Por um código de autorregulamento do movimento sindical

foto_toninho_diap O movimento sindical precisa urgentemente elaborar um código de autorregulação com  recomendações de boas práticas e respeito aos princípios da moralidade, da ética, da transparência,  da participação e da prevalência do interesse público e dos trabalhadores. Seria uma forma eficaz de  responder aos ataques da série de reportagens de O Globo, que optou por desqualificar as  organizações de trabalhadores, quando sabemos que nas entidades patronais existem coisas até  piores.

 

A instituição movimento sindical, como instrumento de defesa dos direitos e interesses da coletividade, em geral, e da classe trabalhadora, em particular, é um dos pilares da democracia e dispõe de uma série de poderes e prerrogativas que a credencia como um ator relevante no cenário político, econômico e social do País. Entre esses poderes e prerrogativas das entidades sindicais, destacam-se: a) o poder de estabelecer ação regulatória por via dos instrumentos normativos; b) a força de restringir ou condicionar a liberdade patronal na contratação e definição de condições de trabalho; c) a garantia de autotutela do próprio interesse; d) o reconhecimento de certo poder extralegal, como os fixados em acordos e convenções coletivas que celebra, os quais têm força de lei; e) o poder de atuar como substituto processual; e f) a prerrogativa de ingressar no Supremo Tribunal Federal com Ação Direta de Inconstitucionalidade.

A continuidade dessas garantias depende de credibilidade e legitimidade de seus dirigentes, cuja missão é representar, organizar, mobilizar, defender os direitos, os interesses e educar o trabalhador para a cidadania. E estabelecer e recomendar boas práticas no exercício dos poderes e prerrogativas legais e extralegais é condição indispensável para sua preservação.

O eventual código de auto regulação poderia recomendar, entre outras condutas, por exemplo: i) a ampliação dos espaços de diálogo e participação dos trabalhadores nas entidades sindicais; ii) a realização frequente de campanhas de filiação; iii) a promoção de programas de formação e qualificação da base, em geral, e dos militantes, em particular; iv) campanhas e ações para aguçar o sentido de solidariedade, consciência política e cidadã da base; v) o respeito à capacidade contributiva dos trabalhadores no momento de instituir taxas além da associativa, com limites em relação à remuneração; viii) fixação de remuneração de dirigentes, quando paga pela entidade sindical, compatível com a realidade de mercado e das finanças da organização sindical, bem como a vedação de qualquer tipo de nepotismo; ix) a prática de abertura de processos de afastamento, com direito de defesa, de dirigentes que negligenciem a representação e defesa dos direitos e interesses dos trabalhadores; x) transparência na prestação de contas regulares; xi) processo eleitoral democrático, com eleições periódicas e livres; e xii) duração de mandato não inferior a dois nem superior a cinco anos, proibida a prorrogação de mandato, além de número de dirigentes e representantes sindicais proporcional ao tamanho da categoria.

Esse conjunto de sugestões às bases, certamente contribuiria para aumentar a legitimidade e, sobretudo, a representatividade sindical. E a representatividade se mede, entre outros fatores: a) pela taxa de sindicalização; b) pelo número de convenções e acordos assinados proporcionalmente ao número de empresas na base; c) pela capacidade de mobilização; e d) pela ocorrência de greves; e) pela postura da imprensa da entidade frente ao governo e patrões.

Algumas das medidas sugeridas, que poderão ter outro conteúdo e não devem se limitar às mencionadas, poderiam implicar mudança estatutária, porém a maioria depende mais de mudança cultural, de postura e de comportamento das lideranças e dirigentes sindicais, do que de mudança legal ou institucional.

Por fim, registre-se que o movimento sindical está entrando numa fase de resistência e nesse novo momento só sobreviverá quem atuar em conformidade com alguns daqueles princípios. Se ficar omisso ou alheio aos alertas deste texto, a tendência é que haja um processo natural de depuração, com a própria base se encarregando de denunciar a apatia, o imobilismo ou a ausência de democracia e compromisso com os trabalhadores nas entidades.

Antônio Augusto de Queiroz é jornalista, analista político, diretor de Documentação do Diap.
E-mail: toninho@diap.org.br