POR BERNARDO MELLO FRANCO
O Brasil é o maior consumidor de agrotóxicos do planeta, de acordo com a Associação Brasileira de Saúde Coletiva. Há quem ache pouco. A bancada ruralista quer aprovar um projeto de lei que afrouxa o controle sobre o uso de pesticidas. O texto deve ser votado hoje por uma comissão especial da Câmara.
A proposta original é do senador Blairo Maggi, velho adversário dos ambientalistas e atual ministro da Agricultura. Foi atualizada pelo deputado Luiz Nishimori, também filiado ao PR. Eles pregam o desmanche da Lei do Agrotóxico, que tacham de “defasada” e “obsoleta”.
A ideia é remover as barreiras ao registro dos pesticidas, que podem provocar câncer e malformação de fetos. As substâncias só passariam a ser proibidas quando apresentarem “risco inaceitável para os seres humanos ou o meio ambiente”.
O relator também promete acabar com a “burocracia excessiva” no setor. Hoje os agrotóxicos dependem de aprovação da Anvisa e do Ibama. Nishimori quer transferir o poder de veto para o Ministério da Agricultura — isso mesmo, a pasta comandada por seu aliado Maggi.
Procuradores, médicos e ambientalistas alertam para os riscos de retrocesso. Um parecer do Ministério Público Federal afirma que o texto viola seis artigos da Constituição. “Dos 14 motivos apontados para a alteração da legislação vigente, nenhum considera, diretamente, os efeitos dos agrotóxicos sobre a saúde ou meio ambiente”, diz o documento.
Ontem a Fundação Oswaldo Cruz, ligada ao Ministério da Saúde, avisou que a mudança na lei pode causar “prejuízos incomensuráveis”. “A literatura internacional e as pesquisas demonstram os riscos no uso dos agrotóxicos”, disse à coluna a presidente da Fiocruz, Nísia Trindade.
Um relatório do Inca afirma que as regiões com alto uso de pesticidas apresentam “incidência de câncer bem acima da média nacional e mundial”. A Anvisa informa que a União Europeia já proíbe 22 dos 50 produtos mais usados no Brasil.
Os dados parecem não impressionar os ruralistas. No relatório que pode ser aprovado hoje, Nishimura prefere gastar energia com o significado das palavras. Ele diz que a lei atual usa termos “depreciativos”, e propõe que os agrotóxicos passem a ser chamados de “produtos fitossanitários”.