Conjuntura: Entre janeiro e maio, 30,5% das pessoas que se desligaram das empresas pediram demissão
João Villaverde, de São Paulo
Nos primeiros cinco meses deste ano, dois recordes mudaram o padrão do mercado de trabalho brasileiro. De janeiro a maio, 30,5% das pessoas desligadas pediram demissão, percentual bem acima do auge anterior, de 26%, registrado em 2008. A troca de emprego por decisão do trabalhador levou a outra mudança inédita – a redução dos pedidos de seguro-desemprego para o menor nível em dez anos.
Levantamento realizado pelo Valor com dados do Ministério do Trabalho mostra que os resultados de 2010 são mais expressivos que os de 2008, quando o ciclo de crescimento econômico iniciado em 2004 alcançou seu auge. Dos trabalhadores com carteira assinada que deixaram seus empregos entre janeiro e maio de 2008, o equivalente a 23,8% o fizeram por conta própria. A proporção despencou no ano seguinte, quando, em igual período, representaram 16% dos desligados de suas funções. O recorde anterior (26%) foi atingido no período entre junho e outubro de 2008, logo antes da explosão dos efeitos da crise mundial sobre a economia brasileira.
A contrapartida do aumento das demissões por decisão do trabalhador é o aumento da taxa de rotatividade no emprego formal, que nunca foi tão alta em um início de ano. O indicador construído pelo Ministério do Trabalho mensura quantos trabalhadores foram substituídos em uma empresa ou setor no mês em análise. A rotatividade oscila, desde 2005, em torno de 3,6% ao mês. No primeiro trimestre de 2008, o indicador chegou a atingir média de 4,07. Em igual período deste ano, a média foi maior e o resultado mensal de junho, 4,10 pontos, é o maior para o mês desde 2005 (ver gráfico).
A rotatividade, em geral, decorre da decisão das empresas de trocar seus funcionários, seja por inadequação de um recém-contratado, seja pela oportunidade de contratar um funcionário mais qualificado, seja para reduzir o custo total da folha de salários, substituindo remunerações mais altas por outras menores. Os dados de 2010 indicam que, neste ano, a taxa está aumentando também por decisão dos trabalhadores, que provavelmente encontraram um emprego melhor ou com maior remuneração. Por isso, ela ajuda a reduzir a demanda por seguro-desemprego.
“Numa época de expansão econômica, como a que vivemos hoje, é normal que parcela maior dos desligamentos seja motivada por pedidos de demissão, uma vez que o trabalhador encontra salários maiores. A empresa, que perde o funcionário, vai atrás de outro, e assim sucessivamente. A taxa de rotatividade aumenta e a demanda por seguro-desemprego diminui”, afirma Hélio Zylberstajn, presidente do Instituto Brasileiro de Relações de Emprego e Trabalho (Ibret). Zylberstajn, que também é professor da USP, avalia que o processo é “altamente pró-cíclico”, uma vez que depende do aquecimento econômico. “Em momentos de baixa, ninguém quer sair do emprego, então os pedidos de demissão diminuem”, diz.
A menor disposição para pedir seguro-desemprego, no entanto, é inédita, ainda que o ritmo de crescimento da economia hoje seja semelhante ao de anos como 2007 e 2008, quando o PIB passou por elevações de 6,1% e 5,1%, respectivamente. Naquele biênio, a proporção de trabalhadores que solicitaram o benefício em relação aos que foram dispensados sem justa causa variou entre 87,2% e 77,3%.
De janeiro de 2005 para cá, contando os resultados recordes de 2010, a média dessa relação foi 81,3%. À exceção de janeiro, quando a relação entre requerentes e demitidos sem justa causa obteve valor igual à média histórica, todos os outros meses de 2010 tiveram resultados inferiores à barreira dos 80% – saindo de 78% em fevereiro para 71% em abril, chegando a derreter em maio, quando atingiu o vale de toda a série, 57,9%.
Para Sérgio Mendonça, assistente da coordenação do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), o resultado recorde de 2010 na comparação com outros períodos de atividade aquecida pode estar condicionada ao aumento da taxa de rotatividade além da média histórica. “Mesmo aqueles que são demitidos não requerem o seguro-desemprego, porque logo conseguem outro trabalho”, diz ele.
Além disso, avalia Mendonça, “como a rotatividade está muito alta, muitos não conseguem permanecer no emprego pelo tempo determinado em lei para assegurar o seguro”. Para acionar o seguro-desemprego junto ao Ministério do Trabalho é preciso ter ao menos seis meses de vínculo empregatício com carteira assinada.
Segundo João Saboia, diretor do Instituto de Economia da UFRJ, a demanda por benefícios do seguro-desemprego deve continuar em patamares rebaixados até o fim do ano. “Entramos agora no melhor momento do mercado de trabalho brasileiro, que é o período entre agosto e novembro”, diz Saboia, para quem a taxa de desemprego continuará caindo e a rotatividade aumentando. “Se você pode ganhar mais porque outra empresa está oferecendo salários maiores, você não vai se agarrar ao emprego no qual está agora”, afirma.