Bicentenário: 200 Obras de Arte e Cultura do período 1822-2022

Em uma seleção realizada pelos jornalistas André Cintra, Carolina Maria Ruy, Marcos Ruy, Susana Buzeli e Val Gomes, o Centro de Memória Sindical lançou o projeto 200 Obras de Arte e Cultura do período 1822-2022. Acesse o trabalho no seguinte link: https://memoriasindical.com.br/formacao-e-debate/brasil-em-200-obras/

Baixe aqui a lista em PDF: 200 obras brasileiras lançadas entre 1822 e 2022

1822 Hino da independência, de Evaristo Ferreira da Veiga (1799 – 1837) e Dom Pedro I (1798-1834) música. A música foi composta por D.Pedro I em 1821, data anterior à Proclamação da Independência. Em 1822, Evaristo da Veiga escreveu os versos que constituem a letra atual. Neste mesmo ano, o músico luso-brasileiro Marcos Portugal também compôs uma música para o marco histórico.

1826 Missa de Santa Cecília, de José Maurício Nunes Garcia (1767 – 1830), música. Uma das últimas obras do considerado mais importante compositor brasileiro do fim do século 18 e início do 19. Com a chegada ao Brasil da corte portuguesa em 1808, Nunes Garcia surpreende D. João com seu talento e é nomeado Mestre da Real Capela.

1827 Um jantar brasileiro, de Jean-Baptiste Debret (1768 – 1848), pintura. O famoso quadro mostra uma senhora branca à mesa farta, oferecendo a uma criança negra um pedaço de comida. Quando Debret pintou o retrato faltavam ainda 61 anos para o fim da escravidão. E ele pintou a escravidão como ninguém. Nos deixou um extenso registro daquele horror.

Um jantar brasileiro

1831 Hino nacional brasileiro, de Francisco Manuel da Silva (1795 – 1865) e Joaquim Osório Duque Estrada (1870 – 1927), música. Melodia patriótica de Francisco Manuel da Silva, um dos músicos com mais destaque no Rio de Janeiro entre a morte de José Maurício Nunes Garcia e a ascensão de Carlos Gomes. A letra de Osório Duque Estrada foi adotada oficialmente em setembro de 1922.

1837 Lá no largo da Sé velha, de Cândido Inácio da Silva (1800-1838) e Manuel de Araújo Porto-Alegre (1806-1879), música. Autor de celebradas modinhas e lundus do 1º Império, Cândido Inácio foi aluno de José Maurício Nunes Garcia e, entre suas composições, destaca-se este lundu, muito popular no Rio de Janeiro da 1ª metade do século 19. Uma combinação original entre letra, harmonia, melodia e ritmo.

1845 O noviço, de Martins Pena (1815-1848), teatro. Esta comédia ironiza a hipocrisia do patriarcado opressor da juventude.

1846 Canção do exílio, de Gonçalves Dias (1823 – 1864), literatura. O poeta maranhense estava em Coimbra, estudando Direito, quando compôs, aos 20 anos, esta obra nostálgica – que contrapõe “lá” (Brasil) com “cá” (Portugal). Ele morreu aos 41, num trágico naufrágio, mas versos do poema foram eternizados, décadas depois, no Hino Nacional.

1858 Guesa errante, de Joaquim de Sousândrade (1833 – 1902), literatura. Sousândrade possui obra inovadora e é considerado um dos escritores visionários do século 19. Guesa Errante, sua obra mais importante, foi inspirada em uma lenda andina e, com nuances autobiográficos, denuncia o drama dos povos indígenas diante da exploração dos povos europeus.

1859 Quem sou eu?, de Luís Gama (1830 – 1882), literatura. Único ex-escravo brasileiro que se tornou um intelectual influente e ainda ajudou a libertar mais de 500 cativos pelas vias legais, Gama deixou, neste relato, uma espécie de carta-testamento: “Não tolero o magistrado / que do brio descuidado / vende a lei, trai a justiça”.

1859 Úrsula, de Maria Firmina dos Reis (1822 – 1917), literatura. Este romance pioneiro era, de uma só vez, abolicionista, feminista e emancipacionista – isso há 163 anos. Não à toa, na terra de Gonçalves Dias e Ferreira Gullar, Firmina, “professora pública em Guimarães”, ainda é a única mulher homenageada na Praça do Pantheon, em São Luís.

1869 O navio negreiro, de Castro Alves (1847 – 1871), literatura. Um dos primeiros poemas a denunciar a desumanidade do escravismo no país.

1870 O guarani, de Antônio Carlos Gomes (1836 – 1896), música. Inspirada no romance homônimo de José de Alencar, O Guarani é a mais célebre ópera brasileira, teve sua estreia no Teatro Alla Scalla de Milão (Itália) e trouxe renome internacional para Carlos Gomes. É conhecida também como tema de abertura do programa de rádio A Voz do Brasil.

1881 Corporação Musical Operária da Lapa, vários, banda. Uma das mais antigas organizações de trabalhadores do país ainda em atividade. Surgiu no início do processo de industrialização brasileira na cidade de São Paulo. A data oficial de fundação da Corporação é 1914, mas sua origem remonta a 1881. Nos primeiros anos a Corporação teve a denominação de Banda XV de Novembro afirmando sua posição republicana.

1881 Memórias póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis (1839 – 1908), literatura. Marco realista, a narrativa em primeira pessoa de um “defunto autor”, recheada de hipocrisia e melancolia, mudou o curso da literatura no Brasil. Da dedicatória a um verme até o epílogo de “negativas”, passando por personagens e capítulos memoráveis, é uma obra-prima singular.

1888 Abolição da escravatura, de Victor Meirelles (1832-1903), pintura. Um dos principais pintores do século 19, precursor da pintura moderna brasileira, Victor Meirelles retrata nesta pintura histórica (com personagens num mesmo nível) a família imperial e Princesa Isabel, e, simbolicamente, a abolição da escravidão, sem a presença de escravos.

1888 Independência ou morte, de Pedro Américo (1843 – 1905), pintura. A peça mais célebre do Museu do Ipiranga (SP) idealiza (com razoável licença histórica) o momento em que Dom Pedro proclamou a independência do Brasil frente a Portugal. Como tela, sobressai pela monumentalidade – sua largura é superior à do travessão de um gol no futebol.

Independência ou Morte, de Pedro Américo

1892 Inundação da Várzea do Carmo, de Benedito Calixto (1853 – 1927), pintura. A obra detalha o centro de São Paulo no fim do século 19, antes da modernização paulista, com um problema da época: a cheia do Rio Tamanduateí e o transbordamento atingindo áreas de grande importância econômica. Calixto foi um dos pioneiros no uso da câmera fotográfica para criar.

1893 Tiradentes Esquartejado, de Pedro Américo (1843 – 1905), pintura. A obra mostra o herói da Inconfidência Mineira, Joaquim José da Silva Xavier (1746-92), após o esquartejamento. Pedro Américo, pintor consagrado do século 19, revela nesta pintura histórica a “hediondez da barbaria humana”, no tempo em que viveu o “mártir de grandeza moral”.

1893 Caipira picando fumo, de Almeida Júnior (1850 – 1899), pintura. O quadro retrata o brasileiro na nova República: trabalhador, pobre e em um ambiente essencialmente rural.

1895 Copacabana, de Marc Ferrez (1843 – 1923), fotografia. Obra do pioneiro e principal fotógrafo brasileiro do século 19, muito conhecido por suas paisagens, sobretudo as panorâmicas do Rio de Janeiro e arredores, como esta de Copacabana, atual Posto 6, com o Morro Dois Irmãos ao fundo.

1895 Museu do Ipiranga, de Tommaso Gaudenzio Bezzi (1844 – 1915), arquitetura. Importante símbolo da Independência do Brasil, está vinculado à USP desde 1963, como instituição científica, cultural e educacional no campo da História. Uma das obras mais conhecidas de seu acervo é o quadro Independência ou Morte, de Pedro Américo.

1896 Teatro Amazonas, de Celestial Sacardim, arquitetura. 1º teatro do Brasil, maior símbolo cultural-arquitetônico do Amazonas e Manaus. O arquiteto italiano Celestial Sacardim fez o design exterior. Fechou em 1909, na queda do extrativismo da borracha, foi restaurado em 1974 e 1989 e tombado como Patrimônio Histórico Nacional em 1966.

