Bens de capital, aço e autopeças pedem proteção judicial

Mais uma empresa do setor de equipamentos e serviços para infraestrutura, com atuação forte em óleo e gás e energia, entrou com pedido de recuperação judicial

Dois meses depois de a Jaraguá Equipamentos ter alegado dificuldades no mercado de óleo e gás ao fazer o seu pedido de recuperação, no fim de junho, com dívida próxima de R$ 500 milhões, a Inepar fez o mesmo na última sexta-feira. A dívida da empresa, que também atua em transporte metroferroviário, é de aproximadamente R$ 2 bilhões.

Entre as principais razões para a situação crítica de seus balanços, as empresas citam problemas no setor de óleo e gás, com dificuldades com a Petrobras, a desaceleração da economia brasileira, a falta de investimentos em infraestrutura e a concorrência com equipamentos chineses.

O setor de máquinas e equipamentos vem sofrendo nos últimos dois anos com a falta de investimentos produtivos no país. Nos primeiros sete meses de 2014, o faturamento do setor caiu 14,5% em relação ao mesmo período do ano passado, somando R$ 40,1 bilhões, segundo a Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq). A associação vem citando entre os segmentos mais problemáticos o de óleo e gás e de indústria de base, que são os mercados da Inepar e da Jaraguá.

Também em dificuldades, a fabricante de aerogeradores Wind Power Energia, subsidiária da argentina Impsa, chegou a ter sua falência decretada em agosto. Dias depois, porém, após acordo com seu credor, o grupo Libra, a decisão foi revogada.

Em outros setores da indústria pesada, há ao menos outros dois exemplos recentes de companhias que recorreram à recuperação judicial alegando o fraco desempenho de seus setores e da economia brasileira. Em agosto, as siderúrgicas Cisam e Ciafal informaram falta de acordo com bancos credores e dificuldades no setor. As duas companhias fabricam aços longos comerciais e especiais e somam endividamento de R$ 200 milhões. Quatro meses antes, a Sifco, fabricante de peças para ônibus e caminhões, mencionou também a crise financeira global de 2008 como origem de seus problemas, que se agravaram como “resultado da desaceleração econômica”.

Segundo levantamento feito para o Valor pela Boa Vista SCPC, foram registrados 572 pedidos de recuperação judicial no Brasil de janeiro a agosto deste ano, sendo 188 – ou 33% do total -, de empresas industriais. Em relação ao mesmo período de 2013, o número de pedidos cresceu 5% na indústria e 7% no total.

Com 8.300 funcionários, a Inepar disse em documento enviado à Comissão de Valores Mobiliários (CVM) que a Petrobras é uma das razões de suas dificuldades. A companhia controla a IESA Óleo & Gás e afirma que o setor foi “seriamente afetado nos últimos quatro anos pela crise financeira da Petrobras”, sem destacar a qual crise se refere. A Inepar diz que a estatal também afetou outra de suas empresas, a IESA Equipamentos, Projetos e Montagens, que produz equipamentos para prospecção e refino de petróleo. A área de óleo e gás é responsável por aproximadamente 60% do faturamento da companhia.

Com receita bruta de R$ 1,1 bilhão em 2013, 11% menos do que o valor do ano anterior, a companhia já vinha citando em seus balanços a dificuldade de financiamento de capital de giro, com “drástica diminuição dos volumes de crédito”.

A Inepar afirma também nos seus últimos relatórios trimestrais estar em negociações com o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDES), seu principal credor, para reestruturação de sua dívida. Dos R$ 2 bilhões de seu endividamento, ao menos R$ 800 milhões são devidos ao banco de fomento. Aproximadamente R$ 450 milhões são referentes a dívidas fiscais, segundo apurou o Valor.

Procurado, o banco não comentou o assunto. Segundo fontes, o BNDES é credor da Inepar desde a década de 1990, com diversas operações pequenas sobre as quais vem incidindo juros e mora. Os contratos estão provisionados desde então e, por isso, não chegam a afetar o banco de fomento. Além de credor, o BNDES é acionista da Inepar, com 4,5% do capital da Inepar Industria e Construções, que reúne as companhias operacionais da holding Inepar Administração e Participações (IAP).

Também está entre os credores da companhia o banco Santander, mas com uma quantia muito inferior, menor do que R$ 10 milhões.

A Inepar já vinha tentando se reestruturar desde o ano passado para tentar evitar a recuperação judicial. Chegou a contratar o Morgan Stanley e o escritório Lefosse para organizar seus ativos de óleo e gás. Há quatro meses, contratou o Brasil Plural para fazer um diagnóstico de suas operações. Agora, Warley Pimentel, um dos sócios do banco de investimento, assume a presidência da empresa por tempo indeterminado, substituindo Cesar Romeu Fiedler. O empresário paranaense Atilano de Oms Sobrinho, um dos principais acionistas da IAP e presidente do Conselho de Administração, fica afastado da gestão.

Procurada, a nova direção da companhia não quis se pronunciar sobre o pedido de recuperação e o plano que será apresentado ao juiz. Em nota, diz que o banco de investimentos foi contratado para definir e implementar um plano de reestruturação para a companhia, que incluirá “transformação da governança corporativa, otimização do quadro de gestão, maximização do potencial industrial, venda de ativos e a busca de novos sócios estratégicos”. Uma de suas primeiras providências, segundo a nota, é discutir com clientes, credores e sócios “alternativas para a preservação de valor e estabilidade das operações da empresa”.

Assim que o processo de recuperação judicial for aprovado, a companhia terá 60 dias para apresentar seu plano. Segundo uma fonte próxima da empresa, está prevista a venda de ativos e até operações que não façam parte das áreas prioritárias. Continuam no foco da empresa os negócios que concentram projetos de infraestrutura, óleo e gás e energia, incluindo a fabricação de turbinas de hidrogeração.

Entre as operações que ficam sem definição com o processo de recuperação judicial está o acordo com a Andrade Gutierrez envolvendo o estaleiro da Iesa Óleo e Gás, em Charqueadas (RS), que tem contrato para fornecer módulos de compressão de gás para plataformas tipo FPSO (unidades flutuantes de produção, armazenamento e descarga) da Petrobras. O contrato, inicialmente previsto em US$ 720 milhões, estava para ser assinado nas últimas semanas, mas a definição dos detalhes será retomada assim que evoluírem as questões relacionadas com a recuperação judicial, segundo o Valor apurou.