Assédio moral no trabalho gera desmotivação, medo e afeta produtividade; saiba como agir

Luciana Quierati
Do UOL, em São Paulo

Diminuição da produtividade, desmotivação, falta de interesse e medo podem ser resultado de humilhações repetitivas e outras condutas abusivas sofridas no ambiente de trabalho. Se esse é o seu caso, tome cuidado, pois você pode estar sendo vítima de assédio moral.

Fato é que nem sempre o assédio fica claro, pois não é apenas uma agressão verbal ou uma ameaça que vai caracterizá-lo e, muitas vezes, o trabalhador tem medo de fazer acusações com medo de ser prejudicado.

 “O assédio se caracteriza pela conduta repetitiva, insistente, persistente e, em especial, por existir, da parte do assediador, a intenção de prejudicar a vítima”, explica Edina Bom Sucesso, autora do livro “Até quando? Tortura psicológica e assédio moral no trabalho” (Ed. Qualitymark).

O assédio pode partir de um chefe contra um subordinado, de um colega contra outro colega de trabalho e até de subordinado contra um superior, quando um antigo colega é promovido a chefe sem que o grupo tenha sido consultado. O grupo pode agir contra ele, assediando-o moralmente.

Gravidade do assédio

De acordo com a psicóloga Edina Bom Sucesso, a gravidade do assédio é medida nas consequências à saúde da vítima, e não na forma de agir do agressor. Independentemente do que ele faça – seja um xingamento repetitivo ou tentativas de prejudicar a carreira – o resultado na vida do trabalhador é o que torna o assédio mais brando ou grave. Veja exemplos:

Brando: Um homem chega à empresa e vai ganhando destaque. O chefe se sente ameaçado e passa a impor-lhe metas praticamente impossíveis de serem atingidas. Durante alguns meses, esse homem é forçado a alcançar essas metas e, sem conseguir, acaba tendo insônia. Recorre ao RH e é aconselhado a falar com o superior. Ele acata, mas o chefe, com o passar do tempo, volta a pegar pesado. Por fim, o rapaz deixa a empresa.

Grave: O chefe começa a assediar uma funcionária muito talentosa. Critica a qualidade do trabalho dela em público, tentando diminuir o seu talento. Depois de ser muito criticada em público, a trabalhadora passa a achar que o problema é ela, que não tem mais a mesma competência e entra em processo depressivo muito sério, a ponto de precisar de um tratamento psiquiátrico. Até que ela, sem mais forças, deixa o emprego, sem recorrer à Justiça.

Esse caso, segundo Edina Bom Sucesso, é considerado grave porque, além de a trabalhadora ficar muito doente, ela não vai atrás de seus direitos. “Ela paga a conta sozinha e isso é muito sério”, diz a psicóloga.

Como agir em caso de assédio

Fale com o assediador
O primeiro passo para resolver uma situação de assédio moral é ter uma conversa franca com o suposto assediador. Ele pode não estar percebendo o assédio que pratica ou mesmo nem estar praticando o assédio, num possível caso de equivocada percepção por parte de quem o acusa.

“Às vezes, o outro não tem consciência da sua influência sobre o funcionário e, quando ultrapassa o limite, tem que ser mostrado isso a ele”, diz Luiz Edmundo Rosa, diretor de educação da ABRH-Nacional.

No caso de assediador ser um colega de trabalho, também o primeiro a fazer é procurar o respectivo chefe. Mas a psicóloga Maria do Carmo Célico, especializada em assédio moral no trabalho, alerta para a reação que o chefe pode ter.

 “Já houve casos em que a pessoa procurou o chefe e ele disse que ela estava louca, não aceitava mudanças e precisava rever seus conceitos”, diz Maria do Carmo.

Procure o superior do seu chefe
Se o chefe é o assediador e a conversa franca com ele não funcionou, o superior dele deve, então, ser procurado pela vítima. “A hierarquia obriga que a sigamos, com todo o risco que eu possa ter. Mas o pior é não fazer nada”, diz o diretor de educação da ABRH-Nacional.

Rosa cita a “hierarquia” porque, segundo ele, ir direto ao superior do chefe sem falar primeiro com este (o assediador), pode não ser uma boa saída. “Imagine se ele perguntar se você já falou com o seu chefe e você não falou. Vai te desarmar”, argumenta.

Ele observa que, além do diálogo travado pessoalmente, é recomendado que a vítima oficialize seu pedido por providências por escrito, protocolando uma carta para o chefe. O documento poderá ser útil caso, mais tarde, a pessoa venha a acessar a Justiça.