1899 A providência guia Cabral, de Eliseu Visconti (1866 – 1944), pintura. Precursor da Arte Moderna no Brasil, Visconti empenhou-se em pesquisar e retratar o traje de época do personagem principal, porém em uma cena não realista, mas alegórica, com a Providência guiando com determinação o famoso navegador. 1ª obra do artista no gênero pintura histórica.

A providência guia Cabral, de Eliseu Visconti

1899 Dom Casmurro, de Machado de Assis (1839 – 1908), literatura. Uma das mais importantes obras já publicadas, Dom Casmurro marca a grandiosidade e a sofisticação da literatura brasileira com uma trama sutil e ao mesmo tempo profunda e instigante que fala sobre a alma humana.

1899 Ô Abre Alas, de Chiquinha Gonzaga (1847 – 1935), música. Primeira marchinha de carnaval da história.

1902 Isto é bom, de Xisto Bahia (1841 – 1894), música. Ator, músico e compositor muito popular no século 19, Xisto Bahia foi autor de célebres lundus, como Isto é bom, a primeira música gravada no Brasil.

1906 Versos íntimos, de Augusto dos Anjos (1884 – 1914), poesia. Morto precocemente, o poeta paraibano deixou uma obra original, visceral e iconoclasta. Em sentenças poéticas como “A mão que afaga é a mesma que apedreja”, sintetizou o pessimismo niilista. Seu estilo anticonvencional o afastou do reconhecimento que merecia.

1915 Triste fim de Policarpo Quaresma, de Lima Barreto (1881 – 1922), literatura. Mostra os conflitos da formação de nossa identidade nacional. A luta de classes contemporânea encontrou em Barreto um tradutor à altura, seja na crônica, seja no folhetim. Ex-operário, homem errante e atormentado, retratou não só as desigualdades – mas também os riscos das causas aparentemente justas e, no entanto, cegas.

1916 Yara, de Anacleto de Medeiros (1866 – 1907), música. Anacleto de Medeiros compôs polcas, choros, valsas e xotes, como este de nome Yara, também conhecida por Rasga o Coração, ao ganhar letra de Catulo da Paixão Cearense. Organizou bandas, entre elas a Banda do Corpo de Bombeiros, pioneira em gravação de discos no Brasil.

1916 Pelo telefone, de Donga, Ernesto Joaquim Maria dos Santos, (1890 – 1974) e Mauro de Almeida (1882 – 1956), música. Primeiro samba registrado como samba no país, gravado em disco em 1917.

1917 Carinhoso, de Pixinguinha, Alfredo da Rocha Vianna Filho, (1867 – 1973), música. Carinhoso, uma das principais músicas do gênero chorinho, tem valor afetivo para grande parte do povo brasileiro. Ela marca um período em que a cultura brasileira ganhava suas definições.

1917 Exposição de pintura moderna, de Anita Malfatti (1889 – 1964), pintura. Cinquenta meses antes da Semana de 22, a segunda mostra individual da pintora paulistana abriu as portas da arte moderna no Brasil. Atacado pela crítica conservadora, o evento antecipou as paixões – e incompreensões – que marcariam a “fase heroica” do modernismo (1922-1930).

1920 O Sítio do picapau amarelo, de Monteiro Lobato (1882 – 1948), literatura. Descreve a infância como uma trajetória de sonhos e descobertas e a formação da cultura brasileira.

1922 Semana de Arte Moderna, vários autores, evento cultural. Marco do modernismo brasileiro, realizado no Teatro Municipal de São Paulo, com obras de pintura, escultura, literatura, poesia e música, presenças de Oswald e Mário de Andrade, críticas ao academicismo e defesas do abrasileiramento da língua e da “libertação da arte”.

1926  Eu vi o mundo… ele começava no Recife, de Cícero Dias (1907 – 2003), pintura. O pintor, gravador, desenhista, ilustrador, cenógrafo e professor, expressou neste grande painel sua própria vida em meio a uma realidade onírica e histórias fantásticas. Uma das mais importantes obras-primas do Brasil, causou escândalo por trazer motivos ousados para a época.

Eu vi o mundo… ele começava no Recife, de Cícero Dias

1927 Zumbi, de Antônio Parreiras (1860-1937), pintura. Um dos precursores da temática regionalista no Brasil, Parreiras interessou-se pela figura humana e pelo protagonismo histórico de personagens populares como Zumbi dos Palmares, reduto de negros foragidos. Altivo, Zumbi olha ao longe, um herói na luta contra a escravidão.

1928 Martim Cererê, de Cassiano Ricardo (1895 – 1974), literatura. Neste clássico da literatura moderna brasileira, Cassiano Ricardo faz uma síntese étnica do povo brasileiro na poesia, contando de forma fabulosa a história do nosso Brasil-menino.

1929 Jura, de José Barbosa da Silva, Sinhô (1888-1930) – música. Clássico de Sinhô, compositor de grande destaque nos anos 1920, autor de mais de 150 músicas e aclamado como “o rei do samba”. Jura surgiu quando os jovens músicos começavam a modernizar o samba e foi responsável pelo aparecimento do cantor Mário Reis.

1928 Macunaíma, de Mário de Andrade (1893-1945), literatura. Discute todos os dilemas na identidade nacional em seu protagonista, o anti-herói nacional. Idealizada por anos, mas escrita em apenas seis dias, a maior das rapsódias brasileiras se baseou num sem-número de lendas e mitos, influenciando escritores e artistas. É caso raríssimo de romance com adaptações notáveis tanto no cinema quanto no teatro – e também nos quadrinhos.

1928 Manifesto antropófago, de Oswald de Andrade (1890 – 1954), literatura. O manifesto marca uma fase de abertura e sofisticação da cultura brasileira reafirmando nossa identidade miscigenada. Foi uma obra que exerceu grande influencia nas gerações seguintes, sobretudo na literatura e na Música Popular Brasileira.

1928 No meio do caminho, de Carlos Drummond de Andrade (1902 – 1987), poesia. “Sou o autor confesso de certo poema, insignificante em si, mas que (…) vem escandalizando meu tempo”, disse, certa vez, Drummond. Mais que um “acontecimento” inesperado às “retinas tão fatigadas” do autor, a pedra no caminho é o grande objeto-personagem da nossa literatura.

1930 O quinze, de Rachel de Queiroz (1910 – 2003), literatura. Livro importante da 2ª fase do modernismo, além de seu regionalismo, destacou-se por não romantizar a seca (a de 1915 teve campos de concentração para evitar que retirantes alcançassem Fortaleza). Marco na literatura, com adaptações para cinema, quadrinhos e até jogo digital.

1930 Com que roupa, de Noel Rosa (1910 – 1937), música. Marcou o início do samba, com um típico chiado de músicas antigas. Com que roupa alude tanto à crise de 29 quanto ao processo de urbanização que exigia que as pessoas andassem bem arrumadas. Traz também a figura do malandro, o marginalizado que busca meios para se integrar.

1931 Cobra Norato, de Raul Bopp (1898 – 1984), literatura. Raul Bopp mergulha no universo mágico das lendas indígenas brasileiras e da Amazônia, região que aguçou sua percepção da realidade brasileira. Cobra Norato forma a tríade mítica do Modernismo, com Martim Cererê de Cassiano Ricardo e Macunaíma de Mário de Andrade.

1931 Limite, de Mário Peixoto (1908 – 1992), cinema. Um jovem de 22 anos ousou aventurar-se pelo cinema com a trama de três amigos perdidos em alto-mar. Para promover o filme, inventou até uma crítica de Eisenstein. Jamais imaginaria que após 84 anos, em 2015, jornalistas e críticos elegeriam Limite como o melhor filme brasileiro.

1933 Três apitos, de Noel Rosa (1910 – 1937), música. Como a relação trabalho e capital impacta a vida de quem vive do trabalho.

1933 Operários, de Tarsila do Amaral (1886 – 1973), pintura. Fruto da “fase social” da pintora modernista, é a mais conhecida representação da nossa classe operária. São 51 trabalhadores da indústria que se diferem em gênero, idade e origem, mas se igualam na identidade de classe. O traço comum entre eles é a condição proletária, oprimida.

