Analfabetismo funcional é desafio. Segundo dados do Inaf (Indicador de Alfabetismo Funcional), 22% dos universitários são plenamente alfabetizados
“Oi, meu nome é André e vou vender bolo de cenoura hoje das 14 horas às 17 horas. Cada fatia é cinco reais. Interessados podem entrar em contato pelo telefone 9999-9999.
E as pessoas perguntam:
a) O bolo é do quê?
b) Quanto custa?
c) Posso buscar às 18h?
d) Como faz para comprar?”
O anúncio fictício acima foi um sucesso de compartilhamento nas redes sociais justamente por mostrar algo que é recorrente na internet. Apesar de retratar com bom humor a situação, ele coloca em discussão a capacidade dos brasileiros em ler e interpretar certos textos.
A tecnologia, que ao mesmo tempo permite com que as pessoas tenham mais acesso às informações, também expõe as lacunas de um sistema educacional que não consegue fazer com que todos saiam da escola plenamente capazes de entender e se expressar por meio de letras e números.
De acordo com dados do Inaf (Indicador de Alfabetismo Funcional), realizado pelo Instituto Paulo Montenegro em parceria com a ONG Ação Educativa, de 2016, apenas 22% dos brasileiros que chegam à universidade são plenamente alfabetizados.
Eles estão no nível “proficiente”, que é o índice mais avançado de alfabetismo funcional no indicador. O indivíduo considerado proficiente é capaz de compreender e elaborar textos de diferentes tipos, opinar sobre o posicionamento ou estilo do autor do texto e está apto a interpretar tabelas e gráficos. Ele também é capaz de resolver problemas (desenvolver planejamento, controle e elaboração).
Ainda segundo o estudo, 4% dos universitários são considerados analfabetos funcionais — não conseguem compreender um texto simples, como o anúncio que viralizou nas redes. Em um cenário ideal, os estudantes deveriam sair do ensino médio com esse nível. No Brasil, são 12 anos de estudo para conclusão do ensino médio.
“Os alunos que terminam o ensino médio brasileiro precisariam ficar em média de 2 a 3 anos a mais estudando para ter a capacidade plena de entender e se expressar por letras e números”, diz Ocimar Alavarse, professor da Faculdade de Educação da USP (Universidade de São Paulo). Segundo ele, os alunos brasileiros teriam que ficar mais tempo para saírem da escola proficientes.
Evolução
Apesar dos números estarem longe do satisfatório, especialistas entendem que há uma evolução na educação brasileira. “Ao longo dos últimos 20 anos, houve um aumento da população que entra na faculdade. O acesso deixa de ser restrito, de estar relacionado com uma elite, que é privilegiada por trabalhar com literatura dentro de casa”, diz Ana Lima, economista e cofundadora da Rede Conhecimento Social. “Em muitos casos, é a primeira geração que está na faculdade.”
No entanto, a especialista aponta problemas no caminho escolar de grande parte dos estudantes. “A escola deveria ter dado conta, mas não se mostra ser capaz de integralmente resolver esse buraco.”
“Em um panorama histórico, a cada ano está melhorando o índice da alfabetismo. Porém, a taxa de crescimento ainda é pequena. É preciso potencializar esse crescimento”, diz Alavarse.
Soluções
De acordo o professor, a melhora no indicador de alfabetismo funcional passa pela política brasileira. “Tudo isso depende da capacidade política dos governos. Não há saída rápida fora da política”, diz.
Para Ana, é preciso pensar em quem não está mais em idade escolar. Para ela, a educação dessas pessoas impacta no futuro das próximas gerações. “O Brasil precisa também pensar em quem está fora da escola, em lideranças de comunitárias, lideranças sociais. Como vamos atingir esse público? Que papel eles podem ter na educação?”