Um terço dos muito pobres tem emprego, aponta pesquisa mundial da OIT

CÍNTIA CARDOSO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA DE GENEBRA

Um terço das pessoas em situação de pobreza extrema ou moderada no mundo tem um emprego. A conclusão é do estudo “Perspectivas do emprego e questões sociais no Mundo em 2016 ­ Transformar o emprego para acabar com a pobreza” da OIT (Organização Internacional do Trabalho) divulgado nesta quarta-­feira (18), em Genebra. Os outros dois terços vivem, por exemplo, de programas de transferência de renda, como o Bolsa Família.

“A natureza do emprego desses trabalhadores é vulnerável. Muitas vezes eles nem mesmo são remunerados [como quem mora com uma família e faz trabalhos domésticos sem salário] ou estão em profissões de baixa qualificação. Hoje, 30 % da população mundial é pobre, mas eles detêm apenas 2% da renda”, disse à Folha Raymond Torres, conselheiro especial para Assuntos Sociais e Econômicos da organização.

Pelos critérios da organização, é considerado extremamente pobre quem vive com menos de US$ 1,90 (R$ 6,70) por dia e “moderadamente pobre” quem tem ganhos diários inferiores a US$ 3,10 (R$ 11). Os valores são medidos em paridade de poder de compra.

Para mudar esse quadro, a organização calcula que seriam necessários US$ 600 bilhões por ano ao longo dos próximos 15 anos. Até 2030, a organização tem a meta ambiciosa de erradicar a pobreza extrema no mundo.

BOLSA FAMÍLIA
No caso do Brasil, eliminar completamente a pobreza custaria o equivalente a 0,3% do PIB (Produto Interno Bruto). A organização destaca que uma das ferramentas para melhorar a situação dos trabalhadores em condições econômicas precárias são os programas de transferência de renda.

“O Bolsa Família é essencial. Esse programa fez com que 30 milhões de brasileiros saíssem da pobreza. Isso é um desempenho histórico. O programa serve também como um estabilizador automático nesse momento em que o Brasil atravessa uma das piores recessões da sua historia recente “, destacou Torres. No contexto recessivo atual, tanto o Bolsa Família quanto o’ Minha Casa, Minha Vida’ são importantes para proteger os trabalhadores mais pobres”, afirmou o conselheiro especial para Assuntos Sociais e Econômicos da OIT.

O sucesso dos programas de transferência direta de renda, porém, não é suficiente para erradicar de forma durável a pobreza. Para isso, sobretudo no caso brasileiro, a OIT recomenda simplificação de procedimentos administrativos para a abertura de pequenas empresas, ações de combate à corrupção e melhoria da infraestrutura para, por exemplo, aumentar a competitividade das exportações. “Isso tem um impacto direto na melhoria da qualidade dos empregos.

Quanto à reforma tributária, Torres prega uma receita já conhecida: maior participação das camadas sociais mais abastadas. “Os ricos têm que assumir que têm uma certa responsabilidade na perpetuação da pobreza”.

O relatório, que é divulgado anualmente, também aponta a necessidade de tirar os trabalhadores do setor informal. “Promover a transição para o setor formal é a condição ‘sine qua non’ para erradicar a pobreza. Isso vai permitir com que as pessoas tenham acesso à proteção social e salário mínimo”, avalia a OIT.

De acordo com Torres, manter uma rede de proteção social é ainda mais importante em tempos de crise econômica. “Isso evita efeitos ainda mais devastadores da recessão”, conclui.

PAÍSES RICOS
De acordo com a OIT, a pobreza recuou de forma significativa na América Latina e na Ásia, mas nos países ricos, na esteira da crise de 2008, ela aumentou. Os dados disponíveis, que vão até 2012, mostram que 300 milhões de pessoas nos países desenvolvidos estão na linha de pobreza relativa. Ou seja, sem condições recursos para satisfazer as necessidades básicas. O fenômeno foi observado com mais intensidade na União Europeia, informa a OIT.

A entidade lamenta que os progressos alcançados em países emergentes possam ficar comprometidos por causa da deterioração das condições econômicas. “Em alguns países da América Latina a desigualdade da renda começou a crescer. (…). Tendências mais recentes também mostram uma escalada da pobreza na Europa”.

Apesar do revés, Raymond Torres afirma que ainda é possível manter a meta de erradicação da pobreza extrema dentro de 15 anos. “Temos que fazer de tudo para alcançar esse objetivo. O mundo hoje tem condições para isso”.