Arnaldo Niskier
É conhecida a dificuldade do governo federal para fazer o seu ajuste fiscal. Em meio a essa confusão toda, até propostas estapafúrdias acabam sendo feitas, como é o caso de sequestrar os recursos financeiros do Sistema S, o conjunto de nove instituições de interesse de categorias profissionais.
Até há pouco, falava-se em prestigiar o Pronatec (Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego). Anunciava-se um programa de 12 milhões de técnicos. Depois, o número baixou consideravelmente, mas com a política de despir um santo para vestir o outro.
Retirar R$ 8 milhões do Sistema S e colocar nas contas baleadas do governo é condenar entidades beneméritas como o Senac, o Senai, o Senar, o Sesc, o Sesi, o Sebrae, a ABDI (Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial) e a Apex-Brasil (Agência Brasileira de Exportação e Investimentos) a praticamente fechar as portas, como algumas chegaram mesmo a anunciar.
Só o Sesc estima perder cerca de 27 mil funcionários, além de inviabilizar o atendimento de 200 mil alunos no Rio de Janeiro. No caso do Sebrae, o corte programado, se vier a ser confirmado, pode levar a entidade a cobrar pelos seus serviços ou reduzir o número de 8 milhões de microempresários atendidos por ano. É possível imaginar o tamanho desse prejuízo?
A se confirmar a crise, será a maior dos mais de 70 anos de existência do Sistema S, nascido na década de 1940, quando Gustavo Capanema era ministro da Educação. Foi autor das célebres e consagradas Leis Orgânicas do Ensino Industrial e do Ensino Comercial, até hoje vigentes.
A prova da competência do Senai, por exemplo, pode ser medida pelo fato de mais de 60% dos seus alunos estarem empregados, mesmo com a elevada retração do mercado. A entidade, nos 1.008 cursos que oferece, forma aproximadamente 90 mil alunos por ano em 30 segmentos industriais.
Só mesmo um gênio do mal para mexer no setor, provocando a reação indignada de dirigentes como Paulo Skaf, presidente da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo). Os números do Senai, por exemplo, são espetaculares: 3,64 milhões de matrículas no ano passado, dos quais 1 milhão ministrados na modalidade do ensino à distância. Já o Sesi formou 217 mil jovens e adultos.
Com essa absurda intervenção do governo federal, uma hipótese provável seria passar a cobrar pelos cursos, mas não há dúvida de que isso representaria um baque nas matrículas. É a fórmula encontrada de prestigiar o que entendemos por ensino profissional?
A se confirmar a pretensão oficial, haverá uma série de perdas nos programas hoje vigentes de educação –sobretudo a construção de creches–, saúde, cultura e esporte.
Haverá uma drástica redução de matrículas e a possível perda de gratuidade nos cursos profissionais do Senac. Enfim, uma queda considerável de substância, como se pudéssemos nos dar ao luxo dessa perda inoportuna.
ARNALDO NISKIER, 80, é membro da Academia Brasileira de Letras e presidente do CIEE (Centro de Integração Empresa-Escola) no Rio de Janeiro