Conselheiros temem desvio do FGTS para financiar compra de móveis e eletrodomésticos
A presidente Dilma Rousseff lança hoje no Palácio do Planalto o programa Minha Casa Melhor para turbinar o Minha Casa Minha Vida, que tem usado cada vez mais recursos do FGTS para conceder subsídios aos beneficiados. Agora, todas as famílias do Minha Casa terão acesso a uma linha de crédito de R$ 5 mil para financiar – com juros de 0,4% ao mês e prazo de pagamento de quatro anos -, a compra de móveis e eletrodomésticos. Integrantes do Conselho Curador do FGTS temem o uso indevido do dinheiro do fundo para bancar as despesas com o novo programa.
Haverá necessidade de o Tesouro Nacional entrar com recursos para equalizar a taxa de juros, o que significa ajudar os bancos oficiais a cobrir o custo da operação subsidiada.
O temor de que recursos do FGTS sejam usados no novo programa se justifica pelo histórico dos últimos anos. Segundo dados do Conselho Curador, desde março de 2012 o Tesouro Nacional segurou em caixa cerca de R$ 4 bilhões que deveriam ser repassados ao FGTS, relativos a receitas arrecadadas com o adicional de 10% do fundo pagos por demissões sem justa causa.
O governo também não está honrando sua contrapartida ao Minha Casa, e não repassa a parcela do Orçamento da União para ajudar a cobrir os subsídios feitos pelo FGTS.
Em 2012, de R$ 1,8 bilhão que o Tesouro deveria transferir, nada foi pago. Assim, o FGTS cobriu toda a parte subsidiada do programa que atende famílias de baixa renda – cerca de R$ 6,5 bilhões. Este ano, de R$ 1,8 bilhão, a União repassou R$ 500 milhões.
Segundo estimativas do governo, o Minha Casa Melhor pode envolver financiamentos acima de R$ 15 bilhões. O cálculo parte do princípio de que todos os três milhões de contemplados até hoje – 1,6 milhão de unidades entregues e outras 1,4 milhão contratadas – recorram à linha de crédito.
– O governo não está repassando ao FGTS as receitas arrecadadas com o adicional de 10% nas demissões. Ficou de pagar, mas não deu prazo. Além disso, não está complementando a sua parte na concessão de subsídios no Minha Casa. Só o FGTS está pagando a conta – afirmou ao GLOBO um integrante do Conselho, que prefere não se identificar.
– O governo está fazendo bondade com o chapéu dos outros – disse o presidente da Força Sindical, deputado Paulo Pereira da Silva (PDT-SP).
O governo também briga no Congresso para manter a cobrança da contribuição adicional de 10%, criada há 12 anos no chamado “acordão do FGTS”, para ajudar a pagar a correção dos planos econômicos (Verão e Collor I) nas contas vinculadas. Há um projeto na Câmara, aprovado pelo Senado, que elimina a contribuição, sob o argumento de que o valor devido aos trabalhadores foi pago. Mas o governo não abre mão dessa receita. A votação deve ocorrer em 3 de julho.
– O governo mantém a posição de manutenção dos 10%, a gente considera importante até para o caixa do FGTS – disse ontem o ministro Gilberto Carvalho (Secretaria Geral), ignorando o fato de que o governo está retendo essa receita no Tesouro desde março do ano passado.
Em 2012, perto das eleições, o governo aumentou o valor do subsídio do Minha Casa de R$ 23 mil para R$ 25 mil para unidades em Brasília, São Paulo e Rio. Esse valor é dado a fundo perdido às famílias, de acordo com a renda. O impacto da medida, aprovada pelo Conselho Curador, onde o governo tem maioria, é de cerca de R$ 2,3 bilhões até 2014.
Perguntado sobre a fonte de recursos para equalizar os juros baixos do Minha Casa Melhor, o Tesouro não se manifestou. Integrantes do Conselho Curador admitem não ser possível comprovar o uso direto dos recursos do FGTS no financiamento de eletrodomésticos e móveis. Mas alegam que o adicional dos 10% está indo para o caixa do Tesouro, ajuda na meta de superávit primário e pode ser usado indevidamente. Esse dinheiro não iria para a conta individual dos trabalhadores; ajudaria a compor o patrimônio do FGTS.