Por oito votos a dois, o plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu ontem que os trabalhadores só podem requerer na Justiça depósitos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) dos últimos cinco anos. O prazo para entrar com o processo trabalhista é de dois anos.
Até então, a jurisprudência do Supremo e do Tribunal Superior do Trabalho (TST) determinava que o trabalhador podia discutir os últimos 30 anos. O prazo está na Súmula nº 362 do TST e no artigo 23 da Lei nº 8.036, de 1990, que trata do FGTS.
Para o ministro Gilmar Mendes, relator da ação analisada ontem, entretanto, os dispositivos contrariam a Constituição, que fixa o prazo de cinco anos. A disposição está no artigo 7º, que elenca como direito dos trabalhadores a “ação, quanto aos créditos resultantes das relações de trabalho, com prazo prescricional de cinco anos”. A Constituição também traz o marco de dois anos para propositura da ação.
“Tendo em vista a existência de disposição constitucional expressa, não mais subsistem as razões anteriormente invocadas para prazo de prescrição trintenário”, afirmou Mendes durante o julgamento.
O ministro Luís Roberto Barroso, que acompanhou o relator, considerou que o período de trinta anos, por ser muito extenso, incentivaria o ajuizamento de ações. “O prazo de trinta anos me parece excessivo e desarrazoado, o que compromete o princípio da segurança jurídica”, disse Barroso.
Com a redução do prazo, Mendes optou por modular os efeitos da decisão tomada ontem. Pela proposta, aplica-se o prazo de cinco anos a partir da decisão do Supremo. Por outro lado, segundo o voto do ministro, “para os casos em que o prazo prescricional já esteja em curso, aplica-se o que ocorrer primeiro: 30 anos, contados do termo inicial, ou cinco anos, a partir desta decisão”.
Único ministro a se posicionar de forma contrária à modulação, Marco Aurélio considerou que a medida incentiva o desrespeito à Constituição. “Toda vez que Supremo modula [os efeitos de uma decisão] incentiva a criação de leis à margem da Constituição”, afirmou.
A possibilidade de aplicação do prazo de trinta anos foi defendida por dois ministros. Teori Zavaski e Rosa Weber entenderam que o disposto na Constituição não impede a criação de leis que concedam prazos mais benéficos aos trabalhadores. “Nada impede que contratualmente, na negociação coletiva ou em legislação infraconstitucional outros direitos sejam estabelecidos”, disse Rosa.
A magistrada ainda destacou que o prazo não incentivaria a abertura de processos, já que o trabalhador tem apenas dois anos após fim do contrato de trabalho para ajuizar a ação.
O caso analisado ontem envolve uma ex-funcionária do Banco do Brasil, que requeria o FGTS não depositado entre maio de 2001 e dezembro de 2003. Por conta da modulação, ela terá o pedido inteiramente atendido.
Para o advogado da ex-funcionária, Paulo Roberto Alves da Silva, a decisão não será uma derrota aos trabalhadores “desde que haja mais fiscalização e penalidades mais graves” às empresas que não depositam o FGTS de seus funcionários.
A advogada Juliana Bracks, do escritório Bracks & von Gyldenfeldt Advogados Associados, entendeu, porém, que a decisão é um estímulo ao descumprimento do depósito pelas empresas. Segundo ela, esse prazo diferente para o FGTS tem uma razão histórica. O benefício foi criado em 1967 depois de uma negociação para acabar com a estabilidade de emprego de dez anos.
Naquela época, o FGTS era optativo. As empresas podiam recolher o benefício ou manter a estabilidade. O trabalhador só podia ser demitido por justa causa. Com a Constituição de 1988, a contribuição ao FGTS tornou-se obrigatória e a estabilidade foi extinta. “Com esse julgamento, estão jogando por terra a substituição feita lá atrás”, disse. (Colaborou Adriana Aguiar)