Operários, de Tarsila do Amaral

1934 Feitiço da vila, de Noel Rosa e Vadico, música. A declaração de amor do carioca Noel à Vila Isabel, composta em parceria com o paulistano Vadico, é também uma ode ao samba. Farta de lirismo, sinestesia e inspiração, a música resvala em certo preconceito com a macumba, mas safa-se pela força e pela sensibilidade de seus versos.

1937 O Rei da vela, de Oswald de Andrade (1890 – 1954), teatro. Trata do processo de industrialização do Brasil sob Vargas no pós crise de 1929.

1938 Vidas secas, de Graciliano Ramos (1892 – 1953), literatura. O ser humano seco como o sertão nordestino e a luta para mudar de vida.

1939 O Que É que a Baiana Tem?, de Dorival Caymmi (1914 – 2008), interpretação de Carmem Miranda (1909 – 1955), música. Dorival Caymmi influenciou diversas gerações de músicos e tornou a Bahia mundialmente conhecida por músicas como O que é que a baiana tem?, gravada por Carmen Miranda, pela primeira vez caracterizada de baiana, personagem que a lançou internacionalmente no filme Banana da Terra.

1939 Bachianas nº 5, de Heitor Villa-Lobos (1887 – 1959), música. Uma das mais belas músicas do principal compositor de música clássica brasileira. Mostra a sofisticação cultural do país e, ao mesmo tempo, tem o frescor da brasilidade.

1939 Aquarela do Brasil, de Ary Barroso (1903 – 1964), música. Composta sob a Era Vargas, este insuperável samba-exaltação canta as belezas do Brasil, “este Brasil lindo e trigueiro”, “terra boa e gostosa”, “terra de samba e pandeiro”. A metáfora da “aquarela” remete à nossa diversidade – de cores, de belezas e de tipos humanos. Que música!

1939 Navio de emigrantes, de Lasar Segall (1891 – 1957), pintura. Expressiva pintura de Lasar Segall, com tonalidades monocromáticas marrons e ocres e de grande dimensão, é o olhar emocional e político do artista sobre “o ser humano como eterno refugiado”, um tempo amplo que independe de épocas e grupos humanos.

1940 Disseram que Voltei Americanizada, Luís Peixoto (1889 – 1973) e Vicente Paiva (1908 – 1964), interpretação Carmen Miranda (1909 – 1955), 1940, música. Foi uma resposta às críticas de que Carmen Miranda atendia ao imperialismo cultural estadunidense, que ganhou força na década de 1930.

1940 Sentimento do mundo, de Carlos Drummond de Andrade (1902 – 1987), literatura. A limitação que temos perante o mundo, a nossa impotência para mudar sozinhos tudo o que precisa.

1943 Igreja da Pampulha, de Oscar Niemeyer (1907 – 2012), arquitetura. Simples e arrojada, a arquitetura da Igreja quebrou o padrão europeu predominante. A Igreja não apenas é um trabalho de Oscar Niemeyer como também contou com dois grandes nomes da arte e paisagismo brasileiro: Cândido Portinari e Roberto Burle Marx.

foto: pxhere

1943 Vestido de noiva, de Nelson Rodrigues (1912 – 1980), teatro. A peça inova com o palco iluminado em três cenários: os planos da realidade, da alucinação e da memória.

1943 O Amigo da onça, de Péricles de Andrade Maranhão (1924 – 1961), quadrinhos. Um dos primeiros personagens de cartoon a conquistar fama nacional publicado pela primeira vez na revista O Cruzeiro. O Amigo da onça ironizava a vida na sociedade urbana que crescia no Brasil da década de 1940.

1944 O circo, de Djanira da Motta e Silva, (1914 – 1979), pintura. Retrata a cultura e o sonho circense de um modo em que o picadeiro, os artistas e o público, no espaço da pintura, são parte de uma mesma cena múltipla, sonora e colorida, que movimenta o tempo todo o olhar do espectador. Uma obra, como todas as da artista, bem brasileira.

1945 O impossível, de Maria Martins (1894 – 1973), escultura. Escultura de um dos grandes nomes da arte brasileira do século 20, a obra parece revelar uma metamorfose do humano em planta canibal, um encontro amoroso, erótico e perigoso, longe do romantismo tradicional, apontando os limites da união plena entre os seres.

1945 Edifício Gustavo Capanema, de Lúcio Costa (1902 – 1998) e Oscar Niemeyer (1907 – 2012), arquitetura. Um marco da Arquitetura Moderna Brasileira, foi um dos primeiros edifícios do mundo a usar o brise-soleil. Tem revestimento decorado por azulejos de Cândido Portinari, pinturas de Alberto Guignard, Pancetti e esculturas de Bruno Giorgi, Adriana Janacópulos,Jacques Lipchitz e Celso Antônio Silveira de Menezes.

1947 O Bicho, de Manuel Bandeira (1886 – 1968), poesia. Pequeno poema de Manuel Bandeira, um exemplo de como construir poesia engajada, não individualista, sem ser panfletária. Em linguagem popular e modernista, as palavras passam a indignação e o compromisso do artista contra as desigualdades que causam a miséria e a exclusão.

1947 MASP, Museu de Arte de São Paulo, de Lina Bo Bardi (1914 – 1992), arquitetura. O famoso vão de mais de 70 metros é uma estrutura que se expande sobre os prédios do entorno da Avenida Paulista. O MASP é um grande marco arquitetônico ao mesmo tempo em que seu vão é uma referência para manifestações políticas e culturais do país.

Foto: Wikipedia

1947 Asa Branca, de Luiz Gonzaga (1912 – 1989) e Humberto Teixeira (1915 – 1979), música. O sertão impõe sofrimentos, afasta pessoas, encurta vidas e até expulsa aves, tal qual a asa-branca. Como extrair poesia e esperança deste cenário tão representativo do Brasil profundo, sem “pé de prantação”, sem gado? É o que faz a dupla Gonzaga-Teixeira neste clássico do baião.

1947 Felicidade, de Lupicínio Rodrigues (1914 – 1974), música. Os versos que abrem a canção – “Felicidade foi-se embora / E a saudade no meu peito ainda mora” – sintetizam o estilo “dor de cotovelo” criado pelo compositor gaúcho. Com letras melancólicas e simples, Lupicínio caiu no gosto e mostrou que homem também sofre – e muito – de amor.

1950 Dança do capital com a morte, de Di Cavalcanti (1897 – 1976), pintura. Desenho irônico e crítico, é uma atitude política do artista contra as mortes causadas pelo nazismo-capitalismo. Autor de cerca de 9 mil obras (pinturas e desenhos), Di Cavalcanti participou da Semana de Arte Moderna, filiou-se ao PCB em 1928 e foi preso 4 vezes nos anos 1930.

1950 Qui nem jiló, de Luiz Gonzaga (1912 – 1989) e Humberto Teixeira (1915 – 1979), música. A música com manifestação das dores e dos amores para a sanidade mental.

1951 Moenda, de Heitor dos Prazeres (1898 – 1966), pintura. Uma das 3 obras expostas na I Bienal Internacional de São Paulo, na qual Heitor conquistou o 3º lugar, tematiza o trabalhador rural afro-brasileiro, uma questão histórica crucial em um País escravagista por séculos. A I Bienal teve obras de Picasso, Giacometti, Morandi, Portinari.

1952 Invenção de Orfeu, de Jorge de Lima (1893 – 1953), literatura. Conforme o grande crítico Mário Faustino (1939-1962), Invenção de Orfeu, que conta “A história mal dormida de uma viagem”, representa “um inventário de quase todas as formas de verso, de estrofe e de poema já intentados na poética portuguesa”.

1952 Museu de imagens do inconsciente, de Nise da Silveira (1905 – 1999), pintura. Com acervo de mais de 350 mil obras, surgiu da iniciativa da psiquiatra Nise da Silveira que, por não aceitar tratamento de pacientes com eletrochoque, lobotomia e coma insulínico, criou em 1946 uma Seção de Terapêutica Ocupacional no Centro Psiquiátrico Nacional, Rio de Janeiro.

1955 Auto da compadecida, de Ariano Suassuna (1927 – 2014), teatro. No estilo realismo mágico, Suassuna usa a alegoria para falar da realidade com humanismo.

