Uma atividade menos aquecida e uma indústria em crise já começaram a causar consequências em Salvador: lá, o rendimento médio está hoje 10% menor que no ano passado, à revelia das garantias de governo e de economistas, e até mesmo dos números no resto do país, de que o mercado de trabalho continuará aquecido, o desemprego em baixa e a renda em alta.
O rendimento médio real na região metropolitana da capital baiana, que em março do ano passado era de R$ 1.602, chegou a R$ 1.431 em março deste ano, segundo a Pesquisa Mensal do Emprego do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O poder de compra vem caindo mês a mês desde julho do ano passado, quando embicou a curva de crescimento que registrava desde 2005, entre pequenas e esparsas oscilações. Na média dos 12 meses até março, o soteropolitano recebeu R$ 1.486 por mês, ou 4% menos que a média de R$ 1.548 dos 12 meses imediatamente anteriores.
Salvador é a única das seis regiões metropolitanas pesquisadas pelo IBGE que registra perdas – na média nacional, o trabalhador brasileiro ganhou R$ 1.855,40 em março, ou 0,56% mais que em igual mês ano passado.
Embora colabore para corroer os ganhos reais, a inflação não está no topo da lista de razões para a perda de poder de compra. Uma possível onda de desemprego menos ainda – em março, ainda segundo o IBGE, a desocupação da região metropolitana de Salvador chegou a 6,9%, a menor da série histórica para o mês de março, como aconteceu em todas as outras regiões. “O problema não é falta de postos, é pressão de uma parte maior da população que passou a procurar emprego”, explica Ana Simões, coordenadora da pesquisa de emprego do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos e Socioeconômicos (Dieese) em Salvador.
Segundo ela, no movimento contrário do que ocorreu na última década, observa-se desde 2012 um aumento no número de jovens, além de idosos, procurando emprego na capital, o que puxa a média salarial para baixo, já que são pessoas com menor qualificação ou preparação e que aceitam postos menores. “Os jovens, que estavam saindo do mercado de trabalho para ir estudar, agora estão voltando, e isso acontece justamente porque a renda está regredindo. Quando a renda da família cai, a tendência é que aquelas pessoas que não estavam no mercado de trabalho comecem a procurar emprego”, diz Ana. Em Salvador, o número de jovens de 15 a 17 anos trabalhando ou procurando emprego passou de 20 mil em março do ano passado para 33 mil neste ano, um aumento de 65%, enquanto no país houve uma queda de 3,8% nesta faixa para o período.
Gustavo Palmeira, analista técnico de emprego na Superintendência de Estudos Sociais e Econômicos (SEI) do governo da Bahia, ressalta a migração de trabalhadores da indústria – que tem os salários mais altos e vem demitindo bastante na região -, para outras áreas com rendimento mais baixo, como o comércio. Nos 12 meses até março, a indústria de transformação da Bahia já fechou 3,9 mil postos de emprego formais, segundo o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), embora o saldo do período seja de 22,6 mil novos empregos, puxados principalmente por serviços, construção e comércio. “Também tem diminuído o número de trabalhadores do funcionalismo público e o da população com carteira assinada, enquanto o total de funcionários sem carteira aumenta”, diz Palmeira. “É uma troca de ocupações que pagam salários melhores por outras com rendimentos mais baixos”, acrescenta.
A perspectiva, no entanto, é de uma melhora no quadro. Ana Jorgina, supervisora do escritório baiano do Dieese, lembra que ao menos os trabalhadores com carteira assinada continuam garantindo salários com ganhos reais – em 2012, 96,7% das negociações da Bahia recompuseram a inflação em 2%, na média -, e Palmeira, da SEI, aposta na atividade aquecida de fim de ano. “A nossa esperança é que os rendimentos parem de cair e se estabilizem no atual patamar a partir de maio. Depois, no segundo semestre, eles sempre tendem a aumentar”, disse. (JE)