Imposto que mais subiu pesa sobre os mais pobres

É o que avaliam tributaristas, ICMS é um dos que mais pressionam a inflação, avaliam especialistas.

Levantamento do G1 mostra alíquotas maiores em 20 estados mais DF.

Taís Laporta
Do G1, em São Paulo

De todos os tributos que subiram em 2016, o Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) é o que mais recai sobre a população de baixa renda e pressiona a inflação, avaliam tributaristas ouvidos pelo G1. As alíquotas do tributo foram as que mais aumentaram no país, com mudanças em 20 estados mais o Distrito Federal, mostrou um levantamento em todo o Brasil.

“Tributos sobre o consumo como o ICMS e o IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) são os que mais pressionam a inflação, porque eles elevam o custo das empresas, que não têm margem para absorver a cobrança e sempre repassam esse ônus para o consumidor”, avalia o tributarista do escritório Miguel Silva & Yamashita Advogados, Miguel Silva.

O ICMS é cobrado sobre tudo o que se consome no país – de produtos e serviços essenciais, como a energia elétrica e telecomunicações, aos mais supérfluos, como cosméticos, bebidas alcoólicas e cigarro.

É conhecido pelo “efeito cascata”, já que incide sobre todas as etapas de produção e comercialização até chegar ao consumidor. Assim, quem compra um pão na padaria paga no preço a alíquota do tributo, já com os repasses dessa cobrança feito pelo produtor da farinha de trigo, pelo distribuidor e pelo comerciante.

A alíquota é o percentual usado para calcular quanto o contribuinte vai pagar de imposto sobre o valor, em reais, do que ele consome. Cerca de 50% da arrecadação no Brasil é sobre o que se compra.

O CEO da Sevilha Contabilidade, Vicente Sevilha Junior, explica que o consumidor paga o ICMS sem perceber, porque ele já está embutido nos preços, junto a outros impostos. “Toda vez que o ICMS aumenta, o comerciante ou fabricante repassa para o preço das mercadorias e paga ao governo com o dinheiro do consumidor”, diz.

Inflação
O presidente-executivo do IBPT, João Eloi Olenike, explica que os estados são obrigados por lei a priorizar o aumento de impostos sobre os itens considerados mais supérfluos – como artigos de luxo ou os prejudiciais à saúde – e poupar os essenciais, que não podem ser cortados do orçamento familiar.

O tributarista do Miguel Silva & Yamashita, por sua vez, pontua que cada governante faz sua própria interpretação do que é supérfluo e essencial, já que não existe uma definição. “O efeito sobre a inflação é maior quando se aumenta as alíquotas de produtos e serviços essenciais”, diz.

O estado de Minas Gerais, por exemplo, aumentou a alíquota de ICMS sobre a energia elétrica e as telecomunicações – serviços utilizados por praticamente todas as faixas de renda. No Distrito Federal, a alíquota sobre a TV por assinatura subiu de 10% para 15%.

Outros estados, contudo, aumentaram apenas sobre o que consideram supérfluo. Em Alagoas, o governo preferiu elevar somente as alíquotas de mercadorias que “estimulem a violência infantil”. No Ceará, o aumento recaiu sobre fogos de artifício, bebidas alcoólicas e armas de fogo. Em Mato Grosso do Sul, subiram as alíquotas de perfumes, cosméticos e refrigerantes.

Por que o pobre paga mais
Na visão do tributarista Yamashita, tributos como o ICMS e o IPI, quando elevados, penalizam mais a camada pobre da população, que recebe os salários mais baixos. “A elevação desses impostos acaba tendo um efeito de injustiça social”, define.

Ele dá um exemplo. Se a alíquota do ICMS sobre a conta de luz sobe de 20% para 30%, o contribuinte mais pobre que recebe um salário de R$ 1000 e consome R$ 100 em energia vai pagar R$ 10 a mais de ICMS do que pagava anteriormente – o equivalente a 1% de seu salário.

Quem recebe R$ 20 mil e consome R$ 300 de conta de luz passar a pagar, com esse aumento da alíquota, R$ 30 a mais de ICMS no mês. “Isso representa apenas 0,0015% do salário dessa pessoa de renda mais alta. Portanto, o pobre paga muito mais em proporção ao seu salário”, explica Silva.

Em 2014, o Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT) divulgou um estudo mostrando que os brasileiros com renda até três salários mínimos contribuem com a maior fatia dos impostos pagos no país. De acordo com a pesquisa, essa parcela da população paga 53,79% do total de impostos arrecadados. O grupo, no entanto, representa 79% do total de brasileiros.

Consumo, renda e propriedade
Para reverter essa tendência, acredita o tributarista, o ideal seria priorizar o aumento de impostos sobre a renda e propriedade, como o Imposto de Renda e sobre herança.

Em 2016, os impostos sobre renda e propriedade subiram em menos estados que o ICMS. No caso do IPVA (sobre veículos), a alíquota subiu em 12 estados, mais a capital federal, e do imposto sobre herança e doações – conhecido como ITCMD – houve aumento em 10 estados e no Distrito Federal.

Na visão de Silva, os governos optaram por aumentar os tributos do consumo porque eles são mais efetivos em volume de arrecadação. Isso se traduz, por exemplo, ao comparar quantas transferências de herança são feitas por dia, em relação à quantidade de aquisições de pão com manteiga, por exemplo.

“Esses impostos do consumo garantem uma velocidade de arrecadação maior e facilitam o controle da arrecadação, já que o risco de sonegação é muito menor se comparado a outros impostos, por estarem embutidos nos preços”, diz.

Tem o mesmo efeito da Contribuição Provisória sobre Movimentações Financeiras (CPMF) – que foi extinta em 2007, mas que pode ser recriada pelo governo para cobrir os buracos na arrecadação.

Carga tributária
Silva acredita que, com o aumento generelizado dos impostos, a carga tributária que em 2014 ficou em quase 34% do PIB pode subir para entre 36% e 37% do PIB. É um patamar semelhante ao de países desenvolvidos como Suécia (42,8%), Finlândia (44%), Bélgica (44%), França (45%) e Dinamarca (48,6%).

Por outro lado, o Brasil segue na última colocação no ranking que mede o retorno oferecido em termos de serviços públicos de qualidade à população em relação ao que o contribuinte paga em impostos. Segundo o estudo divulgado nesta segunda-feira (1) pelo Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT), o país ficou pela 5ª vez seguida na “lanterninha” da lista.

Brasil tem o IR menor
Um levantamento da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) de setembro mostrou que osbrasileiros pagam menos imposto sobre a renda que a média dos países da entidade.

Enquanto aqui a alíquota máxima é de 27,5%, nos 30 países que fazem parte da organização – a maioria considerados desenvolvidos – a média é de 41,58%. Levantamento da consultoria KPMG mostra que o país cobra também menos que a média da América Latina (31,87%), União Europeia (33,78%) e América do Norte (34,3%).

Mas a carga tributária no país – a soma de todos os impostos pagos pelos cidadãos e empresas em proporção ao Produto Interno Bruto (PIB) – segue há anos acima da média da OCDE e de diversos países desenvolvidos e em desenvolvimento. Isso porque o  Brasil tem uma carga maior de impostos indiretos, ou seja, embutidos nos produtos ou serviços.