1955 Morte e vida severina, João Cabral de Mello Neto (1920 – 1999), literatura. Retrata a difícil vida no sertão brasileiro, castigado por períodos de seca e o êxodo de nordestinos em busca de uma vida melhor. O Poema de João Cabral mostra como a morte se faz presente na vida desse povo sofrido.

1956 Grande sertão: veredas, de Guimarães Rosa (1908 – 1967), literatura. A embaraçosa paixão de Riobaldo por Diadorim, num pedaço do sertão mineiro, às margens do São Francisco, cresce em meio às pelejas entre bandos e jagunços. Neste romance-rio, não bastasse a originalidade da estória, somos fisgados pela narrativa – oralizada, sertaneja, única…

1956 Guerra e Paz, de Candido Portinari (1903 – 1962), pintura. Um brasileiro se dedicou por quatro anos a criar dois painéis para a sede das Nações Unidas. O primeiro, Guerra, cita o Apocalipse e outros livros bíblicos. O segundo, Paz, evoca Eumênides, de Ésquilo. Ex-membro do Partido Comunista, Portinari morreu sem ver sua obra na ONU.

1958 Chega de saudade, de Vinicius de Moraes (1913-1980) e Antônio Carlos Jobim (1927 – 1994), música. Sua gravação pelo músico João Gilberto é considerada o início da Bossa Nova.

1959 Articulado / Monumento a Descartes/ Caranguejo, série Bicho, de Lygia Clark, (1920-1988), escultura. Obra da série Bicho (prêmio de melhor escultura nacional na VI Bienal de São Paulo). A artista defendia a desmistificação da arte e do artista e a desalienação do espectador, que compartilha a criação da obra, sem passividade, em uma integração total, existencial.

1959 Jeca Tatu, de Amácio Mazzaropi (1912 – 1981) e Milton Amaral (1934 – 1995), cinema. Mazzaropi deu vida ao personagem de Monteiro Lobato encarnando o estereótipo do homem do meio rural, com seu modo de vida típico. Jeca Tatu se consolidou como a imagem do caipira paulista.

1959 Operário em construção, de Vinicius de Moraes (1913-1980), poesia. A contradição entre o trabalho e o capital, do ponto de vista da classe trabalhadora. Foi no 1º de Maio de 1979 que, pela primeira vez, o Poetinha recitou seu poema revolucionário a quem mais interessava – a própria classe operária. Os versos falam da tomada de consciência e da subsequente repressão. Mas cada “não” de um operário a seu patrão transforma o mundo!

1959 Turma da Mônica, de Maurício de Sousa (1935), quadrinhos. Popularizado no formato “gibi” a Turma da Mônica marcou a infâncias de várias gerações de brasileiros. Com seu estilo único, simples, a Turma procurou abordar diversos aspectos da infância.

1960 Praça dos três poderes, de Lúcio Costa (1902 – 1998), arquitetura. Reflete o sonho inovador e futurista que marcou a criação de Brasília e a expansão para o oeste. A arquitetura rompe com o estilo europeu colonial criando contrastes com o cerrado e afirma a vocação modernista do pensamento de vanguarda no Brasil.

1960 Quarto de despejo, de Carolina Maria de Jesus (1914 – 1977), literatura. De forma inédita, sensível e realista mostra a pobreza nas periferias das cidades. A autora, uma catadora, teve seus escritos descobertos pelo jornalista Audálio Dantas, e quando publicados surpreendeu o Brasil e o mundo pela qualidade dos textos.

1961 Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, de Vilanova Artigas (1915 – 1985), arquitetura. Um exemplo concreto do pensamento do arquiteto que ao longo de sua carreira de experimentações e pesquisas defendia a socialização dos ambientes, a ampliação das possibilidades de convivência, de encontros e de comunicação e a integração entre arte, técnica, história e sociedade.

1962 Ai de Ti, Copacabana, de Rubem Braga (1913 – 1990), literatura. Na crônica, o mais brasileiro dos gêneros literários, não há expoente maior que o “velho Braga”. Manuel Bandeira dizia que o escritor capixaba era, na realidade, um “grande poeta disfarçado em jornalista”. Em Ai de Ti, estão à nossa disposição 60 de suas melhores crônicas.

1962 O Pagador de promessas, de Anselmo Duarte (1920 – 2009), cinema. Adaptação de Dias Gomes trata de sincretismo religioso e intransigência muitos presentes no país. Baseado na peça homônima de Dias Gomes, é o único filme brasileiro a vencer a Palma de Ouro no Festival de Cannes. O longa expõe a determinação de Zé do Burro em cumprir uma penosa promessa. Sua saga, como a de Dom Quixote, o torna alvo de oportunistas e detratores.

1962 Garota de Ipanema, de Vinicius de Moraes (1913-1980) e Antônio Carlos Jobim (1927 – 1994), música. A melodia simples e cadenciosa traduz uma ideal sobre a cidade do Rio de Janeiro e do Brasil, com belas mulheres, amigos nos bares e a natureza aprazível. Mais do que alienação, a música é um sonho, um sonho que atingiu estrondoso sucesso, chegando a ocupar o lugar da segunda mais executada no mundo, atrás apenas de Yesterday, dos Beatles.

1963 Vidas secas, de Nelson Pereira dos Santos (1928 – 2018), cinema. Adaptação coesa da obra de Graciliano Ramos. Inovador na filmagem, fotografia e enredo.

1964 O trem das onze, de Adoniran Barbosa (1902 – 1982), música. Sob um pretenso romance, a música faz referência a malha ferroviária que interliga os bairros paulistanos. Adoniran traz o samba para São Paulo, inscrevendo a cidade na demografia popular do Brasil. Com sua simplicidade e ironia, fez história e influenciou gerações.

1964 Opinião, de Augusto Boal (1931 – 2009) e Vianinha, Oduvaldo Vianna Filho, (1936-1974), teatro. Espetáculo, com músicas, notícias de jornais, depoimentos e citações de livros como denúncia ao golpe de Estado de 1964.

1964 Os Pastores da noite, de Jorge Amado (1912-2001), literatura. A herança da matriz africana em nossa cultura descrevendo as alegrias e angústias dos personagens.

1964 Deus e o diabo na terra do sol, de Glauber Rocha (1939 – 1981), cinema. Logo após lançar o filme, Glauber soltou o manifesto Uma Estética da Fome. Um e outro davam sentido ao Cinema Novo, na medida em que desnudavam o que o cineasta baiano chamava de “colonizador”. Porque “uma estética da violência, antes de ser primitiva, é revolucionária”.

1964 Os Estatutos do homem, de Thiago de Mello (1926 – 2022), literatura. Escrito no exílio do poeta em Santiago, após o golpe de 64, o poema reage ao nefasto regime militar. Seus “artigos” oferecem “o reinado permanente da justiça e da claridade” onde a ditadura tentava impor arbítrio e trevas. E decretam: “Só uma coisa fica proibida: amar sem amor”.

1965 Arena conta Zumbi, de Gianfrancesco Guarnieri (1934 – 2006) e Augusto Boal (1931 – 2009), teatro. Em plena ditadura, o Teatro de Arena recorreu a Zumbi e ao Quilombo dos Palmares para criar um musical sobre a resistência à opressão. Com sua mensagem universal, a peça foi encenada na América e na Europa, inserindo a arte brasileira na vanguarda.

1965 São Paulo, sociedade anônima, de Luís Sérgio Person (1936 – 1976), cinema. São Paulo se vendia como “a cidade que mais cresce no mundo”, a cidade que “não pode parar”. Por meio do personagem Carlos – um metalúrgico que ascende a um cargo de chefia –, Person mostrou o outro lado da moeda. Afinal, o ser humano tem importância no capitalismo?

1966 A hora dos ruminantes, de José J. Veiga (1915 – 1999), literatura. Esta fábula moderna, sobre a imprevisibilidade da vida e/ou a opressão, narra a mudança na rotina de vida dos moradores de uma pacata cidade, com a inexplicável chegada de um grupo de homens estranhos, que se instalam próximos ao lugar, e depois com a invasão de cães e bois.

