Mais de 70% dos 7,2 milhões de empregados domésticos no Brasil são informais. Além disso, 9 em cada 10 trabalhadores são mulheres e o salário médio da categoria é de apenas R$ 489 por 36,8 horas semanais. As informações fazem parte de estudo publicado na semana passada pela Organização Internacional do Trabalho (OIT).
Os dados refletem a preocupação da entidade, para a qual as principais discussões sobre o trabalho doméstico no mundo devem ter como eixo garantias legais de salário mínimo, tempo de trabalho e direitos das gestantes. Isso porque somente 10% dos empregados domésticos de todo o mundo estão cobertos pela mesma legislação trabalhista aplicável às outras profissões, enquanto quase um terço do total (29,9%) trabalha em países que os excluem completamente desse âmbito.
Os empregados domésticos brasileiros fazem parte dos 60% restantes, de trabalhadores que possuem apenas parte dos direitos garantidos a profissionais de outros setores.
Legislação trabalhista
Segundo o estudo, “estender o alcance das leis trabalhistas é um meio de trazer os empregados domésticos à economia formal”. Em todo o mundo, existem poucas organizações efetivas, como sindicatos ou cooperativas, que possibilitem uma negociação coletiva dessa categoria, o que torna esses trabalhadores muito vulneráveis a práticas abusivas de emprego, já que individualmente eles têm pouco poder de negociação com seus empregadores. Historicamente, isso tem sido reforçado por uma relação paternalista ainda bastante presente do empregador com seu funcionário, mais do que direitos e obrigações claramente definidos.
A OIT também constatou que a região da América Latina e Caribe teve um crescimento “particularmente rápido” nesse setor, que passou de 10,4 milhões de trabalhadores domésticos em 1995 para 19,6 milhões em 2010, o que equivale a 11,9% de todo o trabalho assalariado da região. Isso, segundo o relatório, acontece devido a “extraordinários” níveis de desigualdade salarial: “os lares no topo da distribuição [salarial] têm os recursos para empregar trabalhadores domésticos, enquanto os trabalhadores na base estão dispostos a aceitar trabalhos em serviços domésticos, mesmo se os níveis de remuneração e proteção social forem baixos”, diz o estudo.
Salário mínimo
No Brasil, menos de 30% dos trabalhadores domésticos possuem carteira assinada e a remuneração média em 2008 era de R$ 489, o que representa apenas 41,1% da média salarial de todos os profissionais no país. Apesar disso, o relatório vê como bem sucedida para a categoria a política de aumentos de salário acima da inflação promovida desde pelo governo desde 2003, quando a remuneração média era de R$ 333 (em valores corrigidos).
A diferença corresponde a um aumento real de 47% do poder de compra desse setor, mais do que os 20% da média das outras profissões. Isso, segundo o estudo, aconteceu porque quase metade (46,4%) de todos os empregados domésticos recebiam em 2008 um salário mínimo. Em comparação, 15,5% dos trabalhadores de outras categorias recebiam o mesmo valor.
O estudo também esclarece a importância do salário mínimo como nível de negociação nas relações do mercado informal de trabalho, ao constatar que 15,3% dos trabalhadores domésticos no Brasil não registrados recebiam em 2008 exatamente um salário mínimo.
Convenção 189
O relatório conclui reforçando a necessidade, em todo o mundo, da ratificação da convenção 189 da OIT, que busca a equiparação dos direitos dos empregados domésticos aos dos demais trabalhadores.
Apesar dos representantes brasileiros na OIT terem assinado pela adoção da convenção na Conferência Internacional do Trabalho em 2011, o Congresso Nacional ainda precisa discuti-la antes que possa ser ratificada.
PEC das domésticas
Outro projeto com propósitos similares é a Proposta de Emenda à Constituição 478/10, conhecida por “PEC das Domésticas”. A proposta busca alterar o artigo 7º da Constituição Federal e incluir diversos direitos já garantidos aos demais profissionais para os empregados domésticos, como a jornada de trabalho de 44 horas, o seguro-desemprego e o FGTS. Ela já foi aprovada em dois turnos pela Câmara dos Deputados e agora segue para o Senado, onde também deve ser aprovada em dois turnos. Se não houver modificações, será enviada para a presidenta Dilma sancionar.
Críticos da medida questionam sua viabilidade e têm defendido que, para evitar demissões e aumento da informalidade, a PEC deveria ser acompanhada de outras medidas, como subsídios do governo no pagamento do INSS dos empregados e a possibilidade aos patrões de não pagarem a multa por quebra de contrato.
Em outras palavras, os encargos trabalhistas de empregados privados seriam custeados com dinheiro público. A proposta de subsídios governamentais têm sido criticada pelos próprios representantes dos trabalhadores, que consideram exagerada a preocupação em relação ao aumento da informalidade.
Creuza Oliveira, presidenta da Federação Nacional das Trabalhadoras Domésticas (Fenatrad), discorda, por exemplo, que a aprovação da PEC possa levar a demissões: “O que o patrão vai contribuir a mais é algo pequeno, de 8% a mais, referente ao FGTS”.
“Os empregadores estão acostumados a ter trabalhadores na sua casa, mas na hora de cumprir as obrigações, não querem fazê-lo”, diz. Ela acredita que a aprovação da proposta é “um caminho para a igualdade dos direitos, mas isso não resolve o problema porque, no Brasil, nem sempre a aprovação de leis significa que elas serão cumpridas”.
A relatora da PEC 478/10, deputada federal Benedita da Silva (PT-RJ), argumenta que os empregadores deverão aceitar a nova regulamentação, ou então outros setores do mercado irão absorver esses trabalhadores.
Ainda segundo ela, diversos ministérios e secretarias do governo estão estudando possíveis reduções nos encargos trabalhistas. Para Benedita da Silva, a PEC das Domésticas é significativa: “Quando a convenção 189 for ratificada, o Brasil já estará um passo a frente em termos de direitos do trabalhador”. (Fonte: Repórter Brasil)