Analítica
A decisão foi tomada após os relatos de trabalhadores e sindicalistas americanos sobre a postura antissindical da montadora durante audiência pública no Senado
Brasília – Frente aos relatos fortes feitos pelos trabalhadores da Nissan nos Estados Unidos, por entidades sindicais internacionais e nacionais sobre a política antissindical adotada pela Nissan no Mississipi (EUA), o senador Paulo Paim (PT-RS) deu uma resposta rápida. Nos próximos dias, ele entrará em contato com o presidente da Aliança Renault-Nissan, Carlos Ghosn, para impulsionar o início do diálogo da empresa com trabalhadores.
Do embaixador Agemar Sanctos, diretor do Comitê Organizador Rio 2016, Paim vai querer saber que medidas serão tomadas com relação às denúncias sobre as más práticas do patrocinador automotivo do evento. Se não obtiver nenhuma resposta positiva, Paim comprometeu-se a ir ao Mississipi para ajudar da construção do diálogo entre capital e trabalho. “Ninguém é contra a empresa, mas queremos que os trabalhadores tenham liberdade de expressão e de organização sindical”, disse o senador.
Esse foi o resultado da audiência pública que aconteceu nessa segunda-feira (11) no Senado Federal. Executivos da Nissan e o embaixador Agemar Sanctos preferiram evitar a exposição pública e não compareceram ao evento. A ausência não chegou a ser uma surpresa.
Durante quatro horas, entidades sindicais brasileiras e internacionais manifestaram indignação com a campanha antissindical em marcha no Mississipi, que tem ganhado fôlego nos últimos meses. No Brasil, a montadora é a única patrocinadora automotiva dos Jogos Olímpicos Rio 2016, mas não respeita o código que estabelece critérios para patrocinadores e fornecedores do evento. Os sindicalistas brasileiros disseram que a solidariedade entre os trabalhadores do hemisfério sul e norte será não apenas mantida, como também ampliada.
Carlos Albino, presidente do sindicato dos Metalúrgicos de Catalão (SIMECAT), contou que o embaixador Sanctos foi muito receptivo no momento da entrega da carta-denúncia contra a Nissan, que ocorreu no dia 18 de fevereiro, mas até agora não deu resposta alguma. “Não vamos ficar quietos, nem que para isso tivermos que fazer mobilizações durante o passeio da tocha olímpica pelo país”, disse. Todos os sindicalistas esclareceram que não são contra as Olimpíadas, mas não aceitam que a Nissan se beneficie da publicidade do evento enquanto desrespeita os trabalhadores. Marino Vani, secretário para América Latina Sindicato Global IndustriALL, define a política da Nissan como anti-democrática e diz que esta que colide com o significado da tocha olímpica. “Ela simboliza uma competição justa, jogos limpos e equilibrados, o oposto do tratamento que a Nissan no Mississipi tem dado os trabalhadores”.
Kristyne Peter, diretora de Relações Internacionais da United Auto Workers (UAW), explicou que existe um movimento global para evitar ou enfraquecer os sindicatos. São empresas contratadas pelas montadoras, que atuam em 40 países, para impulsionar mudanças legais e inviabilizar a ação sindical que defende a proteção do trabalhador. “Mais cedo ou mais tarde estas empresas de consultoria chegarão no Brasil”, alertou Peter.
O relato da metalúrgica Betty Jones dos movimentos da Nissan para frear a organização sindical captou a atenção total dos participantes da audiência. No caso específico da Nissan no Mississipi, antes mesmo da fábrica começar a funcionar, os diretores deram iniciou à campanha antissindical. Sindicatos e comitês comunitários têm insistido na necessidade do diálogo, mas a empresa se nega a recebê-los. Em vez disso, a Nissan tem procurado identificar e “marcar” os trabalhadores favoráveis à organização sindical.
A postura da Nissan tem sido adotar uma campanha insistente contra os sindicatos. Vídeos são exibidos nos três turnos de trabalho e reuniões em pequenos grupos são chamadas para desestimular os trabalhadores à organização sindical. Durante a audiência pública dois filmes foram mostrados. Um deles apenas reproduziu as mensagens que a Nissan exibe aos trabalhadores durante o turno de trabalho. O segundo trouxe o depoimento de Carlos Ghosn no parlamento francês. Três deputados questionaram o presidente da Aliança Renault-Nissan sobre a postura antissindical da empresa. O executivo negou o que o vídeo exibido no Mississipi comprova.
Ricardo Patah, presidente da UGT, central sindical que representa os trabalhadores nas revendedoras da Nissan no Brasil, entende que o problema do Mississipi não é exclusivo de lá e que só uma forte união entre trabalhadores será capaz de forçar a empresa a rever sua política. O senador Paim afirma que a unidade internacional dos trabalhadores é fundamental no momento em que os direitos dos trabalhadores estão ameaçados e muitos defendem a terceirização. Valcir Ascari, presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de Gravataí (SINMGRA), está certo de que o que acontece hoje no Mississipi ocorrerá em breve no Brasil se não for possível parar o processo de desmonte dos direitos sociais e trabalhistas no Brasil. “Se nos acomodarmos passaremos pela mesma situação”, reforçou Paulo Pissinini, diretor do Sindicato dos Metalúrgicos da Grande Curitiba.
Frank Figgers, líder comunitário do Mississippi e Sanchioni Butler, coordenadora da UAW no Estado, fizeram relatos detalhados sobre a ação antissindical da Nissan e como isso tem afetado a comunidade. As ameaças de demissão procuram desestabilizar as famílias e desestimular a organização dos trabalhadores. Mesmo assim, tem crescido o interesse pela sindicalização na região.“Trata-se da supressão de um direito básico de liberdade de expressão e a impossibilidade de que seja negociado um acordo coletivo”, disse Sanchioni. Outro dado importante: 50% dos funcionários da empresa são temporários que acabam trabalhando em caráter permanente na empresa, mas recebem salários menores.
Helo Reinert
Analítica
#SemDireitosNãoéLegal
Rafael Messias Guerra UAW – United Auto Workers