1966 Dois perdidos numa noite suja, de Plínio Marcos (1935 – 1999), teatro. Estreia profissional de Plínio Marcos. Com textos marcadamente ligados à marginalidade, o autor tornou-se símbolo de resistência cultural e política contra a censura nos anos 1960 e 1970. A peça de dois personagens foi inspirada no conto “O Terror de Roma”, de Moravia.

1966 Tecendo a Manhã, de João Cabral de Mello Neto (1920 – 1999), literatura. “O canto do galo”, dizia Marx, “anunciará o dia da ressurreição”. Cabral acrescenta que quem prenuncia o futuro não é um “galo sozinho” – mas a união de todos os galos, “para que a manhã (…) se vá tecendo”. Com metáforas e parábolas, o poeta mostra que só o coletivo descortina o futuro.

1967 Terra em Transe, de Glauber Rocha (1939 – 1981), cinema. Detalha a luta de classes na situação nacional com ampla vocação para golpes de Estado.

1967 Roda Viva, de Chico Buarque (1944), teatro. Dos vencedores do Prêmio Camões, Chico é o único filho legítimo da música, e não da literatura. Antes dos romances, sua produção teatral (da qual Roda Viva é o ápice) já lhe anunciava o talento narrativo. As peças políticas de Chico irritaram tanto a censura quanto as canções.

1967 Máscara negra, de Zé Keti, José Flores de Jesus, (1921 – 1999) e Pereira Matos (1910 –1966), música. Famosa em todos os carnavais do País, esta lírica e sofisticada marcha-rancho foi inspirada em uma personagem real e reafirmou Zé Keti como um dos grandes compositores da MPB, já reconhecido por suas músicas e participação no show Opinião, com Nara Leão e João do Vale.

1968 Pra Não Dizer Que Não Falei Das Flores, de Geraldo Vandré (1935), música. Hino das passeatas e manifestações contra a ditadura militar, evoca o obscurantismo das décadas de 1960 e 70. A densidade dramática da música cumpriu uma função elementar de sensibilizar a população, por isso foi censurada logo que foi lançada no III FIC em 1968.

1968 Seja marginal seja herói, de Hélio Oiticica (1937 – 1980), artes plásticas. Em forma de bandeira, a obra foca a “marginalidade” de forma poética, transgressora e crítica à sociedade burguesa e hipócrita que persegue os “bandidos” que ela mesmo cria. O bandido morto pela polícia sugere a crucificação, tema muito usado nas artes de várias épocas e mundos.

1968 Tropicália (álbum), vários, música. Manifesto do tropicalismo, fala, de forma crítica, da transição do um país de um ambiente rural para um ambiente mais urbano. Influenciado pela Semana de Arte Modera e pelo Manifesto Antropofágico de Oswald de Andrade, celebra a assimilação do estrangeiro sem perder a raiz.

1968 Tropicália, de Caetano Veloso (1942), música. A vocação da música popular brasileira em se contrapor ao autoritarismo.

1969 Macunaíma, de Joaquim Pedro de Andrade (1932 – 1988), cinema. Em cena a luta armada contra a ditadura em adaptação da obra de Mário de Andrade.

1970 Antes do baile verde, de Lygia Fagundes Telles (1923), literatura. As duas personagens deste conto, de origens sociais distintas, entram em embate sobre quem deveria ficar cuidando de uma pessoa adoecida e quem sairia para as festas de Carnaval. Magistral diálogo sobre a vida e a morte e os papéis sociais que as pessoas desempenham.

1971 Ventania, de Athos Bulcão (1918 – 2008), mural. Uma das obras mais famosas do muralista, compõe a identidade modernista de Brasília, com posição de destaque no Congresso Nacional. O mural é composto por quatro peças, repetidas por toda a sua extensão.

1971 Vestido bordado com pássaros, de Zuzu Angel, Zuleika de Souza Netto (1921 – 1976), moda. É um vestido lançado no desfile-protesto na embaixada brasileira dos EUA em setembro de 1971. Zuzu protestava contra o desaparecimento de seu filho, filho, Stuart Angel, assassinado pelo governo e transformado em desaparecido político. Em 1976 ela mesma morreu em um acidente envolto a suspeitas de atentado.

1972 Das Barrancas do Rio Gavião (álbum) de Elomar Figueira Mello (1937), música. Apresentado por Vinícius de Morais, este LP revelou o belo cancioneiro de Elomar, que canta em O Violêro: “Apois pro cantadô i violero/só hai treis coisa nesse mundo vão/amô, furria, viola, nunca dinhêro/viola, furria, amô, dinhêro não”, que fez Caetano Veloso compor Beleza Pura.

1972 Clube da Esquina, (álbum) ,de Milton Nascimento (1942), Lô Borges (1952) e outros, música. Um dos mais importantes álbuns de MPB, tem atitude antropofágica semelhante à Tropicália. Reúne diversas influências musicais nacionais e internacionais, arranjos sofisticados, grandes músicos e letras com qualidade poética, sensibilidade e consciência política pela liberdade.

1972 Viva vaia, de Augusto de Campos (1931), literatura. Poema homenagem a Caetano Veloso, por conta das vaias que o músico recebeu no Festival TUCA, 1968, e outros artistas hostilizados pela incompreensão e violência, em plena ditadura militar. Viva vaia veio a ser título do livro de poemas (período 1949-1979) de Augusto de Campos.

1972 Graúna, de Henfil, Henrique de Souza Filho (1944 – 1988), quadrinhos. Publicada no jornal O Pasquim, Graúna falava sobre o Nordeste do Brasil e a relação dos nordestinos com o “Sul Maravilha”.

1972 Acabou chorare (álbum), de Novos Baianos (1969 – 1979), música. Lançado há 50 anos, está em todas as listas dos maiores álbuns brasileiros. Sob a influência de João Gilberto e com uma musicalidade original, Baby, Moraes Moreira, Pepeu e cia, nos brindaram com sucessos como Brasil Pandeiro (em versão mais roqueira), Preta Pretinha e Besta É Tu.

1973 Fado tropical, de Chico Buarque (1944) e Ruy Guerra (1931), música. A identidade nacional a toda prova na intensa luta pela vida.

1973 O Bem-amado, de Dias Gomes (1922 – 1999), televisão. Sátira certeira, intelifente e popular das artimanhas da política brasileira. Em seus quase 50 anos a novela permanece atual.

1973 Pérola Negra, de Luiz Melodia (1951-2017), música. Com choro, samba, rock, mpb-blues, ritmo latino-americano e uma poética irônica, crítica e diferenciada para a época de um Brasil sob o regime ditatorial e a censura, este genial álbum com 10 canções está entre os melhores discos nacionais de todos os tempos.

1973 Chico City, de Chico Anísio (1931 – 2012), televisão. Chico Anísio criou para este icônico programa semanal, com maestria inigualável, uma diversidade de personagens populares. Conectado à realidade política e cultural do País, o artista multimídia tecia críticas com originalidade, humor, ironia, sensibilidade social e amor à vida.

1974 Histórias de lenços e ventos, Grupo Ventoforte, de Ilo Krugli (1930 – 2019), teatro. Premiada peça, é uma fábula sobre a união que conquista a liberdade. Rompe com as fórmulas tradicionais e transforma o teatro infantil brasileiro com uma estética mágica e inovadora. Para Ana Maria Machado, Histórias de Lenços e Ventos “é um ato de fé no teatro e na criança”.

1974 Mestre sala dos mares, de João Bosco (1946) e Aldir Blanc (1946 – 2020), música. Homenagem a João Cândido, líder da Revolta da Chibata, em 1910, contra o racismo na Marinha.

1975 Festival de Águas Claras (outras edições: 1981, 1983 e 1984), festival. Participaram do nosso Woodstock bandas de rock, Raul Seixas, Walter Franco, Gonzagão, Hermeto Paschoal, João Gilberto, Egberto Gismonti, Gilberto Gil, Jorge Mautner, Alceu Valença etc. Influenciou festivais como o Rock in Rio e está bem documentado no filme O barato de Iacanga.

1975 Poema Sujo, de Ferreira Gullar (1930 – 2016), literatura. Gravado em fita cassete, em Buenos Aires, trazido por Vinícius de Moraes e lançado em livro (1976), este marco da poesia acelerou o fim do exílio do poeta. Milton Nascimento musicou o trecho Bela Bela e o trecho Trenzinho Caipira é para se cantar com a Bachiana 3 de Villa Lobos.

