivo, mas não sugeria queda tão pronunciada. Para ele, a queda pode ter sido potencializada pelo efeito-calendário, pois o Natal foi festejado em uma quarta-feira.

Em toda a série do IBGE, desde 1991, a produção medida pela Pesquisa Industrial Mensal-Produção Física (PIM-PF) sempre caiu nos meses de dezembro quando o dia 25 foi em uma quarta ou quinta-feira. Em outros dias da semana, não existe uma regra, mas sempre que o Natal caiu no domingo, a produção cresceu. Com o Natal no sábado, a produção subiu em três ocasiões e diminuiu em um ano.