Entre em contato com o RH da empresa
A psicóloga e consultora Maria do Carmo Célico afirma que é sempre importante tentar esgotar todas as possibilidades de solução dentro da própria empresa antes de se pensar em procurar a Justiça.]

Entrar em contato com o departamento de recursos humanos pode ser uma saída. E, caso a pessoa esteja tendo dores de cabeça, crises de choro, problemas digestivos, insônia, aumento da pressão arterial, palpitações e tremores sem qualquer justificativa, é o caso de procurar o departamento médico da empresa ou um médico do trabalho conveniado.

Pode ser que já se esteja doente em decorrência do assédio moral, e um profissional da saúde do trabalho pode diagnosticar isso.

Procure diretamente o dono ou presidente da empresa
Se no âmbito das chefias o caso não for solucionado, o dono da empresa ou seu presidente podem ser acionados. Isso, claro, em se tratando de uma empresa de menor porte, em que o funcionário tenha acesso facilitado ao executivo.

Se a empresa for uma multinacional, por exemplo, a possibilidade é considerada por Rosa uma exceção, porém, mesmo assim, não descartável.

Faça um boletim de ocorrência
Ainda antes de partir para o acionamento da Justiça, a polícia pode ser procurada para a confecção de um boletim de ocorrência. Pode ser, por exemplo, uma delegacia da mulher.

“A polícia chama a pessoa acusada”, observa Rosa. E, a partir de uma conversa como esta, mais formal, o caso pode se resolver.

Procure a Defensoria do Estado
Por fim, se nenhum dos esforços anteriores funcionarem a contento da vítima, esta deve reunir toda a documentação e provas que tiver contra o assediador para acioná-lo judicialmente.

Se o assédio envolver discriminação, por exemplo, as defensorias públicas podem ser o canal. Em São Paulo, existe dentro da Defensoria do Estado um núcleo especializado no combate à discriminação, cujos contatos podem ser obtidos no site www.defensoria.sp.gov.br/dpesp.

Sutileza é o disfarce

De acordo com Luiz Edmundo Rosa, diretor de educação da Associação Brasileira de Recursos Humanos (ABRH-Nacional), alguns chefes são muito sutis, até tratam bem o trabalhador, mas no fundo atuam para desestimulá-lo e fazê-lo pedir demissão.

Da mesma forma há trabalhadores que, em razão de seu grau de sensibilidade, podem se sentir alvo de assédio o tempo todo porque não conseguem lidar com medidas um pouco mais rígidas por parte do chefe – medidas nem sempre caracterizadas como assédio.

Brasil ainda não tem uma lei federal para criminalizar o assédio moral

Luciana Quierati
Do UOL, em São Paulo

Existem vários projetos sobre assédio moral tramitando no Congresso Nacional, mas ainda não há no Brasil uma lei federal que o criminalize. O que já se tem aprovada nessa esfera é uma lei que veda empréstimos do BNDES (Banco Nacional do Desenvolvimento) a empresas que tenham prática de assédio moral.

Alguns Estados e municípios possuem legislação própria sobre o assunto. Em São Paulo, por exemplo, a lei 12.250, de 2006, veda o assédio moral no âmbito da administração pública estadual direta, indireta e fundações públicas, podendo o agressor ser punido com advertência, suspensão e demissão. Tais leis são tomadas como referência pelos juízes do trabalho para o julgamento de casos na casos na iniciativa privada.

No Rio Grande do Sul, a lei 12.561, também de 2006, prevê curso de aprimoramento pessoal para o agressor. Isso porque, segundo Edina Bom Sucesso, o agressor necessita de acompanhamento ou tratamento para entender quais as consequências de suas condutas.

“Independentemente da posição hierárquica, quer seja o chefe, quer sejam os colegas, eles precisam ser advertidos pela empresa se insistirem em condutas assediadoras”, afirma Edina.

Ela atenta, no entanto, ao fato de que muitas empresas são coniventes e até incentivam o assédio moral, propondo metas inatingíveis, exigindo o cumprimento de jornada excessiva de trabalho e humilhando quem não apresenta resultados. “Felizmente, a Justiça do trabalho vem aplicando multas significativas nestes casos”, comemora.

Para a psicóloga Maria do Carmo Célico, especializada em assédio moral no trabalho, as empresas devem colocar seus departamentos de recursos humanos a serviço da prevenção ao assédio moral.

“Rever políticas, avaliar os programas de desenvolvimento para lideranças levando em consideração as características individuais dos líderes, garantir oportunidades iguais. Isso irá promover um clima organizacional positivo, de cooperação, de prevenção, de produção e, consequentemente, de sucesso”, afirma.

Filmes com cenas de assédio moral no trabalho