1975 Gabriela, de Wálter George Durst (1922 – 1997), televisão. O romance Gabriela, Cravo e Canela (1958) já havia sido um dos grandes sucessos de Jorge Amado. A versão para a TV, protagonizada por Sônia Braga, popularizou ainda mais a obra do escritor baiano. Nem os censores se incomodaram com uma novela tão sutil na crítica social.

1976 Explicação de poesia sem ninguém pedir, de Adélia Prado (1935), poesia. A poetisa revela que o trem-de-ferro, uma coisa mecânica, torna-se na poesia lírica uma lembrança, uma emoção, um sentimento. Este pequeno e expressivo poema faz parte de Bagagem, livro de estreia de Adélia Prado, uma de nossas principais escritoras.

1976 Como Nossos Pais, de Antônio Carlos Belchior (1946 – 2017), música. Lançada no LP Alucinação, também foi gravada com sucesso por Elis Regina no Falso Brilhante. Em plena ditadura militar, retrata a juventude, a repressão, a alienação e a esperança. Clássico da MPB, é a 43ª canção entre As 100 Maiores Músicas Brasileiras pela Rolling Stone Brasil.

1976 Dona Flor e Seus Dois Maridos, de Bruno Barreto (1955), cinema. Adaptação da obra de Jorge Amado. O desejo das mulheres em se libertar.

1977 A hora da estrela, de Clarice Lispector (1920 – 1977), literatura. Reflexão sobre os sonhos e os conflitos internos de uma trabalhadora nordestina no Rio de Janeiro.

1977 Bambalalão, de Ademar Guerra (1933 – 1993) e Antonio Abujamra (1932 – 2015), televisão. Marcou a qualidade da programação infantil da TV Cultura, lançando personagens e atores. O programa levou para a televisão o caráter lúdico do circo.

1977 Kuarup, ou a Questão do Índio, de Ballet Stagium (1971), dança. Marco da dança, em plena ditadura, apresentou-se em todo o País, América Latina e Europa. A remontagem (2017) foi crítica aos retrocessos nas questões dos povos indígenas. O Stagium foi o primeiro grupo a usar a música popular brasileira em espetáculos de dança.

1977 Maluco Beleza, Raul Seixas (1945 – 1989), música. Uma das músicas mais populares do cantor baiano, um dos pioneiros do rock brasileiro. Maluco Beleza fala da autonomia dos oprimidos e da população marginalizada. E se tornou símbolo do despojamento de cantorias em bares e festas.

1978 Café da Manhã, Roberto Carlos (1941), música. Marca o início da fase romântica que assumiu o cantor mais popular do Brasil. Com tom intimista, Café da Manhã fala da paixão de um trabalhador e alcançou grande sucesso entre o povo brasileiro. É a subjetividade talhada pela cadência do trabalho.

1978 Cartomante, de Ivan Lins (1945), música. Com essa música de trabalho do álbum Nos Dias de Hoje, o compositor, cantor e pianista disseca “o medo que temos da vida” e lança um grito de alerta contra os horrores da ditadura. Mas, naquele baralho autoritário chamado Brasil, os reis de cada naipe hão de cair.

1978 Sampa, de Caetano Veloso (1942), música. Encomendada por uma emissora de TV, é o hino informal de São Paulo, tendo imortalizado a esquina das avenidas Ipiranga e São João. Sua letra, escrita sobre os acordes de Ronda, associa referências como o concretismo, Rita Lee, Mutantes, o Teatro do Oprimido e o Oficina.

1978 Sonho Meu, de Dona Ivone Lara (1921 – 2018) e Délcio Carvalho (1939 – 2013) música. Às portas da Anistia, a música da “grande dama do samba” alimentava a esperança de “buscar quem mora longe”. Primeira mulher a integrar a ala de compositores de uma escola de samba, Dona Ivone teve a canção gravada de modo memorável pelo dueto feminino Gal Costa/Maria Bethânia.

1979 Realce, de Gilberto Gil (1942), música. Um dos álbuns mais significativos de Gilberto Gil. Rico em melodias, ritmos e conteúdos sociais, políticos e filosóficos, questiona o racismo, a escravidão e o preconceito e propõe liberdade para a criação musical, entre a tradição popular brasileira e o pop internacional.

1979 Bye Bye Brasil, de Carlos Diegues (1940), cinema. Filme de sucesso, realizado na época de redemocratização do País e renovação do cinema nacional, mostra artistas ambulantes cruzando o Brasil com a Caravana Rolidei, com espetáculos para camponeses, cortadores de cana, indígenas etc., sempre fugindo da concorrência da televisão.

1979 Cartaz para o fundo de greve dos metalúrgicos, de Elifas Andreato (1946), arte gráfica. Cartaz produzido por um dos mais importantes desenhistas gráficos do Brasil, para contribuir com a arrecadação do fundo de greve para os metalúrgicos de São Bernardo. Em plena ditadura o cartaz ressalta o direito à greve, a legalidade das comissões de fábrica, estabilidade no emprego e a preocupação no rosto escondido pelas mãos do trabalhador, com o desemprego.

1979 O Bêbado e a Equilibrista, de João Bosco (1946) e Aldir Blanc (1946 – 2020), música. Das 120 composições conjuntas da dupla, nenhuma nos tocou mais do que esta. Bosco compôs uma melodia à memória de Chaplin. Aldir acrescentou à letra a esperança em superar um Brasil de “manchas torturadas”. Nascia uma bela canção de protesto – uma música símbolo da resistência.

1980 Nego Dito, de Itamar Assumpção (1949 – 2003), música. Pulsante canção do 1º disco de Itamar, que está entre os cem mais importantes do mundo, traz o personagem Benedito João dos Santos Silva Beleléu, vulgo Nego Dito, com suas falas de “ódio” nos contextos em que vive. Música visual, onomatopeica (pá pá pá pá pá), estilo original.

1980 Clara Crocodilo, de Arrigo Barnabé (1951), música. Disco de estreia de Arrigo, é um marco para a Vanguarda Paulista que influenciou outros músicos, inclusive os da geração do rock/pop nacional dos anos 1980. Clara Crocodilo trouxe para o cenário musical brasileiro novas e contundentes linguagens sonoras e poéticas urbanas.

1980 O Menino Maluquinho, de Ziraldo (1932), literatura. De “maluquinho”, o protagonista não tem nada: ele é inventivo, alegre, poeta e, como deve ser a infância, feliz. Ziraldo, criador do texto e dos desenhos, considera mais cult do que popular esta obra. Foi adaptada para televisão, desenho animado, filmes e música.

1980 Bella Ciao, de Luís Alberto de Abreu (1952), teatro. A saga de uma família de imigrantes italianos em sua luta para sobreviver e a vida política do país.

1980 Gaijin – Os Caminhos da Liberdade, de Tizuka Yamasaki (1949), cinema. Importante registro sobre a imigração japonesa no início do século 20, sobre as dificuldades do trabalho nas fazendas de café, as relações com os demais imigrantes que chegaram para substituir o trabalho escravo e a incipiente transição para indústria.

1980 Pixote, a Lei do Mais Fraco, de Hector Babenco (1946 – 2016), cinema. Num tempo em que crianças em situação de rua, desprovidas de cidadania, eram reduzidas a “menores abandonados” e “infratores”, Babenco humaniza suas vidas errantes. É um dos filmes nacionais mais aclamados no exterior – recebeu elogios de críticos como Roger Ebert e Pauline Kael.

1981 De olho nas penas, de Ana Maria Machado (1941), literatura. O personagem principal vivia mudando de país, por causa do exílio durante o regime militar no Brasil, e descobre os segredos da América Latina, África e de sua própria vida. Ana Maria Machado ganhou, entre outros, o prêmio Hans Christian (o Nobel da literatura infantil mundial).

1981 Deu pra ti, de Kleiton Alves Ramil (1951) e Kledir Alves Ramil (1953), música. A criativa dupla de irmãos gaúchos demonstra nesta famosa canção dos anos 1980 ser possível cantar características culturais de uma cidade do País, neste caso a capital Porto Alegre, não apenas através dos ritmos regionais, mas por intermédio de uma linguagem pop e universal.

