Anglo American anunciou demissão de 85 mil. Vale e Rio Tinto cortam investimentos
A mineradora Anglo American, uma das maiores da indústria mundial de mineração, anunciou ontem profunda reestruturação que inclui corte de cerca de 60% do número de ativos — de 50 operações para 20 — e de 85 mil vagas ou 63% dos funcionários — de 135 mil para 50 mil. Considerada uma das mais drásticas reestruturações do setor, o anúncio é uma resposta à crise por que passam as gigantes da mineração, como Vale e Rio Tinto, entre outras, e se insere em um fenômeno mais amplo de queda de preços das matérias-primas: o chamado fim do superciclo das commodities. A Vale já havia anunciado corte de 48,7% nos investimentos previstos para 2020 em relação aos deste ano. Com a mudança de cenário, analistas preveem impacto na balança comercial brasileira, com valor menor de exportações.
— Acreditamos que a melhor resposta a nossos acionistas é ter um portfólio menor, de maior qualidade e mais resiliente, com ativos nos quais possamos investir de forma mais eficiente — disse o presidente executivo da Anglo, Mark Cutifani, em apresentação a investidores em Londres.
EFEITO NEGATIVO NA BALANÇA COMERCIAL
Cutifani não disse quando a versão mais enxuta da empresa será uma realidade. Mas deu uma perspectiva de curto prazo. Em 2017, a Anglo deve ter 92 mil empregados e planeja investir US$ 2,5 bilhões, 55% menos que em 2014. A empresa também vai concentrar seus escritórios em Londres — onde está sua sede —, reduzirá de seis para três as áreas de negócios e não pagará dividendos em 2016.
Está prevista a venda de US$ 4 bilhões em ativos, incluindo operações de nióbio (usado em eletrônicos) e fosfato (insumo para fertilizantes) em Goiás. Segundo a Anglo American no Brasil, a unidade que reúne esses dois minerais e o níquel tem 3.900 empregados. Na unidade de minério de ferro, que engloba mina em Conceição do Mato Dentro (MG), mineroduto de 592 quilômetros que a conecta ao Porto do Açu, em São João da Barra (Norte Fluminense), e 50% de um terminal de minério de ferro nesse porto, são mais 2.200 empregados, somando 6.100 no país.
Segundo Cutifani, a produção de 26,5 milhões de toneladas de minério de ferro, que se esperava atingir em 2016 em Conceição do Mato Dentro, foi adiada em dois anos, por problemas de licenciamento ambiental. A mina faz parte do projeto Minas-Rio, comprado do empresário Eike Batista em 2007.
A Anglo não é a única a rever a estratégia. A Vale vem diminuindo de tamanho. A anglo-australiana Rio Tinto anunciou corte de US$ 500 milhões no orçamento de 2016, que ficará em US$ 5 bilhões.
As ações da Anglo caíram 12,29% ontem na Bolsa de Londres, e os papéis preferenciais da Vale (sem direito a voto) recuaram 5,28% na Bovespa, refletindo nova queda no preço do minério de ferro. Desde 2011, quando o produto alcançou o pico de US$ 191,7 a tonelada, a cotação no mercado à vista chinês (referência internacional) desabou 76,87%, para US$ 38,65 ontem. Metais como cobre e níquel acumulam forte queda no período, afetando a receita das mineradoras e países que dependem das exportações dos produtos, como o Brasil.
O minério de ferro, que por anos encabeçou as exportações brasileiras, deixará de ser o primeiro item da pauta em 2015 — será ultrapassado pela soja. A estimativa da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB) é que as vendas ao exterior do item somem US$ 13,8 bilhões este ano, um tombo de 67% ante os US$ 41,8 bilhões de 2011, ano dourado da mineração.
— O que derrubou as exportações de minério foi o preço, pois o volume aumenta ano a ano. Como somos dependentes das commodities, isso acaba agravando a crise que estamos vivendo — disse José Augusto de Castro, presidente da AEB.
RECUPERAÇÃO DE PREÇO SÓ EM 2017
A queda generalizada dos preços das matérias-primas deve-se à desaceleração da economia chinesa. No caso do minério de ferro também é explicada pela entrada em operação de novos projetos, criando uma sobreoferta do produto.
— O preço do minério de ferro ficou estacionado por muitos anos, pois o mundo desenvolvido já tinha feito sua industrialização. Quando a China intensificou esse processo, pressionou os preços para cima. Agora, com a desaceleração, há redução na demanda paralelamente ao aumento da oferta — diz Bruno Feigelson, sócio para a área de mineração do LL Advogados.
A queda do preço do minério de ferro afeta diretamente a Anglo American. Segundo relatório do HSBC, o break-even (preço de venda que não gera lucro ou prejuízo) é de US$ 37 a tonelada nas suas minas da África do Sul e US$ 42 a tonelada no Minas-Rio. Analistas apostam em recuperação de preços em 2017 ou 2018. (Com agências internacionais)