Decreto publicado em março pelo governo federal alterou as regras de concessão do auxílio-doença e da perícia médica do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social). Agora, o segurado poderá apresentar atestado feito por profissional do SUS (Sistema Único de Saúde) como prova para a concessão do auxílio-doença, benefício previdenciário para os trabalhadores com afastamento superior a 15 dias por doença ou acidente.
Especialistas ressaltam que, pela regulamentação antiga, o segurado só tinha direito a receber o benefício após avaliação de perito do INSS. Ou seja, segundo as novas medidas, os médicos do órgão previdenciário deixam de ter a exclusividade nas avaliações necessárias para a concessão de benefícios como auxílio-doença e aposentadoria por invalidez.
Para Marco Aurélio Serau Jr., especialista em Direito Previdenciário, a nova norma é uma resposta às grandes filas para perícias no INSS, em virtude da greve longa do ano passado.
Segundo dados do INSS, mais de 1,3 milhão de perícias médicas deixaram de ser feitas durante a paralisação. O tempo médio de espera para concessão de aposentadoria cresceu para 80 dias neste ano. Em 2015, a espera média era de 49 dias. Em 2013, levava-se 37 dias para ter o benefício liberado.
Já nas contas da ANMP (Associação Nacional dos Médicos-Peritos), a fila de perícias em todo o País ultrapassou 2 milhões de casos.
O advogado João Badari, também especialista na área, informa que a fila de espera para conseguir uma perícia é um dos principais problemas do INSS. “O decreto foi criado pela ausência de peritos e estrutura para atender a população, ocasionando filas imensas após a longa greve.”
Segundos os especialistas, a perícia é fundamental para o médico realizar uma avaliação sobre a incapacidade do segurado para o trabalho e qual a data prevista para o retorno à atividade.
O advogado de Direito Previdenciário Celso Jorgetti alerta que, com a nova regra, a concessão tenderá a ser mais rápida, já que a perícia pode ser efetuada por mais agentes. “Além disso, prevê a possibilidade de os médicos do SUS poderem confirmar a prorrogação do benefício, caso o segurado do INSS não esteja apto para voltar ao trabalho.”
O aspecto negativo, na visão de Jorgetti, é que a obrigação de o segurado retornar ao trabalho no dia seguinte da data indicada para sua recuperação, sem perícia médica, pode implicar em grande número de ações judiciais. “Caso o empregado tenha qualquer complicação de saúde em decorrência da volta antecipada, poderá pleitear seus direitos na Justiça”, avalia.
Na regra antiga, o funcionário só estaria liberado a retornar ao serviço mediante nova avaliação no INSS. O novo decreto estabelece que o atestado do médico que acompanha o caso do trabalhador (seja ele do SUS ou não) é suficiente para autorizar o encerramento do benefício e o retorno ao trabalho.
Celso Jorgetti explica que, do ponto de vista da prestação de serviços, o fato de tirar a exclusividade dos médicos do INSS nas avaliações médicas necessárias para a concessão de benefícios como auxílio-doença e aposentadoria por invalidez dará maior celeridade nas concessões, “apesar de não estar afastada a possibilidade de o INSS convocar o segurado a qualquer momento para avaliação pericial”.
FRAUDES
Badari reforça que o controle da concessão do benefício deve ser mais rígido, por conta do risco de irregularidades. “Não vejo aspectos negativos, exceto pela possibilidade de fraudes, que podem ser combatidas com maior rigor na fiscalização dos documentos apresentados pelo segurado e também com sanções criminais aos envolvidos e fiscalização do CRM (Conselho Regional de Medicina) e do SUS”, aponta.
Jorgetti também considera a possibilidade de fraude, pois, agora que “a concessão dos benefícios vai se basear na documentação que o médico do SUS fornecer ao paciente, pode ocorrer algum tipo de favorecimento pessoal”.
Ele alerta, porém, que o INSS poderá convocar o segurado em qualquer hipótese e a qualquer momento para uma avaliação própria, podendo conceder o benefício, com base na avaliação pericial ou da documentação médica apresentada.
FALHA DE GESTÃO
Serau Jr. entende que a nova regulamentação busca eficiência na análise da incapacidade laborativa. “Os benefícios previdenciários por incapacidade, conforme estudos estatísticos, encontram-se entre os que mais são judicializados, quer dizer, aqueles que mais são discutidos judicialmente. Tome-se como exemplo a conhecida questão da alta programada”, relata.
O especialista também defende que o decreto estampa a falência do modelo de gestão administrativa do INSS, inclusive no que diz respeito às perícias médicas. “A solução não é por esse caminho, da “descentralização” ou “terceirização” das perícias – já foi cogitado, inclusive, que fossem realizadas pela iniciativa privada ou pelos médicos do trabalho das empresas. Deve-se investir na melhoria do serviço público, com obtenção da eficiência administrativa em prol da efetivação dos direitos dos segurados”, afirma.