1981 Não verás país nenhum, de Ignácio de Loyola Brandão (1936), literatura. Um morador de uma São Paulo já no século 21, em busca de resposta para um furo que aparece sem razão alguma em sua mão, percorre a cidade caótica. Na verdade, um Brasil devastado, sem água, sem comida natural, sem floresta, sem árvores. Um livro profético!

1981 Notícias do Brasil, de Milton Nascimento e Fernando Brant (1946-2015), música. A esperança do povo brasileiro um dia se juntar e botar pra correr os inimigos do país.

1981 Eles Não Usam Black-Tie, de Leon Hirszman (1937 – 1987), cinema. Baseado na peça de Gianfrancesco Guarnieri, o filme lança luzes sobre os desafios da organização dos trabalhadores. Dois operários de uma mesma família – pai e filho – personificam lados e limites do movimento sindical. É talvez o grande filme brasileiro sobre luta de classes.

1982 A Rede, de Aldemir Martins (1922 – 2006), pintura. Aldemir Martins descreve a paisagem e a realidade sertaneja, por intermédio de um dos símbolos da cultura mestiça no Brasil, a rede e seu amplo uso no Nordeste. Usa para isso cores intensas e contrastantes, de forma geométrica, gráfica, ao mesmo tempo simples e sofisticada.

A Rede, de Aldemir Martins

1982 Feliz Ano Velho, de Marcelo Rubens Paiva (1959), literatura. 1º livro de Marcelo, com adaptações para teatro e cinema, narra as mudanças irreversíveis na vida do autor (jovem de 20 anos, que perde os movimentos do corpo após acidente num lago) e aspectos da ditadura militar que torturou e matou o seu pai, o deputado federal Rubens Paiva.

1982 Pra Frente Brasil, de Roberto Farias (1932 – 20180), cinema. Com o mesmo nome da música da Copa de 70, o filme remete às torturas da ditadura militar no Brasil e a um tempo em que qualquer pessoa poderia ser apontada como “subversiva”: neste drama, a vítima é um pacato trabalhador da classe média, que desaparece aos olhos da família.

1982 Morangos Mofados, de Caio Fernando Abreu (1948 – 1996), literatura. Os contos presentes nesta coletânea põem CFA no panteão dos grandes escritores do País no final do século passado. As detalhadas descrições de personagens, cenários e contextos, como em Aqueles Dois, tornam seus textos extremamente visuais e impressionistas.

1984 Fullgás, de Marina Lima (1955), e Antônio Cícero (1945), música. Uma das mais importantes cantoras e compositoras do Brasil, Marina Lima e seu irmão filósofo, escritor e letrista Antônio Cícero, criaram uma das canções pop-mpb mais famosas dos anos 1980, enaltecendo a “fugacidade” como energia vital, política, diversificada e libertária.

1984 Rê Bordosa, de Angeli, Arnaldo Angeli Filho (1956), quadrinhos. Retrato debochado da urbanidade caótica, do processo de desinstitucionalização da família e do individualismo exacerbado na sociedade liberal. A personagem se popularizou como uma auto ironia. É uma espécie de anti-heroína dos tempos modernos.

1984 Cabra Marcado para Morrer, de Eduardo Coutinho (1933 – 2014), cinema. Era para ser um filme de ficção sobre a vida e o assassinato do líder camponês João Pedro Teixeira, em Sapé, na Paraíba. Mas o resgate de um projeto artístico e a reconstrução da memória coletiva transformam este longa no mais importante e influente documentário brasileiro.

1985 A Marvada Carne, de André Klotzel (1954), cinema. O filme retrata a nossa rica e fantástica cultura popular caipira com humor, ironia lúdica e muito respeito. Ganhou 11 prêmios no Festival de Gramado de 1985 e em 2015 entrou na lista da Abracine dos 100 melhores filmes brasileiros de todos os tempos.

1985 Rock in Rio, festival. Em plena redemocratização, durante 10 dias, 1 milhão e 380 mil pessoas viram nomes da MPB e bandas brasileiras (Paralamas, Barão Vermelho, Kid Abelha, Blitz e outras) fazendo história com os astros internacionais, entre eles James Taylor, George Benson, Queen, Yes e Rod Stewart.

1986 Alagados, de Bi Ribeiro (1961), João Barone (1962) e Herbert Vianna (1961), música. Os Paralamas do Sucesso souberam transformar em um som animado e vigoroso as contradições da cidade, através da incongruência entre o simbolismo de um Cristo Redentor de braços abertos e um sistema excludente que repele e marginaliza os mais pobres.

1987 Faroeste Caboclo, de Renato Russo (1960 – 1996), música. Renato Russo musicou a epopeia de Brasília na canção composta em 1979 e lançada em 1987 no álbum Que País É Este. São 159 versos que não se repetem em nove longos minutos. A saga de Santo Cristo traz ao centro dos holofotes um homem rústico, sem apoio ou assistência, que sai pelo mundo à sua própria sorte.

1987 Incenso fosse música, de Paulo Leminski (1944 – 1989), poesia. Com seu estilo simples, Leminski traduz a autenticidade e a rebeldia de uma geração de poetas, músicos e escritores da contracultura, que buscavam quebrar padrões pré-estabelecidos.

1988 São tantas as verdades, de José Leonilson Bezerra Dias (1957 – 1993), pintura. Obra de grande formato, com 3 furos que permitem pendurá-lo por pregos, também dá título a um livro da trajetória de Leonilson, um dos expoentes da chamada Geração 80, que faleceu jovem, mas deixou grandes contribuições para a arte brasileira.

1988 Brasil, de Cazuza, Agenor de Miranda Araújo Neto (1958 – 1990), música. A vontade de superar o Brasil dominado pelo viralatismo e soerguer firme e forte.

1989 Ratos e urubus, larguem a minha fantasia, Joãozinho Trinta, João Clemente Jorge Trinta (1933 – 2011), enredo escola de samba. Mesmo sem vencer, um desfile de Joãozinho fazia sucesso. Isto ocorreu quando a Beija Flor foi ao Sambódromo com alas e carros repletos de lixo. A alegoria do Cristo Redentor mendigo, proibida em ação da Igreja Católica, passou coberta e com a frase “mesmo proibido, olhai por nós”.

1989 Amavisse, de Hilda Hilst (1930-2004), poesia. Poemas em tom metafísico sobre a passagem do tempo, o fim do amor, os planos não realizados e a proximidade da morte. É a última obra séria de Hilda, que, em reação ao limitado alcance de seus livros, passou a escrever textos pornográficos para tentar ser mais lida e reconhecida.

1989 Ilha das flores, de Jorge Furtado (1959), cinema. Com humor, este curta, meio documental, meio ficcional, segue o destino de um tomate apodrecido – do plantio até o descarte. O tomate não servia nem para os porcos, mas é disputado no lixão por crianças famintas. O filme é um petardo de 15 minutos contra o capitalismo.

1990 Pantanal, de Jayme Monjardim (1956), televisão. Novela que foi um marco da televisão tanto por seu estilo, com tomadas panorâmicas e um ritmo que buscava traduzir a natureza, quanto por jogar luz em povos que viviam afastados dos grandes centros, mantendo costumes regionais e rurais típicos do Brasil profundo.

1991 Nova velha estória, de Antunes Filho (1929-2019), teatro. Antunes Filho, famoso por suas rupturas inovadoras no teatro brasileiro, encena para adultos a tradicional Chapeuzinho Vermelho, com diálogos feitos numa linguagem inventada, o fonemol, gutural, desconstruindo o português e os clichês do estagnado e conservador teatro comercial.

1992 Filho bastardo, de Adriana Varejão (1964), pintura. A artista não usou uma tela tradicional. Pintou em um prato, em forma semelhante a uma barriga grávida, para mostrar, entre outros detalhes, em diálogo com obra do pintor francês Debret, uma negra com ganchos no pescoço sendo estuprada por um religioso em uma paisagem bucólica.

1993 Haiti, de Caetano Veloso (1942) e Gilberto Gil (1942), música. O Haiti como amálgama do Brasil, onde ódio de classe e racismo andam lado a lado.

