Especialistas da ONU pedem suspensão de portaria que muda regras de combate ao trabalho escravo

Declaração conjunta de especialistas em Direitos Humanos aponta ainda preocupação com cortes orçamentários em áreas que fiscalizam as condições de trabalho

Jamil Chade

GENEBRA – Especialistas em direitos humanos das Nações Unidas pediram hoje ao governo do Brasil que adote ações urgentes para combater medidas que possam reduzir a proteção das pessoas contra a escravidão. A declaração conjunta ainda expressa preocupação com cortes orçamentários para fiscalização e recomenda a suspensão da portaria que flexibiliza as regras de combate ao trabalho escravo.

“O Brasil tem muitas vezes desempenhado um papel de liderança na luta contra a escravidão moderna, por isso é surpreendente e decepcionante ver medidas que poderiam fazer o país perder terreno nesta frente”, disseram os especialistas em uma declaração conjunta.

A Relatora Especial da ONU sobre a escravidão contemporânea, Urmila Bhoola, disse que uma série de desenvolvimentos estão causando preocupação, incluindo a portaria que limita a definição de escravidão e pode reduzir o número de vítimas detectadas.

“Esta portaria coloca o Brasil em risco de dar um passo atrás na forma como regula os negócios”, disse Bhoola. “É essencial que o Brasil tome ações decisivas agora para evitar o debilitamento das medidas anti-escravidão que foram implementadas na última década e que, por sua vez, enfraqueceriam a proteção das populações pobres e excluídas que são vulneráveis à escravidão”.

Surya Deva, que preside o Grupo de Trabalho da ONU sobre direitos humanos e corporações transnacionais e outras empresas comerciais, também expressou preocupação de que a portaria coloque o País em posição anterior na batalha contra o trabalho escravo.

“No relatório sobre a nossa visita ao Brasil, apresentado ao Conselho de Direitos Humanos em junho de 2016, o Grupo de Trabalho reconheceu iniciativas positivas para combater a escravidão moderna, como a chamada ‘lista suja’ que publicava informações sobre empregadores flagrados usando trabalho escravo, mas também advertiu sobre outra iniciativa que enfraquece a definição de trabalho escravo (projeto de lei do Senado nº 413/2013)”, disse Deva. “Também estamos preocupados com outras ações, incluindo cortes orçamentários para inspeções do trabalho, que desempenham um papel fundamental na detecção de vítimas e na erradicação da escravidão”.

Os especialistas reconheceram como positiva a ação do Supremo Tribunal Federal de suspender temporariamente a portaria ministerial, e solicitaram que o governo reverta a portaria permanentemente.