Raymundo Costa | De Brasília
A insatisfação entre os partidos da base aliada do governo pode levar a presidente Dilma Rousseff a sofrer sua primeira derrota na Câmara já na votação do valor do novo salário mínimo, fixado em R$ 540. Segundo avaliação feita no PT, a única alternativa do governo, para não sofrer um fracasso, é a medida provisória baixada em dezembro ser aprovada sem ir à votação do plenário, por acordo entre os líderes partidários.
Um bom indicador do tamanho da insatisfação das bancadas será a eleição do presidente da Câmara, em eleição marcada para amanhã. Se o candidato dissidente Sandro Mabel (PR-GO) tiver algo em torno dos 180 votos, já será um dado preocupante para o Palácio do Planalto, na avaliação de líderes aliados. A intenção dos descontentes, nos partidos, não é derrotar o candidato do PT, Marco Maia (RS), mas mandar um recado para a presidente Dilma.
O valor do mínimo é fixado desde 2006 com base num acordo feito pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva com as centrais sindicais, pelo qual é corrigido pela média da variação do Produto Interno Bruto (PIB) dos dois anos anteriores, mais a inflação do último ano. Os R$ 540 foram decretados quando a inflação de 2010, medida pelo INPC, ainda não era conhecida. Divulgado o índice, o governo reconheceu que o valor correto seria R$ 543, mas o Ministério da Fazenda admitiu que poderia arredondar para R$ 545. No limite.
Embora avaliem que Dilma terá um ano relativamente calmo no Congresso, líderes aliados acreditam que haverá crises localizadas na Câmara. Não uma crise oriunda da disputa com a oposição, que conta com apenas 111 deputados, mas crise nascida na própria base.
Como é normal em início de governo, a expectativa em relação a Dilma é favorável no Congresso. Forte também está o PT, que fez a maioria numa Casa, a Câmara, em que o PMDB esperava fazer as maiores bancadas. Nesse cenário, Dilma e o PT têm conduzido o debate sobre a formação do governo sem dar muita importância aos pemedebistas, que fizeram a segunda maior bancada.
Em relação aos outros partidos da base, a relação é ainda mais subordinada. O PSB, sigla que mais cresceu entre os aliados, está descontente com sua fatia de poder, mas também com a maneira pela qual foi tratado durante as negociações para a composição do ministério.
Nos bastidores, líderes do PSB acusam o governo de jogar numa eventual divisão entre o grupo do Ceará, liderado pelos irmãos Cid e Ciro Gomes, e o governador de Pernambuco e presidente do PSB, Eduardo Campos. Causou mal-estar também o vazamento da notícia de que o senador Antônio Carlos Valadares (SE) ocuparia um ministério a ser criado a fim de abrir a vaga para seu suplente, o presidente do PT, José Eduardo Dutra.
Os partidos médios também manifestam desconforto com o fato de o PDT manter uma pasta do porte do Ministério do Trabalho, quando perdeu deputados na eleição e nem sequer elegeu um governador de Estado. E é justamente no PTB que se dá a maior movimentação em torno do novo salário mínimo: o deputado e presidente da Força Sindical (FS), Paulo Pereira da Silva (SP), é o autor da emenda que fixa o novo valor em R$ 580.
O governo nega, mas líderes aliados na Câmara acreditam que o Ministério da Fazenda pode chegar à quantia de R$ 550. Mesmo nessa hipótese, considerada um grande avanço pelo PT, há pessimismo entre líderes aliados. A tendência é que a Câmara aprove uma emenda com valor superior ao máximo que o governo propuser. “Se for R$ 550, passa a emenda com R$ 560; se for R$ 560, passam os R$ 580 da Força Sindical“, diz um petista bem situado.
Além disso, com a Força liderando um movimento por um salário maior, os deputados ligados às outras centrais, inclusive à CUT, sentem-se desconfortáveis em apoiar o valor menor proposto pelo governo. A candidatura Sandro Mabel à presidência da Câmara já é reflexo desse clima. O recado para Dilma é que o governo tem maioria confortável na Câmara, mas com um nível muito alto de insatisfação, que, a qualquer momento, pode evoluir para uma crise.