1994 Helena Meirelles (álbum), de Helena Meirelles (1924 – 2005), música. Primeiro disco da violeira Helena Meirelles, um ano após ser eleita pela revista norte-americana Guitar Player, com voto de Eric Clapton, como uma das 100 melhores instrumentistas do mundo. Só após este reconhecimento exterior, ela foi conhecida no Brasil.

1994 Da lama ao caos, de Chico Science (1966-1997), música. Lema do movimento manguebeat contra a miséria que e o caos que dominam corações e mentes.

1995 Ihu-Todos os sons, de Marlui Miranda (1949), música. Com participação de Gilberto Gil, Ihu-Todos os Sons é um rico trabalho de pesquisa da cantora, compositora e etnomusicóloga Marlui Miranda. O álbum traz as musicalidades de algumas das centenas de etnias indígenas brasileiras que resistem a séculos de massacre físico e cultural.

1996 Trabalhadores, de Sebastião Salgado (1944), fotografia. Livro reúne fotos que denunciam as árduas condições de vida e trabalho dos trabalhadores em várias partes do mundo. Um dos mais respeitados fotojornalistas da atualidade, Sebastião Salgado trabalha com um olhar solidário, humanista, para gerar debates e transformações sociais.

1997 Parabelo, de Grupo Corpo (1975), dança. Com músicas do baiano Tom Zé e do paulista Zé Miguel Wisnik e rica coreografia do mineiro Rodrigo Pederneiras, Parabelo é uma criação brasileira e regional (pontuada por alusões a cantos de trabalho e devoção, ao xaxado e ao baião) e ao mesmo tempo contemporânea e universal.

1997 Periferia é periferia (Em qualquer lugar), Racionais MC’s (1988), música. A vontade da periferia em estar no centro das decisões que afetam nossas vidas.

1998 Terra Brasil, de Araquém Alcântara (1951), fotografia. Em meio à miséria, um filho perde a mãe busca o pai que o abandonou. A cara do Brasil. É o livro de fotografia mais vendido no País. Araquém Alcântara, um dos precursores da fotografia de natureza no Brasil e o 1º a fotografar todos os nossos parques nacionais, é reconhecido também como um dos mais combativos artistas em defesa do patrimônio natural brasileiro.

1998 Central do Brasil, de Walter Salles (1956), cinema. Em meio à miséria, um filho perde a mãe busca o pai que o abandonou. A cara do Brasil.

2002 Cidade de Deus, de Fernando Meirelles (1955) e Kátia Lund (1966), cinema. Acusado de fazer “cosmética da fome” e “espetáculo da violência”, o filme elevou a reputação e a visibilidade do cinema brasileiro por suas ousadias estéticas e narrativas, além da grande atuação do conjunto do elenco. Conforme resumiu Luiz Zanin, “é um filmaço, problemático”.

2004 Epopeia paulista, de Maria Bonomi (1935) e outros artistas, mural. Localizado em São Paulo no metrô luz, este painel é fruto de um ateliê coletivo coordenado por Bonomi no MAC USP. Arte contemporânea, com profundo significado de memória e diversidade, a partir de objetos esquecidos-perdidos no transporte público por pessoas de todas as origens.

Estação de Metrô Luz – Caminho de acesso à estação de metrô. Foto por André Deak para o Arte Fora do Museu

2004 Vozes do deserto, de Nélida Piñon (1937), literatura. Nélida estudou por cinco anos a cultura, a história e a mitologia árabes para narrar a aventura interior vivida por Scherezade, narradora de contos das “Mil e uma Noites”, que usava a imaginação para manter-se viva perante a opressão do Califa, o mais cruel dos ouvintes.

2004 Agreste, de Newton Moreno (1968), teatro. Ambientada no sertão nordestino, a trama gira em torno de um casal de lavradores, no que parece ser a história de amor tradicional. Quando um deles morre e é velado, descobre-se que não se trata de um homem. A peça é um comovente relato sobre a homossexualidade e a intolerância.

2005 Sr. Brasil, de Rolando Boldrin (1936), televisão. Apresentado pelo ator, cantor e compositor Rolando Boldrin, autor da música tema “Vide vida marvada”, o programa segue a linha do original Som Brasil, de 1981, de valorização da rica e diversificada cultura musical regional brasileira, sem espaço da mídia comercial.

2006 Minha mãe é uma peça, de Paulo Gustavo (1978 – 2021), teatro. Marca o início da personagem icônica Dona Hermínia, que depois conquistou o cinema com três filmes. Dona Hermínia tem forte identificação popular, além de tocar em questões sociais, combatendo a homofobia e reforçando a autoestima da classe operária.

2006 O Maior amor do mundo, de Carlos Diegues (1940), cinema. Um cientista volta ao Brasil para receber um prêmio e conhece a alma do país na favela.

2007 Bailinho, instalação para a Estação Pinacoteca, de Beatriz Milhazes (1960), artes plásticas. Grande nome da pintura contemporânea, a artista apresentou esta obra na exposição “Beatriz Milhazes: pintura, colagem” na Pinacoteca-SP, com 10 janelas de vidro (347×385 cm cada) adesivadas envolvendo público e ambiente em cores virtuais que se alteravam com a passagem do tempo.

2008 Mural Av.23 De Maio, Colaboração de Osgemeos, Nunca, Nina Pandolfo, Finok E Zefix Brasil, grafite. Exemplo da profusão de grafites em São Paulo, como marca da cultura urbana e arte de Rua. O painel é um dos grafites mais importantes da história de São Paulo.

2008 Memorial da Resistência de São Paulo, museu. Localizado onde funcionou o Deops (1940-1983), uma das polícias políticas mais truculentas do País, preserva memórias da repressão e da resistência políticas no Brasil republicano, através de educação, pesquisa e exposições temáticas sobre cidadania, democracia e direitos humanos.

2009 Leite derramado, de Chico Buarque (1944), literatura. A decadência da aristocracia em 200 anos da história do Brasil em 200 páginas.

2011 O Homem do futuro, de Cláudio Torres (1962), cinema. A ilusão da viagem no tempo para mostrar que o tempo de todo mundo é hoje.

2011 O palhaço, de Selton Mello (1972), cinema. O interior do Brasil e a busca incessante por vida digna ao mostrar a importância do circo.

2015 Que horas ela volta?, de Anna Muylaert (1964), cinema. Influenciada pela filha, uma empregada doméstica dá adeus aos seus patrões exploradores.

2016 Ascensão, de Serena Assumpção (1977 – 2016), música. Indicado ao Grammy Latino, é o único disco de Serena Assumpção. Com mais de 50 participações, entre elas a de Zé Celso do Teatro Oficina, enriquece a cultura brasileira com 13 canções sobre os orixás cantados em terreiros que fizeram parte de suas vivências e memórias afetivas.

2017 As caravanas, de Chico Buarque (1944), música. A cara do Brasil onde a senzala foi substituída pela prisão e o ódio de classe viceja.

2019 AmarElo – É Tudo Pra Ontem, de Emicida, Leandro Roque de Oliveira (1985), cinema. O grito de resiliência, reação e luta pela vida e por direitos iguais.

2019 Bacurau, de Kleber Mendonça Filho (1968), cinema. A reação coletiva a uma invasão de estrangeiros que nos veem como escravos e inumanos.

2019 Democracia em Vertigem, de Petra Costa (1983), cinema. A torpeza de grupos submissos ao capital no processo do impeachment de Dilma Rousseff.

2019 Torto arado, de Itamar Vieira Junior (1979), literatura. Trata do trabalho escravo contemporâneo e dos sonhos e desejos do povo trabalhador.

2020 Sistema obtuso, de Criolo, Kleber Cavalcante Gomes (1975), música. Contraponto direto à perversidade do capitalismo, que a tudo destrói para satisfazer a poucos.

2021 Marighela, de Wagner Moura (1976), cinema. Com foco nos últimos anos da vida do guerrilheiro Carlos Marighela, o filme se volta para a luta da resistência armada à ditadura militar – seus projetos, seus temores, suas limitações. A perseguição que o filme sofreu do governo Bolsonaro é prova de sua relevância e pertinência.

2022 Que tal um samba?, Chico Buarque (1944), música. Um samba para levantar o Brasil para a necessária mudança.

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