O Superior Tribunal de Justiça (STJ) deu ganho de causa aos poupadores, ontem, ao julgar dois recursos de bancos para discutir a incidência de juros de mora sobre ações civis públicas que tratam da correção monetária da poupança durante os planos econômicos. Em um julgamento apertado, o tribunal entendeu que os juros se aplicam a partir da citação dos bancos nas ações civis públicas, e não a partir da execução individual da sentença, que ocorre posteriormente.
As ações dos bancos negociadas na Bovespa caíram fortemente no fim do pregão, em especial os papéis do Banco do Brasil, que teve ontem seu recurso negado pelo STJ, ao lado do HSBC. Não há desembolso imediato, mas estimativa do Banco Central sugere que a fatura para os bancos, a depender de outras variáveis, pode chegar a R$ 341 bilhões.
A decisão configura um dos piores cenários imaginados pelas instituições financeiras, segundo fontes ouvidas pelo Valor, pois funciona como um multiplicador de possíveis perdas. Os bancos também aguardam julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a constitucionalidade dos planos econômicos das décadas de 1980 e 1990 – a retomada do julgamento está prevista para 28 de maio.
A discussão de ontem, no STJ, se restringe a ações civis públicas que já contam com decisão definitiva da Justiça em favor dos poupadores, e por isso não podem mais ser revertidas pelo STF. A Corte Especial, formada pelos 15 ministros mais antigos do STJ, entendeu que os juros de mora se aplicam a partir da citação dos bancos.
Nos dois casos julgados ontem, os juros incidirão a partir de 1993, quando o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) entrou com as ações contra o Banco do Brasil e o Bamerindus, hoje sucedido pelo HSBC. As duas decisões se tornaram definitivas, em favor dos poupadores, em 2009 – segundo o Idec, no caso do Banco do Brasil, isso ocorreu em outubro daquele ano, e no caso do HSBC, em agosto. A partir daí, poupadores têm cinco anos para se habilitar no processo coletivo e pedir para receber os valores.
As ações se referem especificamente ao Plano Verão (janeiro de 1989). Assim, o Idec anunciou, depois do julgamento, que poupadores dos dois bancos que tinham contas de poupança naquela época, no Brasil inteiro, ainda podem ingressar nos processos.
Os bancos, porém, ainda questionam na Justiça a abrangência territorial dessas duas ações. O HSBC já entrou com 12 recursos contra a decisão condenatória no mérito. Em um deles, pede que a sentença só tenha validade na cidade de São Paulo. Já o Banco do Brasil tenta que a condenação só beneficie poupadores do Distrito Federal. Os bancos também temem a multiplicação de ações que usam extratos fraudulentos.
O diretor jurídico do Banco do Brasil, Antonio Machado, disse que a instituição vai avaliar os recursos cabíveis contra a decisão do STJ. Mesma postura externada pelo sub-procurador-geral do BC, Erasto Villa-Verde de Carvalho Filho, que durante o julgamento apontou que a decisão teria implicações não só para o sistema financeiro mas também sobre toda a economia do país.
As instituições financeiras queriam que os juros só fossem cobrados a partir da execução individual da sentença, ou seja, o momento em que os poupadores ingressarem individualmente nas ações para receber os valores. A defesa das instituições alegou que, antes disso, não é possível saber quanto se deve, nem para quem – já que as ações coletivas não nomeiam os beneficiários.
Os poupadores afirmaram que não se pode criar dois tipos de juros, um para o cidadão e outro para os bancos. Também disseram que, se fosse acatado o argumento dos bancos, o propósito das ações civis públicas seria extinto. Durante a discussão, alguns ministros alertaram para o risco de “morte” da ação civil pública caso prevalecesse o pedido dos bancos.