Ministros analisaram na sessão de ontem ação direta de inconstitucionalidade (Adin) proposta pela Confederação Nacional dos Estabelecimentos de Ensino
O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu pela validade de dispositivos do Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146, de 2015) que obrigam escolas particulares a aceitar a matrícula de alunos com necessidades especiais sem cobrança adicional. A questão foi definida no julgamento de uma ação direta de inconstitucionalidade (Adin) proposta pela Confederação Nacional dos Estabelecimentos de Ensino (Confenen), que alegava elevado custo e risco de fechamento de algumas escolas privadas.
A Lei nº 13.146, de 2015, determina que o poder público deve assegurar sistema educacional inclusivo em todos os níveis e modalidades – o que deve ser seguido pelas instituições privadas. E veda a cobrança de valores adicionais de qualquer natureza nas matrículas e mensalidades de estudantes com deficiência.
Para a Confenen, o dispositivo que obriga qualquer escola comum, pública ou privada, não preparada com material, equipamento, professores e pessoal especializado, a atender portador de qualquer tipo de necessidade especial seria inconstitucional.
“A lei pretende jogar o deficiente de qualquer natureza em toda e qualquer escola”, afirmou Roberto Geraldo de Paiva, presidente da Confenen, na sustentação oral. Para o advogado, o deficiente merece uma modalidade de ensino especial, a ser fornecida por escolas especializadas. “Não é um acompanhante ou cuidador para empurrar cadeira, é gente altamente especializada”, acrescentou.
Já a advogada da União Grace Maria Fernandes Mendonça defendeu que uma sociedade justa e solidária não se constrói pela exclusão ou pelo tratamento desigual. “A livre iniciativa que se invoca não é plena. Não há aqui violação ou risco em relação a propriedade privada e cumprimento de sua função social”, disse. A legislação não exclui escolas especializadas, segundo Grace, apenas abre as portas das escolas privadas.
Em seu voto, o relator do caso, ministro Edson Fachin, negou o pedido da Confenen. Segundo ele, as instituições privadas de ensino exercem legítima atividade econômica e devem se adaptar para acolher as pessoas com deficiência. Caso o pedido da entidade fosse concedido, correria-se o risco de criar um “odioso privilégio” a instituições particulares de ensino, segundo Fachin, porque oficializaria a discriminação. “À escola não é dado escolher, segregar, separar. Seu dever é ensinar, conviver”, afirmou.
Para o ministro Ricardo Lewandowski, está superada a ideia de que os direitos fundamentais constituem apenas uma obrigação do Estado. “Eles também devem ser observados nas relações privadas”, disse. De acordo com o presidente do Supremo, as escolas privadas devem respeitar a inclusão social.
O mérito, segundo afirmou o ministro Gilmar Mendes, é indiscutível no caso, mas é necessário pensar na efetividade da implementação de uma mudança significativa sem uma cláusula de transição. “Muitas das exigências aqui impostas dificilmente poderão ser atendidas de imediato e certamente vão gerar polêmicas que ficarão pelas instâncias ordinárias”, disse.
Apesar do registro, Gilmar Mendes acompanhou o voto do relator. “Nós que muitas vezes criticamos o Congresso Nacional, devemos reconhecer um diploma como esse, que efetiva direitos de minorias tão fragilizadas”, afirmou o ministro.
Somente o ministro Marco Aurélio Mello ficou vencido no julgamento, parcialmente. Para o magistrado, o Estado não pode “cumprimentar com o chapéu alheio” e compelir a iniciativa privada a fazer o que ele não faz.
No voto, Marco Aurélio listou os diversos deveres que a lei impõe, desde acessibilidade na escola até oferta de profissionais de apoio escolar. “Há leis que são editadas talvez para dar uma esperança vã à sociedade, impossível de frutificar. São editadas no campo do faz de conta”, afirmou. O ministro Celso de Mello não participou do julgamento.