Macri e central sindical se enfrentam na Argentina

Uma das maiores ameaças às reformas pró-mercado do presidente Mauricio Macri vai emergir nesta semana, quando Hugo Moyano, o principal líder sindical da Argentina, tentará paralisar o país.

Benedict Mander | Financial Times, de Buenos Aires

Uma greve dos caminhoneiros convocada para quarta-feira pelo veterano presidente do Confederação Geral do Trabalho (CGT) é um protesto contra o plano de Macri de liberalizar a economia argentina, na qual os sindicatos trabalhistas têm enorme poder.

Reformas trabalhistas que visam reduzir custos para as empresas e elevar a produtividade devem ser debatidas no Congresso em março, e Moyano quer obstruir essa agenda antes da campanha presidencial para as eleições de 2019.

“As pessoas estão convencidas de que esse governo está fracassando e que não tem respostas”, disse Moyano na semana passada, após ficar claro que Macri está disposto a bater de frente com o mais influente líder sindical do país – ao contrário de seus antecessores.

Milhares de caminhoneiros devem parar por pelo menos 24 horas. Num país grande quanto a Argentina e com uma malha ferroviária limitada, os caminhoneiros são uma parte muito importante da economia e poderão deixar vazios caixas automáticos, postos de gasolina e supermercados.

“Não podemos permitir que esse governo neoliberal acabe com nossos direitos apenas para beneficiar os ricos”, diz Federico Suarez, um pedreiro que apoia a greve e descreve Macri como “escória”.

Além de estimular distúrbios sociais, os sindicatos poderão enfraquecer a importante batalha do governo para domar a inflação, que continua alta. Com a rodada de negociações salariais deste ano prestes a começar, os sindicatos estão fazendo campanhas por aumentos salariais de mais de 20%.

“Hoje, a taxa de inflação está sendo determinada pelos sindicatos, e não pelo banco central”, afirma Nicolás Catena, figura importante da indústria vinícola argentina e um economista respeitado.

A greve será a primeira grande demonstração de força contra a tentativa do governo de conter os aumentos salariais neste ano dentro da nova meta de inflação de 15%, além de uma demonstração da insatisfação com uma onda de demissões no inchado setor público e ajustes na Previdência.

Sindicalistas vão protestar ainda contra a reforma trabalhista proposta, criticada pela direita por ser pouco ambiciosa, que inclui uma tentativa de atrair mais trabalhadores para a economia formal e um plano polêmico de reduzir a indenização por demissão.

Setores mais conciliadores do dividido movimento sindical argentino não vão aderir à greve. Há quem acredite que Moyano, que nega acusações de ter embolsado verba do movimento sindical, possa estar tentando ganhar um tratamento leniente nos tribunais, em troca de uma eventual amenização em sua posição de confronto.

Diante desse cenário instável, muitos investidores estão receosos com as perspectivas para a inflação neste ano. Poucos acreditam que o governo alcançará a meta ajustada de inflação de 15%, já acima da banda de 8% a 12%. No ano passado os preços subiram quase 25% – bem acima da meta de 12% a 17%.

Enquanto a inflação seguir em dois dígitos e o déficit fiscal primário (que caiu para 3,9% em 2017, abaixo da meta de 4,2%) forçar o governo a continuar tomando grandes empréstimos no mercado internacional, os investidores na economia real continuarão cautelosos. Os mercados financeiros, por outro lado, estão animados com Macri. O índice da Bolsa de Buenos Aires dobrou, em dólar, desde que ele assumiu o governo.

“É muita ingenuidade achar que investimentos diretos subitamente vão aparecer só por causa da mudança de governo”, diz Eduardo Costantini, experiente financista e incorporador imobiliário.

Embora os investimentos estrangeiros diretos tenham subido, de cerca de US$ 7 bilhões ao ano nos últimos anos do governo Kirchner, para quase US$ 11 bilhões no ano passado, eles continuam representando apenas 1,7% do PIB, em comparação à média de cerca de 3% da região, segundo o ministro da Fazenda, Nicolás Dujovne.

Mas Costantini está otimista. Assim como muitos outros investidores, ele acredita que Macri conseguirá um segundo mandato de quatro anos em 2019.

Muitos investidores “estão muito otimistas com a Argentina”, diz ele, apontando para uma grande fila de ofertas públicas iniciais de ações. Ele próprio já comprou mais de US$ 200 milhões em terrenos em Buenos Aires no último ano e está investindo US$ 400 milhões em novas incorporações no distrito financeiro da cidade.

Ainda assim, a resistência às tentativas do governo de liberalizar a economia significam que o progresso é bem mais lento do que investidores – e Macri – gostariam. “A inclinação natural de Macri, como empresário, é avançar a plena marcha. A terapia de choque é da sua natureza”, diz o empresário Alec Oxenford.